A vontade de ganhar era tanta que tornou o caminho mais curto para a derrota: depois de cinco vitórias consecutivas com 17 golos marcados e apenas um consentido, na sequência do período menos conseguido da equipa que teve a goleada sofrida frente ao Club Brugge e o empate nos descontos no Estoril, o FC Porto voltou a perder num clássico marcado pela expulsão de Eustáquio ainda antes da meia hora inicial e teve um travão na melhor série da temporada. A margem para encostar, parar e pensar sobre o que aconteceu de melhor ou pior não existe e era nesse contexto que surgia já uma deslocação à Bélgica para defrontar a grande sensação da Liga dos Campeões, na antecâmara de uma jornada decisiva em casa com o Atl. Madrid que podia ter tudo resolvido, necessitar de um empate ou obrigar a um triunfo. No entanto, nem isso afastara a boa disposição de Sérgio Conceição ainda a propósito da expulsão com o Benfica.

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“Vou aproveitar agora para fazer uma pequena declaraçãozinha, porque se perder o jogo não a faço e dizem que é porque estou com azia, e é verdade, e se ganhar dizem que também só fiz porque ganhei… Quero agradecer à Bélgica, um país que me acolheu de uma forma fantástica enquanto jogador, onde fui Bota de Ouro, onde iniciei a minha carreira de treinador, onde tirei os níveis II e III. Quero agradecer ao Standard de Liège e à Bélgica pela forma como trataram a mim e à minha família durante quatro anos”, comentou no final da conferência de imprensa quase que a esvaziar o balão de pressão do encontro.

A oito ponto do líder Genk na Liga belga, o Club Brugge chegava à quinta jornada da Liga dos Campeões com dez pontos, com sete golos marcados e sem nenhum sofrido. Com Mignolet gigante na baliza (só o jogo que fez no Wanda Metropolitano com o Atl. Madrid valeu por toda a época), com uma defesa organizada e a dominar o jogo aéreo, com um meio-campo com pilhas extra bateria que consegue controlar qualquer tipo de transição, com um ataque onde se destaca o ex-Barcelona Ferran Jutglà. O sonho dos oitavos já estava cumprido, a possibilidade de fechar na primeira posição encontrava-se à distância de um empate frente ao FC Porto com essa alteração do fator surpresa que se tinha esgotado desde logo no Dragão.

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“O que mudou com a goleada? Nada. Veio comprovar o que tinha dito. Estamos perante uma equipa com mentalidade ganhadora, habituada a ganhar aqui. Em quatro campeonatos ganhou três. Semanalmente entra sempre para ganhar e isso é importante numa equipa de futebol. Surpreendeu-nos quando fizemos a análise. Com e sem bola é uma equipa interessante, agressiva sem bola, pressionante, que ocupa bem o espaço, gosta de ter bola, com mobilidade, o que é uma mais valia para a equipa deles. A prova disso é ainda não ter golos sofridos. É consistente, está apurada. A nós cabe-nos fazer, sem dúvida, um jogo diferente do Dragão. Aí foi demérito nosso também. Estamos mais do que avisados do que temos de fazer, o que temos a aproveitar”, destacara o técnico sobre os principais objetivos para o encontro.

Mais do que estarem avisados, os dragões estavam feridos no orgulho. Resultados maus podem acontecer a todos mas, naquele jogo da Invicta, a lei de Murphy que se abateu não fez jus ao que o FC Porto consegue fazer na Champions, onde é o principal representante nacional há três décadas. Na Bélgica, também isso voltou a estar presente – aquele ADN Porto que Sérgio Conceição tantas vezes destaca é um mundo à parte a nível português na principal competição europeia de clubes. No final, foi isso que fez a maior diferença, com uma das melhores exibições em termos coletivos da época. Depois, e à luz disso, apareceram de forma natural as individualidades. Taremi, com mais um jogo incrível de inteligência e instinto naquela versão 9,5 que continua a merecer nota 10. Galeno, cada vez mais evoluído dentro da ideia de jogo dos portistas e com a velocidade como fator diferenciador. Diogo Costa, a parar uma grande penalidade (desta vez com direito a repetição) pelo terceiro jogo seguido. Otávio, aquele Tavinho que já tinha ajudado ao triunfo em 2016 e que é agora capitão e um senhor jogador. A “vingança” pela mesma conta do 4-0 até ficou curta.

Ficha de jogo

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Club Brugge-FC Porto, 0-4

5.ª jornada do grupo B da Liga dos Campeões

Jan Breydelstadion, em Bruges (Bélgica)

Árbitro: Michael Oliver (Inglaterra)

Club Brugge: Mignolet; Odoi (Meijer, 71′), Mechele, Sylla (Boyata, 71′), Buchanan; Casper Nielsen (Audoor, 80′), Onyedika (Balanta, 80′), Vanaken; Skov Olsen (Nusa, 71′), Lang e Jutglà

Suplentes não utilizados: Lammens, Larin, Yaremchuk e Sandra

Treinador: Carl Hoefkens

FC Porto: Diogo Costa; Pepê (Rodrigo Conceição, 88′), Fábio Cardoso, David Carmo, Zaidu (Wendell, 77′); Otávio, Uribe, Eustáquio (Bruno Costa, 77′), Galeno (Gabriel Veron, 77′); Evanilson (Toni Martínez, 88′) e Taremi

Suplentes não utilizados: Cláudio Ramos, Marcano, Grujic, André Franco, Bernardo Folha, Danny Namaso e Gonçalo Borges

Treinador: Sérgio Conceição

Golos: Taremi (33′ e 70′), Evanilson (57′) e Eustáquio (60′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Odoi (28′), Eustáquio (29′), David Carmo (49′), Sylla (54′), Onyedika (55′) e Uribe (65′)

Com um ambiente verdadeiramente frenético que fazia com que se pensasse que tudo estava a decorrer no Estádio do Dragão (e sem qualquer sinal dos adeptos belgas que pudesse contrariar isso mesmo), o Club Brugge teve uma primeira tentativa de saída como é habitual nos jogos da Champions mas foi a partir daí afogado pela enxurrada ofensiva do FC Porto, a tomar conta do meio-campo para conseguir depois criar os desequilíbrios dos corredores laterais para o central. Taremi, na sequência de um canto, teve uma ameaça inicial fraca para Mignolet (6′) e uma tentativa por cima de Eustáquio após um passe picado de Otávio que merecia melhor conclusão na área (7′) antes de mais duas oportunidades num minuto entre um remate enrolado de Taremi cortado para canto e um remate de pé esquerdo de Uribe após amortecimento de David Carmo num canto que saiu por cima (15′). No campo como nas bancadas, era Porto, Porto, Porto.

As chances mais flagrantes estavam ainda por jogar, sendo que havia um dado que dizia tudo sobre o que os belgas faziam (ou não conseguiam fazer) no encontro: Jutglà, a grande referência ofensiva contratada ao Barcelona este verão, tocou na bola no pontapé de saída e esteve nos 25 minutos seguidos só a olhar até quando descia na posição natural. Já o FC Porto continuava o festival de falhanços, com Taremi a surgir isolado perante Mignolet com nova assistência de Otávio a rematar por cima (16′) e Galeno a concluir na área uma grande jogada coletiva entre esquerda e centro com um remate que sairia ao lado mas que foi desviado por Evanilson em posição irregular (26′). O golo parecia inevitável e apareceu mesmo pouco depois da meia hora, com Otávio a isolar Taremi com um fantástico passe de rutura que dessa vez não foi desperdiçado pelo iraniano (33′). 393 minutos depois, os visitados sofriam na Champions.

A vantagem só pecava por tardia sem que o Club Brugge conseguisse sair do autêntico colete de forças onde tinha sido colocado pelos azuis e brancos mas era altura também de gerir o momento do jogo tendo em conta não só a chegada do intervalo mas também alguns problemas físicos que colocavam a continuidade de Zaidu em dúvida. Era isso que Sérgio Conceição e Vítor Bruno pediam na zona técnica, era isso que os jogadores cumpriam, com David Carmo a fazer três cortes consecutivos de cabeça na área perante as ténues tentativas dos visitados de colocarem no meio da confusão em busca de uma bola de sorte.

O segundo tempo começou sem alterações mas a um ritmo eletrizante que promoveu toda uma cadeia de acontecimentos que decidiria o vencedor do jogo: David Carmo cometeu um penálti sem necessidade com a bola fora da área sobre Mechele, Diogo Costa travou a tentativa do capitão Vanaken, o árbitro mandou repetir o lance por uma nova falta quando parecia ter existido uma entrada demasiado cedo na área mas o guarda-redes portistas voltou a estar gigante na baliza, travando a cobrança de Lang para a terceira grande penalidade consecutiva travada em jogos consecutivos (52′). Pouco depois, aproveitando um ressalto na área após uma segunda bola ganha de cabeça, Evanilson marcou o 2-0 (57′). E, logo de seguida, Galeno arrancou pela direita, cruzou para Taremi fazer a assistência e Eustáquio, ao segundo poste, marcou 0 3-0 na recarga depois de uma primeira defesa do desamparado Mignolet (60′).

Em três minutos, a esperança dos belgas esfumou-se. Em três minutos, o fogo do dragão voltou a ganhar força. Vingança não é propriamente um termo querido ou justo no futebol mas aquela goleada sofrida na Invicta ainda estava a pesar no subconsciente de uma equipa que mostrou mais uma vez o porquê de ser uma habitué na principal competição europeia de clubes. E foi assim, entre uma derrocada total do Club Brugge em termos defensivos, que o FC Porto chegou ainda ao 4-0 por Taremi, numa segunda bola ganha por Galeno após lançamento lateral de Zaidu que teve mais uma assistência de craque de Otávio (70′). No último quarto de hora, onde Diogo Costa ainda tirou um golo a Jutglà, ficou a ideia de que os azuis e brancos não tinham mais frescura física mas o quinto foi sempre ameaça em cada ataque feito…