Os Ensaios do Observador juntam artigos de análise sobre as áreas mais importantes da sociedade portuguesa. O objetivo é debater — com factos e com números e sem complexos — qual a melhor forma de resolver alguns dos problemas que ameaçam o nosso desenvolvimento.

O trabalho para casa (TPC) faz parte do quotidiano dos alunos – e, porque é geralmente feito em casa, das famílias. “Já fizeste os TPC?” deve ser uma das perguntas mais repetidas nos serões das residências portuguesas. Até aqui, nada de novo. Toda a vida existiram TPC e em todo o mundo são aplicados pelos professores – e mesmo entre os professores houve sempre uns que os usaram mais do que outros. Contudo, nunca como hoje se ouviram tantos a questionar a sua utilidade. Seja entre pais que discordam da sobrecarga de horas de trabalho, em particular no caso de alunos que tenham actividades fora da escola. Seja entre professores que optam por não atribuir TPC aos seus alunos e preferem gerir a qualidade do estudo dentro da sala de aula. Seja entre médicos, nomeadamente psicólogos e pediatras, que salientam os efeitos nefastos do TPC no desenvolvimento cognitivo das crianças. Seja, por fim, entre políticos que vêem nos TPC um factor de promoção de desigualdades – isto porque nem todos os alunos têm boas condições de estudo em casa.

As críticas são geralmente ruidosas, mas há também o outro lado da moeda: não faltam vozes a defender que os TPC são necessários e eficazes, ou mesmo característicos de sistemas educativos competitivos e que formam bem os seus alunos. Exemplo: argumentam os seus defensores que os TPC ajudam a melhorar os desempenhos escolares. Mas não só: que servem também para desenvolver maior autonomia e responsabilidade nos alunos, assim como mantê-los focados e motivados em relação à escola.

Com dois lados em oposição, montou-se um debate fraturante em que se disparam discordâncias e em que não faltam opiniões. Mas e certezas? Ora, no meio de tudo isto, certezas há poucas. É que, afinal, sem olhar às evidências e aos indicadores sobre a realidade dos TPC, a pergunta fundamental permanece sem uma resposta satisfatória: os TPC são benéficos para os alunos? É a essa pergunta que este ensaio visa dar resposta. Isto é, dar várias respostas, porque a pergunta comporta várias dimensões – sobrecarga de tempo, desempenhos escolares e competências pessoais. E, no final, quase todas vão dar à mesma conclusão: sim, o TPC pode ser benéfico, mas torna-se prejudicial quando se acumulam várias horas diárias ou semanais.

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Quantas horas estudam os alunos? Muitas

Um dos pontos-chave do debate sobre os TPC está no tempo que os alunos dedicam ao estudo em casa, que se soma ao tempo que já passaram nas aulas da escola. Será que, no total, os alunos passam demasiadas horas semanais a estudar/trabalhar, tempo esse que (em parte) poderiam investir noutras actividades (também importantes para o seu desenvolvimento)? Enquanto uns acham que sim e outros acham que não, não há nada como ir espreitar os números.

Usando como referência os dados do PISA 2015 da OCDE, observamos que os alunos portugueses investem, em média, 17 horas semanais a estudar fora da escola (o que inclui TPC, explicações e estudo autónomo). No contexto europeu, isto coloca Portugal a meio da tabela – uma metade dos países da UE apresenta um valor mais elevado, a outra metade tem valores mais baixos (gráfico 1). Na Grécia e em Itália, os alunos investem 21 horas semanais em estudo fora da escola. Na Alemanha e na Finlândia, o tempo de estudo semanal fica entre 11 e 12 horas. A esmagadora maioria dos países posiciona-se entre as 15 e as 18 horas semanais. Ou seja, nesta perspectiva comparada, aparentemente tudo está normal em Portugal. Quer isto dizer que o debate está encerrado e que os alunos portugueses estão numa posição de equilíbrio em relação aos seus parceiros europeus? Não – falta olhar para o resto da fotografia.

O cenário muda de figura se olharmos ao tempo total de aprendizagem (gráfico 2). Isto é, se somarmos o tempo de estudo em casa ao tempo já despendido em aulas na escola (ou seja, “estudo em casa” + “aulas na escola”). Ora, sendo Portugal um dos países onde mais tempo se passa nas aulas, o tempo total de trabalho dos alunos portugueses ascende aos mais elevados da UE: 45 horas semanais, só superado por Dinamarca (46), Polónia (46), Espanha (47), Grécia (48) e Itália (50). O número impressiona, sobretudo porque está em causa uma duração superior à estabelecida no código de trabalho (as 40 horas semanais). Mas o que é realmente relevante para o debate não é tanto esse indicador – só três países não alcançam um total superior a 40 horas – mas o facto de Portugal estar nos lugares cimeiros entre os países europeus. Na prática, isto significa que os jovens portugueses têm 57% do tempo disponível nos dias úteis (excluindo as regulamentares 8 horas de sono) dedicado ao estudo. Um valor muito longe da Finlândia (45%) ou da Alemanha (46%), acima do de França (53%), Reino Unido (54%) e Irlanda (55%), e só superado por alguns, nomeadamente pelos países do sul europeu – Espanha (58%), Grécia (60%) e Itália (62%) (gráfico 3). Desconte-se agora mentalmente a duração dos trajectos casa-escola-casa e das refeições para se ficar com uma ideia clara de como a escola e o estudo preenchem a vida dos jovens um pouco por toda a Europa, estando Portugal no pelotão da frente.

O TPC ajuda a melhorar os desempenhos escolares? Sim, mas…

Os números mostram que os jovens passam muito tempo a estudar, seja na escola ou fora dela. A questão que se coloca é se esse tempo é bem investido. Dito de outro modo: será que os TPC ajudam a melhorar os desempenhos escolares? A resposta tem muitas áreas cinzentas, já que a investigação aponta geralmente em sentidos contraditórios. Por um lado, sim, as horas de estudo tendem a ter um efeito positivo nos desempenhos. Por outro lado, não, porque os efeitos no ensino básico são residuais e ainda porque, mesmo no secundário, muitas horas de estudo não produzem aumentos contínuos nos desempenhos. E depois há que filtrar estes resultados em função de outros factores, tais como a quantidade de TPC ou o perfil social dos alunos. Parece complicado, mas não é – como abaixo se mostra.

Sim: fazer os TPC compensa – mas só até um certo ponto. Os dados do PISA 2015 (gráfico 4) são particularmente interessantes, porque expõem com clareza esses efeitos para alunos de 15 anos. Por um lado, fica claro que dedicar algumas horas por semana aos TPC diminui acentuadamente a probabilidade de maus desempenhos. Ou seja, quem faz os TPC de forma regular tem maior probabilidade de subir os seus desempenhos. Por outro lado, há um ponto a partir do qual esse investimento nos TPC deixa de produzir o efeito desejado. Um aluno que dedique 6 horas semanais tem menos 66% de probabilidade de apresentar maus desempenhos escolares e um aluno que dedique 7 horas semanais tem menos 70% de probabilidade de ter maus desempenhos. Mas um aluno que dedique 8 horas semanais já vê essa probabilidade diminuir – 68%, ou seja menos do que um aluno que dedicou menos uma hora semanal ao TPC. O que é que isto significa? Simples: não vale a pena dedicar tempo excessivo aos TPC, pois estes, se levados a excessos, vão perdendo a sua eficácia.

Esta ideia acima é fundamental para o debate: não importa tanto discutir os TPC, mas sim o tempo despendido com os TPC, porque é na duração que se encontra a chave para determinar se os seus efeitos são positivos ou não.

Mantendo o foco da análise no PISA 2015, é possível constatar que, olhando aos desempenhos dos países a ciências e cruzando com o tempo de estudo fora da escola, há uma relação negativa: quanto mais tempo se estuda fora da escola, piores são os resultados (gráfico 5). Os dados devem ser lidos com prudência, na medida em que diz pouco comparar os resultados de países com pontos de partida tão distantes, como é o caso da Finlândia e da Turquia. Mas os dados sublinham algo que os indicadores já mencionados apontaram: a relação entre TPC e desempenhos escolares não é linear. Mais TPC não significa forçosamente melhores desempenhos.

Até aqui está tudo mais ou menos consensual, tendo em conta que o público-alvo da investigação do PISA 2015 são alunos de 15 anos. Mas a controvérsia do debate vai mais fundo, com três questões principais que correspondem àqueles detalhes que fazem toda a diferença. Primeira questão: os efeitos positivos verificam-se tanto no ensino secundário como no ensino básico? Segunda questão: como determinar a duração a partir da qual os TPC deixam de ser eficazes? Terceira questão: os TPC têm impacto igual em todos os alunos? Veja-se o que dizem os dados para cada uma das questões.

Ensino básico vs. Ensino secundário. Uma meta-análise da literatura académica apontou para diferenças nos efeitos do TPC nos desempenhos escolares dos alunos em termos de idade. Em resumo, os efeitos mais significativos observam-se nos alunos do ensino secundário (nomeadamente no 12.º ano), sendo os efeitos fracos (ou quase inexistentes) ao nível dos primeiros ciclos do ensino básico. Atenção, isto não significa que os TPC sejam inúteis nessas idades, mas sim que, com alunos mais jovens, é aconselhável que os professores não dêem TPC para além dos 10-15 minutos de duração. Por que razão os alunos mais jovens tiram menos proveito dos TPC? A investigação indica algumas respostas possíveis, das quais duas se destacam. Primeiro, do ponto de vista do desenvolvimento cognitivo, os mais jovens têm dificuldade em ignorar a informação que é irrelevante, dispersando-se mais facilmente – e, assim, extraindo menos ganhos para os seus desempenhos. Segundo, os mais jovens têm efectivamente menos hábitos de estudo, i.e. menos prática em estudar e sistematizar informação, factor que também diminui o seu ganho com os TPC.

Não existe uma duração semanal óptima e universal. Os dados da OCDE acima mencionados estabelecem como duração razoável cerca de uma hora por dia. Apesar de ser a duração mais commumente referida, esse valor não é inteiramente consensual e, sobretudo, não pode ser levado à letra. Por um lado, diversos estudos (mais antigos) sugerem que entre 1 e 2 horas por dia é equilibrado – para jovens no ensino secundário. Por outro lado, não são raros os investigadores que sugerem que 10 a 15 minutos por dia é suficiente, uma vez que o objectivo é consolidar conhecimentos adquiridos no dia de aulas na escola – uma espécie de recapitulação da matéria. O mais famoso entre esses investigadores talvez seja John Hattie, investigador que defende que não há efeito algum dos TPC ao nível do ensino básico. De resto, nunca é demais recordar que os alunos reagem de forma diferente aos TPC e que não existem soluções mágicas na educação. Como tal, converter uma duração média numa regra universal não é ajuizado: a média serve para enquadrar, mas cada aluno é um caso.

O historial da relação com a escola conta mais do que o perfil socioeconómico. Os dados da investigação apontam para disparidades sociais entre alunos em relação aos TPC. À partida, isto poderia significar que o perfil socioeconómico tem um impacto significativo no proveito que os alunos retiram dos TPC – o que em parte seria simples de explicar: nas famílias cujo perfil socioeconómico é mais baixo, observa-se em média menor valorização da escola e menor capacidade/interesse dos pais em ajudar os filhos. No entanto, um estudo da Universidade de Oviedo (Espanha) confirmou que, mais do que o perfil socioeconómico do aluno, o que realmente afecta a relação dos alunos com o TPC é o seu historial com a escola. Ou seja, alunos que tenham uma má relação com a sua escola são também os alunos que menos investem nos TPC. Naturalmente, estando o perfil socioeconómico associado aos desempenhos escolares, muitos dos alunos que demonstram essa má relação com a escola são também jovens oriundos de famílias com baixo perfil socioeconómico – daí estes dois factores muitas vezes se confundirem.

O TPC desenvolve outras competências ou causa stress? Ambos

O debate sobre os TPC vai muito para além dos desempenhos escolares e estende-se a questões de desenvolvimento cognitivo e de competências pessoais – organização, sentido de responsabilidade, autonomia. Um dos argumentos dos seus defensores é precisamente esse: os benefícios do TPC abrangem muitas áreas da formação pessoal dos alunos. Mas, quando os olhos vão para essas outras áreas, os críticos respondem: os TPC estão na origem de situações de stress que podem desencadear problemas de saúde. São convicções antagónicas e inconciliáveis? Nem por isso: tal como acontece em relação aos desempenhos escolares, a duração dos TPC é um dos factores-chave para determinar se os efeitos são positivos (competências) ou negativos (stress).

Comece-se pelo início: afinal, quando o enfoque sai dos desempenhos escolares, o que dizem os estudos sobre os TPC? Dizem que a resposta não é conclusiva em relação às suas vantagens ou desvantagens. De facto, alguns investigadores associaram aos TPC melhorias na autonomia e autodisciplina dos alunos, mas, no geral, esses estudos carecem de dados empíricos suficientemente sólidos para se retirar uma conclusão definitiva. É, aliás, essa a constatação mais frequente quando se mergulha no tema: faltam dados fidedignos acerca desses efeitos, até porque medir competências como a “autodisciplina” é difícil – e ainda mais difícil estabelecer uma relação causa-efeito entre a melhoria dessas competências e os TPC. Ou seja, a haver uma conclusão aqui, é a de que não é possível ter certezas sobre os efeitos benéficos dos TPC noutras dimensões que não a do desempenho escolar.

Dito isto, há algo acerca do qual existem menos dúvidas: levados a excessos, os TPC têm efeitos negativos no bem-estar físico e emocional dos alunos. Por exemplo, um estudo liderado por investigadores de Standford constatou que, em comunidades educativas altamente competitivas e onde os alunos estudam durante três ou mais horas diárias, os dados confirmam casos de stress, problemas físicos (insónias, dores de estômago, dores de cabeça) e desequilíbrios emocionais.

Quer isto dizer que os TPC causam stress? Nem por isso. O ponto fundamental para a leitura correcta destes dados é este: o problema não está tanto nos TPC mas sim na sobrecarga de trabalho sobre os alunos e na percepção de que não há margem para falhar – o que acontece nomeadamente nos sistemas educativos que têm avaliações de alto risco ou exames. Ou seja, por um lado, é incorrecta a simples associação dos TPC a problemas de saúde – tais efeitos negativos são consequência do excesso e não dos TPC que, em condições normais, não causam este desgaste físico e psicológico. Por outro lado, os efeitos da sobrecarga das responsabilidades escolares de um aluno (exames, TPC, aulas, actividades extracurriculares) na sua saúde é uma dimensão importante e que deve ser tida em conta por escolas, professores e demais agentes educativos.

Os TPC são um assunto de políticas públicas

O debate público sobre os TPC é geralmente composto por lamentos de pais e aconselhamento às famílias sobre como lidar com a rotina dos TPC em casa. No campo do debate político, observa-se sobretudo um braço-de-ferro entre críticos e defensores dos TPC, que por vezes resvala em propostas políticas controversas – tal como a de François Hollande em 2012, então Presidente francês, quando sugeriu a proibição de TPC ao nível do ensino básico. É, portanto, um debate pobre. Mas é também um debate com o potencial de ser muito mais rico: conhecendo-se os dados da investigação (os efeitos do TPC nos desempenhos escolares nas diferentes idades/ alunos, as limitações dos estudos) estão reunidas as condições para olhar para o tema da perspectiva das políticas públicas e perceber o que se poderia fazer para melhorar. Abaixo vão dois exemplos de medidas educativas possíveis e já testadas.

Centros de estudo após a escola. Diz a literatura académica que o TPC feito em casa é geralmente mais eficaz para a melhoria dos desempenhos dos alunos do que aquele TPC que é feito em contexto escolar. Mas, no caso de jovens de famílias desfavorecidas, o caso muda de figura: como não têm apoio ou condições em casa, a possibilidade de fazer os TPC após as aulas, num ambiente adequado e por vezes com apoio é muito benéfica para esses alunos. Benéfica como? A literatura académica divide-se sobre a força dos efeitos, mas concorda que existem resultados positivos nos domínios sociais, no relacionamento com a escola e nos desempenhos escolares (mesmo que aqui esses efeitos sejam menores) (gráfico 6). Isto, importa recordar, quando a oferta está inserida na rede pública e é gratuita.

Inovação ao serviço dos professores. Poder-se-ia fazer uma lista interminável de recomendações aos professores na hora de designar os TPC dos seus alunos – atribuir TPC que estejam adequados aos conhecimentos dos alunos, ser claro quanto às expectativas acerca do TPC, manter uma boa comunicação com os pais, variar no tipo de TPC atribuído. Mas, mais interessante, é salientar que é possível formar os professores em relação a técnicas para lidar com os alunos e aumentar o seu compromisso com os TPC.

Sim, à partida, não parece nada óbvio: como é que um professor pode ter influência no completar dos TPC se não está em casa do aluno? Uma resposta possível (e inovadora) é esta: desenvolver a perseverança dos alunos na realização de tarefas repetitivas através dos exemplos de heróis de banda desenhada (o chamado “efeito Batman”). Um estudo experimental verificou que, se os alunos forem desafiados a colocarem-se na pele de um dos seus super-heróis preferidos, aguentam mais tempo a fazer tarefas repetitivas e aborrecidas (como consideram ser os TPC) – isto porque os super-heróis são exemplos de quem coloca o dever acima das tentações lúdicas. No caso deste estudo, uma parte da experiência consistiu em dividir os alunos entre aqueles que devem personificar um super-herói (Batman) e aqueles que não têm de o fazer (que servem de grupo de controlo) e, depois, em pedir aos alunos que passassem 10 minutos a repetir uma tarefa, podendo interrompê-la livremente quando quisessem para jogar videojogos. Os resultados mostraram que os miúdos (tanto os de 4 anos como os de 6 anos) que personificaram um super-herói aguentaram mais tempo do que os outros – e que, como tal, este tipo de técnica pode ser eficaz para promover maior perseverança dos alunos nas tarefas escolares (gráfico 7).

So what? Quatro ideias-chave e uma conclusão

Primeira ideia: há uma certa sobrecarga de trabalho sobre os alunos. Os alunos portugueses não têm mais TPC do que a média europeia, mas se se somar o tempo de aulas (escola) ao tempo de estudo (fora da escola) os alunos portugueses ficam entre aqueles que, na Europa, mais horas passam a “trabalhar”. Ou seja, os TPC não são um problema especificamente português, embora Portugal esteja entre os países onde os alunos mais tempo dedicam ao estudo (dentro e fora da escola).

Segunda ideia: os TPC ajudam a melhorar os desempenhos escolares no ensino secundário, desde que usados com moderação. Na prática, isto quer dizer que é mais eficaz estudar 1 hora por dia do que estudar 3 horas por dia. Isto, sublinhe-se, no ensino secundário – é que, no ensino básico, os indicadores não apontam com clareza para uma relação causa-efeito entre os TPC e a melhoria dos desempenhos. De resto, a melhoria nos desempenhos escolares não é universal, isto é não se aplica de igual modo sobre todos os alunos – os alunos que têm uma má relação com a escola (geralmente também têm baixo perfil socioeconómico) tendem a diminuir o seu compromisso com os TPC, tornando-os menos eficazes.

Terceira ideia: não há uma relação directa entre os TPC e o desenvolvimento de competências ou de stress. Estima-se que sim, poderá haver benefícios quanto à autonomia e responsabilidade dos alunos – mas são dimensões particularmente difíceis de medir com clareza. O que se sabe é que, quando os alunos são sujeitos a muita pressão e sobrecarga de trabalho, podem surgir consequências para a saúde – mas isso tem mais a ver com a sobrecarga do que com os TPC em si mesmos. Ou seja, o ponto aqui é de reforço aos pontos anteriores: TPC com moderação ajuda, de forma excessiva prejudica.

Quarta ideia: os TPC não são só um problema das famílias, são também um problema de políticas públicas. Há medidas para tornar os TPC mais eficazes, como dar condições na escola aos alunos que não as têm em casa, ou como formar professores para técnicas inovadoras para lidar com os alunos menos comprometidos com a escola. Ou seja, há instrumentos ao dispor dos decisores políticos e dos legisladores. É esse o debate que importa promover.

Conclusão. Os TPC têm vantagens e desvantagens, nada de surpreendente. Mas se a conclusão é essa, então a discussão deve ser sobre formas de beneficiar das vantagens e de limitar as desvantagens, procurando soluções de políticas públicas que resolvam problemas concretos ligados aos TPC nas escolas – por exemplo, oferecendo condições de estudo em contexto escolar aos alunos socialmente desfavorecidos. Canalizem-se, portanto, para aí as energias gastas no inútil debate do “é a favor ou contra os TPC?”.

Alexandre Homem Cristo foi Conselheiro Nacional de Educação e, entre 2012 e 2015, foi assessor parlamentar do CDS na Assembleia da República, no âmbito da Comissão de Educação, Ciência e Cultura. É autor do estudo “Escolas para o Século XXI”, publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, em 2013