Não se sabe quantos Apple Watch a empresa da maçã já vendeu. Nem será esta terça-feira que essa informação chegará ao mercado, já que os resultados trimestrais que a Apple apresentará não terão números oficiais para as vendas do relógio inteligente lançado em abril. Mas várias consultoras e analistas receiam que, após um arranque positivo, as vendas estejam a ficar bem abaixo do esperado. Já há quem fale num flop, mas outros analistas dizem que, tal como aconteceu com o iPhone, é preciso dar tempo a este dispositivo que conta o tempo, mas faz muito mais.
Os analistas e investidores vão, na noite de terça-feira, tentar obter pistas mais ou menos sólidas sobre como estão a evoluir as vendas do Apple Watch, o primeiro novo produto introduzido pela Apple desde o iPad – ou seja, a primeira nova aposta da empresa na era pós-Steve Jobs. As vendas nos EUA arrancaram em abril mas ainda não há informação sobre quando este dispositivo estará à venda em Portugal – o Observador já é, porém, uma das mais de 3.000 apps disponíveis para o aparelho.
Não é difícil fazer uma pesquisa na Internet e encontrar as palavras Apple Watch e fracasso juntas. Demasiado juntas. E em finais de maio um vice-presidente da Apple, Jeff Williams, já reconhecia que o dispositivo estava a vender “muito, mas não o suficiente“.
As primeiras semanas correram bem. Foram vendidos, em média, 200 mil Apple Watch por dia. A julgar por esses primeiros dias, alguns analistas admitiam que a Apple pudesse vender até 40 milhões de aparelhos neste ano fiscal (até março de 2016). Mas um relatório da consultora Slice Intelligence mostrou, na semana passada, que a média diária de vendas caiu para cerca de 20 mil. Por entre relatos de fartura de dispositivos nas prateleiras e algumas lojas físicas da Apple, a Slice Intelligence indicou que as vendas online nos EUA até 10 de julho superaram ligeiramente os três milhões de unidades vendidas, a um preço médio de 505 dólares por unidade.
Cerca de dois terços desses três milhões de unidades são os Apple Watch mais baratos – o Apple Watch Sport – e, também, aqueles onde a Apple tem margem mais reduzida. As vendas restantes foram, sobretudo, da gama de aço inoxidável, onde houve 1,086 milhões de unidades vendidas, a um preço médio de 695 dólares cada. Por fim, os Apple Watch Edition adornarão, neste momento, os pulsos de menos de dois mil utilizadores, entre os quais estão celebridades como Beyonce, Kanye West e Katy Perry. Cada um destes smartwatches custa quase 14 mil dólares, o que dá uma média de quase mil dólares por cada um dos 18 quilates de ouro de que são feitos.
A Apple ainda não deu qualquer atualização sobre as vendas do aparelho, o que está a causar nervosismo porque isso era algo que a Apple costumava fazer – sobretudo, claro, quando havia boas notícias para dar. Assim, os analistas vão terça-feira escrutinar o relatório de resultados para tentar ter a melhor ideia possível sobre quantas vendas já foram feitas.
De qualquer forma, aquilo que interessa aos investidores – pelo menos no imediato – é que o dispositivo-bandeira, o iPhone, continue a elevar os lucros da Apple e a contribuir para que a empresa não só suba em bolsa como, também, continue a pagar bons dividendos anuais. O segmento de wearables, para já povoado apenas pelo relógio inteligente, representa menos de 4% da faturação da Apple. Mas as expectativas criadas, incluindo pela própria empresa, são elevadas. E qualquer sinal menos positivo poderá ser lido como uma incapacidade para continuar a inovar e a criar (ou revolucionar) mercados, como aconteceu com o iPhone e o outrora mais lucrativo iPad.
O dispositivo teve, desde o seu lançamento, críticas divergentes que o Observador sumarizou neste vídeo. Alguns utilizadores criticam a baixa autonomia e consideram-no lento, difícil de utilizar ou, pior, pouco útil. Mas alguns primeiros adotantes veem no Apple Watch uma primeira incursão num futuro em que os dispositivos wearable estarão por todo o lado. Não só utilizadores mas, também, analistas que acompanham a Apple.
Andrew Uerkwitz e Martin Yang, analistas da Oppenheimer, dizem que, a confirmarem-se as vendas pouco animadoras, estas “terão um impacto mínimo no desempenho da ação da Apple no curto prazo e não afetam a visão positiva” que têm “para esta categoria de produtos“. A dupla de analistas defende, em nota enviada ao Observador, que o Apple Watch representa o futuro daquela que será a nossa experiência computacional”.
O Apple Watch “é mais do que apenas um produto wearable. É um interface, um serviço entre um dispositivo central (o smartphone) e outros dispositivos periféricos”, dizem Uerkwitz e Yang, acrescentando que “é mais correto olhar para o Watch como uma app que está constantemente a correr como pano de fundo, constantemente a ouvir, constantemente pronta para alertar o utilizador e interagir com outras apps e outros dispositivos”.
Um dos analistas mais reconhecidos entre as dezenas que seguem a Apple é Gene Munster, da casa de investimento Piper Jaffray. O especialista tem uma recomendação de comprar e um preço-alvo de 162 dólares para a ação da Apple, o que significa que lhe atribui um potencial de valorização superior a 22% no médio prazo. Munster está um pouco mais pessimista do que a média dos analistas e aponta para vendas de três milhões de Apple Watch no trimestre terminado em junho. Na nota de análise às ações da Apple, o analista diz que tem falado com vários investidores e que tem sentido uma “deceção generalizada” e uma preocupação face àquilo que pode ser a “oportunidade de longo prazo” associada ao Apple Watch.
Mas, em poucas palavras, Gene Munster acredita que estes investidores com quem tem falado estão errados. O analista continua confiante de que as vendas do dispositivo vão acelerar gradualmente e o ano de 2017 pode ser “o ano da afirmação”. “Continuamos a acreditar que a adoção do Watch levará tempo e continuamos, também, a acreditar que o ano de 2017 poderá ser o ano da afirmação. Prevemos vendas de 14 milhões de dispositivos e 40 milhões em 2017″, altura em que este gadget já representará 9% da faturação da Apple.
A liderança da Apple, com Tim Cook à cabeça, tem-se fechado em copas e, amiúde, procurado desvalorizar os rumores de vendas abaixo do esperado. As últimas declarações detalhadas de Tim Cook surgiram numa teleconferência com analistas no final de abril. Aí, o presidente da Apple – que sucedeu ao falecido Steve Jobs –garantiu que “a procura inicial [estava a ser] maior do que a oferta“, numa alusão às dificuldades que foram noticiadas de clientes que não estavam a conseguir comprar o modelo desejado com a rapidez desejável. O problema arrastou-se e é, em parte, por esta razão que o relógio tem demorado a chegar a mais países, incluindo Portugal.
Quanto à procura pelo Apple Watch, Tim Cook fez a seguinte análise: “É difícil avaliar quando não se tem o produto em [muitas] lojas”, afirmou o presidente da Apple, garantindo que o negócio estava “completamente” a ser feito através de encomendas pela Internet naquelas primeiras semanas após a estreia. Mas acrescentou: “A resposta que temos tido por parte dos consumidores que acabam de receber o relógio tem sido extraordinariamente positiva“.
Decisivo para o crescimento do dispositivo é o número (e a qualidade) das apps que podem ser utilizadas. “Quando lançamos o iPhone tínhamos cerca de 500 aplicações prontas. Quando lançámos o iPad tínhamos cerca de 1.000 [feitas especificamente para o tablet]”, recorda Tim Cook, notando que “já existem mais de 3.500 aplicações prontas na App Store, portanto não podíamos estar mais satisfeitos com a forma como as coisas estão a correr nesse aspeto”.
Noutros “aspetos“, Tim Cook diz que a empresa está a “aprender rapidamente” a partir das críticas feitas pelos utilizadores e “em alguns casos, estamos a fazer ajustes para ir ao encontro daquilo que os clientes estão à procura”. De um modo geral, e sem dar números, o presidente da Apple garantiu que estava “muito satisfeito com a situação” e “entusiasmado por chegar a mais países até ao final de junho”. Portugal não foi um deles, não havendo ainda data prevista para a chegada ao mercado português.