Os vereadores do PS na Câmara de Lisboa abandonaram esta quinta-feira a reunião do executivo, liderado pelo social-democrata Carlos Moedas, por considerarem que uma vereadora da coligação PSD/CDS-PP pode ter tomado posse ilegalmente, pondo em causa deliberações do município.

Os socialistas referiam-se a dúvidas sobre a conformidade e a legalidade da tomada de posse da vereadora Joana Oliveira Costa, do CDS-PP, que em maio substituiu Diogo Moura.

Numa nota enviada à imprensa, a vereação socialista na Câmara Municipal de Lisboa (CML) critica o presidente da autarquia Carlos Moedas (coligação Novos Tempos, liderada pelo PSD) por “manter em funções uma vereadora que tomou posse ilegalmente e que não cumpre os requisitos legais para ocupar o cargo”.

“Carlos Moedas sabe que todas as deliberações da Câmara Municipal estão feridas de ilegalidade e podem ser consideradas nulas. Ainda assim, marcou uma reunião extraordinária de vereação para o dia de hoje, 26 de dezembro, como se nada tivesse acontecido, de tal forma que nem marcou presença na reunião por si convocada”, afirmam os vereadores socialistas.

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O grupo socialista no executivo de Lisboa esclarece ainda que se ausentou da reunião, “não participando da mesma, e esperando que seja encontrada uma solução que reponha a legalidade e que Carlos Moedas deixe de se comportar como se estivesse acima da lei e do escrutínio político e público”.

“Os vereadores do Partido Socialista não aceitam fazer parte de uma farsa, continuando a decidir e adotar deliberações cuja legalidade é questionável”, declaram, salientando ainda que “a lei da tutela administrativa prevê a realização de sindicâncias que, a confirmarem ilegalidades, podem gerar perda de mandato e a própria dissolução do órgão executivo”.

Também a coligação Cidadãos Por Lisboa, numa nota, destaca que a liderança Novos Tempos na Câmara de Lisboa diz “ter documentos que comprovam a regularidade da constituição do seu executivo e substituição de vereadores, posta em causa publicamente na passada semana”, mas defende que “é preciso que os divulguem”.

“Deviam até tê-lo feito hoje [esta quinta-feira], na última reunião de câmara do ano. Os Cidadãos Por Lisboa querem ver cabalmente esclarecida a questão e salvaguardadas possíveis consequências para a cidade”, acrescentam.

Em 27 de novembro, numa reunião pública do executivo, Carlos Moedas decidiu adiar a votação das propostas agendadas para a sessão, após um alerta do PS sobre uma eventual ilegalidade quanto à substituição da vereadora Joana Oliveira Costa por um membro das listas do PSD.

Considerando a acusação grave, Carlos Moedas pediu aos serviços jurídicos que fosse feito um parecer.

Na semana passada, depois de o jornal Expresso ter noticiado o pedido de parecer aos serviços jurídicos sobre a eventual existência de irregularidades na composição do executivo, na sequência da saída do vereador democrata-cristão Diogo Moura, e a consequente possibilidade de as deliberações camarárias serem, desde então, nulas, os vereadores do PS, do BE e dos Cidadãos por Lisboa (eleitos pelo PS) questionaram Carlos Moedas, que rejeitou qualquer irregularidade.

Departamento Jurídico da Câmara de Lisboa afasta irregularidades na composição do executivo

Segundo o semanário, que ouviu especialistas em Direito Constitucional e Administrativo e autarcas, antes de Joana Oliveira Costa, existia outro membro do CDS-PP na lista para substituir Diogo Moura: Nuno da Rocha Correia, que nunca recusou por escrito o mandato e continuou a participar em reuniões de câmara, em substituição de vereadores do seu partido.

Fonte da autarquia disse esta quinta-feira à Lusa que o Departamento Jurídico da Câmara de Lisboa concluiu não haver dúvidas sobre a “conformidade do exercício do cargo pela vereadora Joana Oliveira Costa”.

“A conclusão do Departamento Jurídico é que ‘dúvidas não se colocam quanto à conformidade do exercício do cargo pela vereadora Joana Oliveira Costa’. O alegado vício de nulidade, acrescenta-se na pronúncia do Departamento Jurídico, ‘afastado se encontra'”, indicou a fonte do município.

As conclusões dos serviços, acrescentou, foram transmitidas esta quinta-feira pelo vice-presidente do município, Anacoreta Correia, numa reunião privada do executivo, que ao início da tarde continuava a decorrer já “sem a presença do PS”. A vereação socialista, indicou a fonte, “abandonou a reunião”.

A agência Lusa questionou a autarquia na semana passada, que indicou que “o vereador substituto recusou por escrito integrar o executivo”, acrescentando que a substituição por parte de Joana Oliveira Costa ocorreu “de acordo com a lei e é inquestionável”.

Diogo Moura, ex-vereador da Economia e da Cultura, suspendeu o mandato em maio, a pedido de Carlos Moedas, na sequência de uma acusação do Ministério Público sobre fraude em eleições internas do CDS-PP. Foi entretanto ilibado na instrução do processo, que foi arquivado.

Joana Oliveira Costa, que era vereadora em regime de substituição desde 2021, assumiu a Economia e Inovação, e Moedas ficou com a pasta da Cultura.

Livre e Bloco de Esquerda na Câmara de Lisboa exigem transparência sobre tomada de posse de vereadora

O Livre e o Bloco de Esquerda na Câmara de Lisboa exigem que as dúvidas quanto à legalidade da tomada de posse de uma vereadora com pelouro sejam sanadas, sugerindo a consulta de entidades externas independentes à autarquia.

Os dois partidos referiam-se a dúvidas sobre a conformidade e a legalidade da tomada de posse da vereadora Joana Oliveira Costa, do CDS-PP, que em maio substituiu Diogo Moura.

Fonte da autarquia disse, esta quinta-feira, à Lusa que o Departamento Jurídico da Câmara de Lisboa concluiu não haver dúvidas sobre a “conformidade do exercício do cargo pela vereadora Joana Oliveira Costa”, mas, segundo o vereador Rui Tavares, do Livre, não basta um parecer dos serviços jurídicos da própria Câmara, “que funcionam na dependência dos vereadores, a dizer que está tudo bem no exercício do mandato dos próprios vereadores”.

“Isto são dúvidas que têm uma grande gravidade e, portanto, em nosso entender, deveria ser pedido ou à Direção-Geral das Autarquias Locais ou a qualquer outra entidade, como a própria Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional, a uma entidade externa que tenha hábito em funcionar com autarquias locais e que tenha o catálogo das boas práticas e do próprio registo documental dos exercícios dos mandatos, que possa esclarecer se, como dizem os vereadores com pelouro, está tudo bem, ou se, como diz a Associação Nacional de Municípios, nas declarações que deu ao Expresso, isto não pode acontecer assim”, afirmou Rui Tavares.

Numa nota, também a vereadora do Bloco de Esquerda, Beatriz Gomes Dias, disse ter exigido que “ficasse provado sem qualquer equívoco” que a reunião desta quinta-feira decorria com as substituições feitas dentro da legalidade.

“Se Carlos Moedas mantiver a falta de transparência neste processo, que pode implicar a nulidade de muitos atos da CML com prejuízo para quem vive e trabalha em Lisboa, o BE irá entregar na primeira reunião de janeiro de 2025 uma proposta formal para uma auditoria da Inspeção-Geral de Finanças — Autoridade de Auditoria a todas as decisões de Câmara desde 16 de maio de 2024 e a todas as decisões da vereadora Joana Oliveira Costa de forma a que se possa verificar se houve nulidade destes atos e se possa iniciar o processo de regularização das decisões de CML”, destacou o Bloco, salientando que enviou na terça-feira um requerimento a Carlos Moedas a pedir esclarecimentos sobre o caso.

Tal como Rui Tavares, Beatriz Gomes Dias destacou que, na reunião extraordinária desta quinta-feira, na qual não participou Carlos Moedas, o vice-presidente da autarquia, Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP), “não forneceu o parecer jurídico que alegadamente justifica a legalidade da reunião, apesar dos vários pedidos” dos vereadores da oposição.

Rui Tavares salientou “trata-se de um assunto bastante sério”, porque basta haver um tribunal a declarar que as decisões podem ser impugnadas para que centenas de decisões tomadas nos últimos meses sejam postas em causa.

Também num comunicado, os vereadores do PS criticaram a Câmara de Lisboa por “recusar partilhar (o parecer) com todos os vereadores”.