O Movimento da Terra de Miranda acusou esta sexta-feira a Movhera de “comportamento colonial” relativamente às comparticipações que a concessionária das seis barragens transmontanas dá a associações culturais e desportivas deste território, apelando às autarquias para assumirem estes apoios.
“Só com as comparticipações dos municípios às associações e outras coletividades locais, sejam culturais ou desportivas, se podem rejeitar estes apoios que são considerados humilhantes e desrespeitosos da dignidade das populações, sendo uma prática habitual desta empresa”, disse esta sexta-feira à Lusa fonte deste movimento cívico.
Em comunicado, o Movimento Cultural da Terra de Miranda (MCTM) indica igualmente que os municípios deste território têm o dever de exortar os cidadãos e organizações locais a rejeitar estas “esmolas” enquanto as empresas não regularizarem as suas obrigações fiscais e não demonstrarem respeito pela região.
“Paralelamente, as autarquias devem substituir estes pseudofinanciamentos por apoios municipais ou nacionais dignos e adequados”, vincou o MTC na mesma nota.
O MCTM apontou como exemplo o patrocínio que a Movhera deu recentemente ao Festival Geada que decorreu em Miranda do Douro no passado fim de semana, “com algumas centenas de canecas de barro de valor irrisório, que se esgotaram logo no primeiro dia e, de tão frágeis, partiam-se nas mãos dos festivaleiros”.
“Apesar disso, a empresa fez questão de marcar cada peça com o seu logótipo. É inadmissível que a Movhera tente associar-se a este evento de importância cultural com contribuições indignas e ridículas. Este comportamento não é novo. A Movhera tem por hábito oferecer migalhas a eventos e instituições da Terra de Miranda, tentando conquistar o apoio das populações com ofertas de valor ridículo, como míseros ‘pratos de lentilhas'”, vincou o MCTM.
A organização cívica refere que “estas atitudes revelam um total desprezo pelos habitantes desta região, legítimos detentores dos recursos naturais de onde a empresa retira, anualmente, centenas de milhões de euros”.
“Estas práticas extrativas têm raízes nos tempos coloniais e são absolutamente intoleráveis. Imagine-se o que aconteceria se o Estado Francês, que controla a Movhera, ou o Estado Chinês, proprietário da EDP, testemunhassem empresas estrangeiras a explorar os seus recursos naturais e a desprezar as suas populações. Nunca o aceitariam”, destaca o movimento nordestino.
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Para o MCTM, “a situação agrava-se ainda mais pelo facto de estas empresas estarem indiciadas pela prática de Fraude Fiscal Agravada”.
“A Movhera e a EDP recusam-se a pagar os impostos devidos, incluindo impostos básicos como o IMI, que qualquer cidadão paga de forma honrada. As vítimas deste crime são os cidadãos da Terra de Miranda e os municípios que os representam, os mesmos que a Movhera tenta comprar com ofertas indignas”, lê-se na mesma nota enviada à Lusa.
“Há, por isso, um conflito entre empresas indiciadas pelo crime de fraude fiscal agravada (EDP e Movhera) e as suas vítimas (o povo da Terra de Miranda). Com este comportamento, os indiciados do crime pretendem aliciar as suas vítimas com ofertas de valor ridículo por parte de uma das indiciadas”, consideram os membros do MCTM.
A vertente fiscal das barragens começou a ser discutida há quatro anos, na sequência da venda pela EDP de seis barragens em Trás-os-Montes (Miranda do Douro, Picote, Bemposta, Baixo Sabor, Feiticeiro e Tua), por 2,2 mil milhões de euros, a um consórcio liderado pela Engie.
Os autarcas do distrito de Bragança reuniram-se em 20 de dezembro com a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais garantindo na altura que receberam indicações por parte da governante de que foram emitidas notas de liquidação de IMI relacionadas à transação das barragens.
Contactada pela agência Lusa, a Movhera remeteu para mais tarde uma posição sobre o assunto.