Não são precisos muito mais do que três minutos — na verdade basta acrescentar-lhes sete segundos — para perceber que O Sol Voltou, o novo disco acabado de editar pelo músico e cantor português Luís Severo, de 26 anos, é um álbum de confirmação mas não é nada previsível. Paradoxal? Nem por isso.
“Primavera”, a canção de arranque deste novo disco, traz de volta alguns dos ingredientes que conhecíamos dos seus discos anteriores (mas mais de Luís Severo, o segundo): a voz de poeta vadio que vagueia pelos recantos alternativos de Lisboa, as tiradas poéticas sobre amor e desamor para afixar nas paredes ou ouvir em momentos íntimos (tristes ou apaixonados), um tom romântico-melancólico que é habitualmente mais romântico do que melancólico. Mas há diferenças e não são poucas. Este é na verdade um outro Luís Severo, não tivessem passado dois anos desde o disco anterior — isto se excluirmos um recomendável álbum ao vivo lançado entretanto na internet chamado Pianinho.
Num encontro no bairro de Alvalade, em Lisboa, a casa musical do músico (a outra, residencial, fica na Penha de França) onde este passa muitas horas em estúdio, Severo confirma-nos isso mesmo. Diz-nos, de óculos na cara, companhia de estimação por perto — uma cadelinha chamada Nico, que o acompanha pelos passeios de Alvalade rumo a uma pastelaria com esplanada de toldo — e acabado de se aperceber que comprou uma “pedaleira” para a guitarra bem maior do que a sua música calma exige: “Acho que o grande marco deste disco, independentemente de se gostar mais ou menos dele, é ter chegado — acho eu — a um sítio novo. Cheguei a um sítio diferente do que tinha feito antes”.
O diagnóstico é certeiro. Nesse encontro vespertino em Alvalade, durante uma tarde chuvosa e pouco luminosa que parecia querer embirrar com o título O Sol Voltou, o músico de 26 anos estava ainda a tentar compreender o álbum que ele próprio fez. “É muitas vezes através das conversas que vou descodificando e decifrando melhor os discos. Esta é a minha primeira entrevista sobre ele e ainda o estou a tentar perceber”, admite sem pruridos.
O álbum anterior de Luís Severo era uma coleção bastante coerente de canções, de temas mais ou menos próximos com arranjos delicados e simples, com uma instrumentação (baseada no piano e nas guitarras) que parecia seguir intuitivamente à boleia das letras romântico-poéticas. Eram oito canções de um aprumo e bom gosto que os “tops” do ano da imprensa musical não ignoraram, sem gorduras que denunciassem juvenilidade. Mas ainda se pressentia timidez, nomeadamente na colocação e projeção da voz.
Em O Sol Voltou, há mudanças, sobretudo de som: o disco arranca solene, com uma canção de mão cheia (“Primavera”) que se agiganta a cada audição, e há-de prosseguir mais contemplativo, mais seguro de si, a voz já sem pressa, só as palavras necessárias para pontuar a música. Os resquícios de urgência, que já era espécie de urgência de fim de noite, “e agora onde vamos depois do bar fechar?”, foram-se, deram já lugar à retrospetiva. Mas a isso já se voltará, porque para perceber O Sol Voltou é preciso antes compreender Luís Severo.
Crescer em Odivelas, querer cantar ao som da FlorCaveira
A infância, passou-a em Odivelas. Crescer ali, explica-nos o músico, não foi “uma coisa assim tão romântica, foi normal”. Faz uma pausa, diz-nos que se calhar vai dizer “uma coisa polémica”, talvez tenha até ponderado por um segundo se a diria ou não — mas diz mesmo: “Acho que és inevitavelmente uma pessoa com mais mundo se não cresceres no centro da cidade”. A tirada não fica por explicar, aprofunda e diz que a vida nos leva inevitavelmente para os centros “porque as cidades estão formatadas para que isso aconteça”, pelo que o ponto de partida ser diferente do ponto de chegada “é vantajoso, dá um distanciamento que pode ser positivo”.
A música abalou-o à chegada ao ensino secundário, quando se deparou com uma banda de um dos seus “cantautores favoritos” que “todos os meus amigos odeiam e que eu continuo a gostar”: os Bright Eyes, de Conor Oberst, “esse inventor do emo-folk…” A ironia vai-lhe pontuando o discurso, troça frequentemente de si mesmo, os trejeitos do rosto pendem habitualmente para o riso. Mais sério, diz que um pouco mais tarde ficou cativado pelos discos que a mãe tinha em casa, “de música brasileira”, e por músicos como “o Chico [Buarque], o Caetano [Veloso], o Jorge Ben Jor”. Diz que isso não é nada de especial, que “é um clique na vida de toda a gente” ouvir músicos destes, como se todos os jovens entre os 20 e os 30 anos tivessem ouvido esta trupe e ficado inevitavelmente melómanos. “Também comecei a gostar muito da PJ Harvey, do Bonnie Prince Billy, do Robert Wyatt…”.
É sempre difícil imaginar caminhos alternativos, mas é provável que Luís Severo não fosse quem é hoje — um músico que compõe como compõe — se não se tivesse deparado com uma outra tribo musical na adolescência: a FlorCaveira, editora independente que agitou a música nacional durante os anos 2000 com álbuns de Tiago Guillul, Samuel Úria, Os Pontos Negros, Manuel Fúria, João Coração, B Fachada e Diabo na Cruz, por exemplo.
Foi um “clique gigante” que arrastou Luís Severo para o meio. A FlorCaveira fê-lo perceber que “é possível cantar em português de uma forma diferente daquela que já conhecia” e que — em linguagem de conversa descontraída numa mesa de café — “o meio musical não tem de ser uma coisa ultra distante, séria, metódica e institucional, é possível existir um meio musical só de uns gajos…” A frase não termina mas fica a ideia: Luís Severo não quer dizer que essa produção pop alternativa em português tenha sido “inventada” pela FlorCaveira, longe disso, diz antes que aquele fervilhar musical novo que se sentia em Lisboa e arredores o encantou na altura certa.
Ao encanto não terá sido alheia a força da canção FlorCaveira. Apesar das diferenças entre os elementos que estiveram associados à editora portuguesa, é audível que partilhavam algumas características em comum, nomeadamente canções ao mesmo tempo com linguajar urbano — letras com palavras e ideias fora da norma — e tom poético-literário, com metáforas muito pouco habituais no pop-rock português. O método amador e a rebeldia da editora também conquistavam corações de adolescente como Severo: “Aquela coisa de fazeres um disco em casa, uns CDR-s no teu computador, pagar umas capas, colar uma bolacha ou nem sequer colar e vender a dois euros… ter conhecido isso foi interessante, não conhecia”.
“Quando se está há oito anos a acumular prejuízo…”
Entre os 15 e os 23 a 24 anos — portanto, até 2016 a 2017 — Luís Severo foi compondo e gravando música longe dos holofotes. Com um pendor mais experimental, mas gradualmente mais aprimorado, foi lançando canções e discos com o nome artístico O Cão da Morte, colaborando com outros músicos (o parceiro mais habitual era João Sarnadas, conhecido como Coelho Radioactivo) e “acumulando prejuízo financeiro”, como hoje diz com um sorriso na cara, até dar um sucessor ao seu disco Cara d’Anjo.
Nos primeiros anos, ainda não tinha vontade de fazer canções cantaroláveis, pop alternativa polida e bem produzida, com versos que ficam na memória e um som “profissional”. “Só tinha vontade de fazer, não importava o quê, queria era fazer, estar dentro do estúdio, ir experimentando. Gostava disso, o processo alimentava-me mais do que a conclusão”. Trocado por miúdos: em tempos, para Luís Severo, fazer canções era bom independentemente do resultado. O resultado não interessava assim tanto.
As canções, começou a fazê-las no quarto, ainda adolescente. Prosseguiu para “a cave”. De seguida, já mais experimentado e pronto para ser ouvido, aterrou no Bairro Alto, onde conviveu com Filipe Sambado e muitos outros músicos (associados à editora Cafetra e ao coletivo Maternidade) num estúdio coletivo ali alugado. A mudança foi importante, a sensação de que era altura de se afirmar emergiu e, passados vários anos a fazer música por carolice, deu uma guinada no percurso musical para assumir o nome de batismo. Foi então que gravou Cara d’Anjo, editado em 2015.
O seu primeiro álbum como Luís Severo foi também o seu primeiro passo rumo à polidez, o primeiro disco com uma intenção mais “conclusiva”, a primeira busca por um conjunto de cantigas com um som mais polido, com letras e voz mais expostas e mais cantaroláveis. O primeiro disco mais pop e menos experimental, portanto.
O lo-fi (som roufenho, de “baixa fidelidade”) ainda não tinha sido abandonado por completo e até estava alinhado com a comunidade em que Luís Severo se inseria. As companhias diárias e artísticas eram refletidas na quantidade de colaboradores que Severo convocou para tocar no seu Cara d’Anjo: além de uma banda que incluía Filipe Sambado, tiveram participações especiais (portanto, pontuais) o parceiro de alguns anos Coelho Radioactivo, a baterista das Pega Monstro Júlia Reis, o músico da editora Cafetra “Vaiapraia” e o ainda mais jovem Primeira Dama, por exemplo.
Esse primeiro disco como Luís Severo era diferente da música que fizera antes. Aumentou-lhe o número de concertos e aproximou-o de uma identidade de músico capaz de pôr alguns grupos a cantar as suas canções. A profissionalização ainda não era, porém, uma realidade e até pouco antes Luís Severo não estava seguro de que chegaria mesmo: “Havia um sonho mas tive dificuldades em acreditar. Foram muitos anos em que isso estava mesmo muito longe. Quando se está há oito anos a acumular muito prejuízo a fazer música — prejuízo financeiro, porque havia retorno emocional —, claro que se sonha viver da música mas isso não é bem acreditar, acho eu”, aponta.
O segundo álbum como Luís Severo foi momento de afirmação. O músico já esperava que “o segundo disco desse um bocadinho de salto”, mas “foi um pouco maior do que estava à espera”. Passou a ter mais concertos, o que lhe permitiu dedicar-se à música a tempo inteiro porque “além de gostar muito de tocar ao vivo” as atuações são “a forma que tenho de ganhar algum dinheiro” como músico. Passou a “saber que ia tocar e ia ter pessoas a ver”, mas não tomou nada por garantido e continua a não tomar: “Hei-de ter momentos melhores e piores, acho importante não forçar nenhum hype. As coisas têm-me acontecido aos poucos e estou muito feliz, contente, agradecido”. Ei-lo agora de volta, com O Sol Voltou.
Um caderno de escritos que acabou em 35 páginas word
“Nico, aqui. Nico, anda cá, senta”. As ordens vão-se sucedendo enquanto Luís Severo percorre as ruas de Alvalade, onde já gravou dois discos — o último dos quais editado na passada sexta-feira, 17 de maio. É um álbum que compôs e gravou sem pressas e é também, para o músico, “um disco para ouvir com mais calma, mais sereno, talvez mais lento”.
Depois de gravar o álbum anterior, Luís Severo passou praticamente um ano, entre a primavera de 2017 e o início de 2018, “a escrever muitas frases, aforismos, coisas soltas de que gostava e que sabia que iria querer depois incluir”. Algumas foram escritas “muitos antes de ter música” para elas na cabeça. Quando passou os escritos à mão do caderno para o computador, apercebeu-se que tinha material de sobra. “Ficaram 35 páginas word com letra 11 — e sem espaçamento entrelinhas”, conta, entre risos.
Tendo passado quase um ano sem grandes preocupações de criação — diz porém que escreveu “muitas letras em comboios e autocarros”, em viagens pelo país —, começou a pensar mais seriamente na forma de um álbum novo já nos Açores, numa residência artística que fez no Arquipélago – Centro de Artes Contemporâneas, na Ribeira Grande (São Miguel), no início do ano passado. “Esse momento foi crucial, foi quando decidi: ok, acabou a palhaçada, a partir de agora vou estar a fechar coisas e vou finalmente começar a pensar mesmo em canções, em fechar canções”.
Quando regressou a Lisboa da residência (que durou uma semana), continuou a finalizar a estrutura dos temas. As letras foram mudando — cada tema teve “umas cinco versões de letra” e Severo chegou a cantá-los com variações nos versos, já em estúdio —, mas os arranjos tinham um pressuposto mais definido do que em discos anteriores. O músico sabia que queria ser ele a tocar todos os instrumentos, o que acabou por acontecer, e que na base da maioria dos temas do disco queria ter quatro instrumentos convencionais — guitarra clássica, guitarra acústica, guitarra elétrica e piano — acompanhados por camadas eletrónicas de “beats, teclados e baixos sintetizados”. O Sol Voltou começou a tornar-se, assim, o seu disco “simultaneamente com mais coisas acústicas e mais coisas eletrónicas” — portanto, mais cheio e intrincado.
Ter andado a ouvir “muita música instrumental” (sobretudo jazz) antes de compor e gravar também levou a que o som dos instrumentos “respire” mais. Terá influenciado igualmente o facto de a voz não estar tão omnipresente no disco — embora apareça sempre projetada e límpida quando surge, a ponto de Severo achar este o seu disco “mais bem cantado”.
Até aqui, o autor de O Sol Voltou nunca tinha gravado todos os sons de um álbum seu, também, mas desta vez assumiu “as despesas da casa”, como diz, para ter um disco o mais próximo possível do que imaginou na sua cabeça. Também a experiência de 11 anos a fazer música e os muitos músicos com quem “aprendeu” ajudaram-no a conseguir compor um disco “musicalmente se calhar um bocadinho mais evoluído”.
Fã de letristas como “Zeca Afonso, Samuel Úria, B Fachada, a Mary das Pega Monstro, o Filipe Sambado ou o Éme”, a quem identifica na escrita “coisas próprias como gostava que identificassem na minha”, Luís Severo é habitualmente elogiado pela qualidade dos versos. Defensor da ideia que “nem tudo é autobiográfico” mas também crítico da posição de que nada do que se escreve “é pessoal e tem uma ligação íntima”, o músico garante que “há assuntos neste disco que já queria ter cantado antes e que se calhar não tive coragem”. Ou então trata-se simplesmente de “ideias que levam tempo”, porque “só um tempo depois” das coisas que lhe acontecerem é que o músico consegue “falar sobre elas”. Isso “acontecerá com mais gente, não é uma coisa muito especial minha, é preciso tempo para ganhar lucidez para contar e cantar certas coisas que nos acontecem”.
No coração de Severo também bate um fadista (mas não só)
O Sol Voltou saiu mais ou menos de surpresa, sem grande aviso prévio. Não é um disco de singles, é um disco para ouvir ao fim de tarde ou noite, sem interrupções próprias de um dia de trabalho. “Acho que é um disco que funciona bastante como um todo e quis que ele saísse dessa forma”, aponta o cantor e compositor.
A canção mais badalada deverá ser a que arranca o disco, “Primavera”, um daqueles temas que pode ser citado quase até à exaustão, com versos como “A liberdade é estar longe / e não querer estar perto / abrir o meu peito ao teu / choque elétrico”, ou ainda:
“Em cada peito há um instante que canta:
Liberdade, só me reconheço em beijos teus,
Sabem sempre a hoje, beijos teus.
Dás-me um dia inconsciente
Mas devolves-me a noção
Só quando for mesmo importante.
Dás-me um futuro que tu chamas de presente
Por ser já concretização
Do que para mim é tão distante”
Esse tema inaugural “tem muitos destinatários”, alerta Luís Severo, dizendo que passam por “pessoas mais íntimas mas também um destinatário um bocado mais coletivo”. A canção nasceu-lhe quando começou a pensar sobre sentir-se “livre” quando está “afastado de muita coisa” mas “ao mesmo tempo achar que isso é um bocado uma cobardia, no sentido de que esse afastamento das pessoas — meu e de muitas, não de todas — face às coisas pode contribuir para coisas más”.
Há aqui política expressa em beijos? “Se calhar estamos numa fase do mundo em que é preciso ter consciência de que há coisas más muito próximas e muitas já estão a acontecer. Aqui em Portugal vamos, não sabendo bem como, escapando, apesar de já se verem algumas coisas”, aponta Severo, logo esclarecendo que este comício é interior: “Digo aquilo para me consciencializar a mim próprio. Sou eu a dar um sermão a mim mesmo: não sejas tão afastado da realidade social e política, porque estão a acontecer coisas que te afetam ou que afetam outras pessoas — e eu não devo ter a parvoíce de querer ser inconsciente e estar longe desses problemas”.
Lisboa, amplamente abordada no disco anterior com os seus problemas de habitação e desigualdades sociais, é aqui deixada em grande parte de lado, porque o músico já não tinha “muito mais a dizer, então apeteceu-me falar de outras coisas”. Muita coisa mudou na sua vida em Lisboa, também. Embora continue a ensaiar e gravar em Alvalade e a morar na zona da Penha de França, de que gosta por ser um bairro com “muita vida e vidas muito diferentes” onde sente que “ninguém é mais estranho que ninguém”, tem passado mais tempo fora da capital devido às viagens pelo país e atuações ao vivo. Se isso o tem ajudado a firmar alguma certeza é de que “a cada ano que passa vou tendo consciência de que não quero viver em Lisboa a vida toda”.
Embora todo o disco seja uma corrente contínua e lógica, sem gorduras, há temas que merecem atenção redobrada. “Maio”, por exemplo, é uma canção terna que justifica menção —,é nela que Severo canta que “hoje o sol voltou”, o título do disco, e é nela que entoa versos como “O nosso amor partiu a medo / e em tanto desencontro / voltou mais sossegado. / Aos poucos fomos aprendendo, teimosos como touro, / o amor desarrumado”.
Capaz de disputar com “Primavera” o troféu de canção mais memorável deste álbum, “Joãozinho” é um tema irrepreensível, parece que nenhum elemento está em falta ou em excesso, e toda a letra pede atenção — “Perdoa essa gente tão chata / que a vida é boa sem ter anjo da guarda” ou “quem te quis dourar a história / em conquistas e vitórias / quanto te escondeu” são apenas alguns versos de exemplo. “Cheguei Bem”, que lembra vagamente o tema “Tédio” de Éme (com quem chegou a trabalhar como produtor musical), também não tem grandes falhas. E o que dizer da bela simplicidade (e atenção às aliterações) com que Severo canta:
Se é minha riqueza não ter patrão,
não vou mentir: a vida assim
não é dura, não.
A grande surpresa, contudo, vem logo na segunda faixa, com o tema “Acácia”. Ligeiramente afadistado, ainda mais quando Luís Severo canta “e passa devagarinho / junto ao Campo Santana”, reflete o facto de este rapaz de 26 anos “ouvir muito fado”, embora tenha “pudor” em o incluir na sua música e “em mexer no fado”. O gosto veio-lhe primeiro da mãe, que “ouvia muito” o género musical, mas acentuou-se quando ouviu “o [Alfredo] Marceneiro com calma”. Esse momento “mudou muito” a sua vida — acabou por ficar “maluquinho do fado” e mais o ficou quando descobriu a fadista Argentina Santos, conta.
Já tendo também estudado esta cultura musical de grande implantação em Lisboa numa disciplina da faculdade (frequentou o curso de sociologia), tem “pudor” em chamar fado a “Acácia”, por não querer “ofender ninguém que seja muito purista”, mas admite que “é uma canção que tem bastante de fado e que nunca teria feito se não tivesse ouvido imenso fado”.
Descontraído, Luís Severo diz que não sente neste momento o medo que já o assaltou em tempos, de não conseguir voltar a compor. Acha que tem mais canções dentro de si. Por ora, no entanto, o grande desejo é o de apresentar estes temas tantas vezes quanto possível, a começar já no dia 22 de maio no B.Leza, em Lisboa, a 29 e 30 de maio no Cinema Passos Manuel, no Porto e a 14 de junho no Salão Brazil, em Coimbra.
Severo está com vontade de ir para estrada, “ir ao máximo de sítios possível”, mas não esconde alguma ansiedade: “Sempre que fazes um disco diferente, não sabes como as pessoas vão reagir a uma coisa que não é igual ao que tinhas feito antes. São novos acordes de guitarra e de piano. Este disco resultou de estar à procura de algo, na verdade ainda estou, ainda não encontrei. Não nego que é um disco de procura, ainda”. Talvez Severo não tenha afinal mudado tanto quanto isso: a busca continua a alimentá-lo tanto ou mais do que o resultado, por mais apurado que esteja O Sol Voltou.