Começa a ficar mais nítida a fotografia de família da próxima liderança do PSD. Ainda que neste momento nada esteja verdadeiramente fechado, os homens e mulheres que Luís Montenegro vai promover à direção do partido já começam a ter nomes e rostos.
A liderar a bolsa de apostas está Hugo Soares, que deve ser escolhido como novo secretário-geral do partido. Braço direito de Montenegro nesta e nas anteriores eleições diretas, é ele quem tem cuidado do processo de transição de pastas com José Silvano, o homem de Rio para o efeito.
De resto, Hugo Soares tem acompanhado Luís Montenegro nas mais recentes incursões pelo terreno – ainda esta quarta-feira, esteve no Porto para visitar o Pavilhão Rosa Mota, onde vai decorrer o congresso de entronização do novo líder, de 1 a 3 de julho.
Antes de se cruzarem no Parlamento, os dois não tinham uma relação próxima. Foi Miguel Macedo, então líder da bancada parlamentar e igualmente homem de Braga, quem os aproximou e, com a ascensão de Montenegro à presidência do grupo parlamentar, Hugo Soares foi ganhando cada vez maior relevo na estrutura até se tornar vice.
Com a saída de Montenegro, Soares sucedeu-lhe na liderança da bancada, até Rui Rio aparecer e apontar a porta de saída ao bracarense, num processo que marcou para sempre a muito difícil relação entre o rioísmo e o montenegrismo.
Além de Hugo Soares, outro nome que tem sido dado como quase certo na direção como vice-presidente do partido é o de Paulo Cunha, outrora presidente da Câmara Municipal de Famalicão e hoje líder da poderosa distrital do PSD/Braga.
Tal como Hugo Soares, Paulo Cunha já tinha sido um dos mais influentes apoiantes de Montenegro nas diretas de má memória de 2020. Na disputa entre Rui Rio e Paulo Rangel, manteve-se equidistante, mas, entre os apoiantes de um e de outro, é hoje um dado adquirido que foi a ausência de empenho das estruturas afetas a Paulo Cunha que ajudou a contribuir, em parte, para a surpresa eleitoral.
Quando deixou de forma surpreendente a Câmara de Famalicão – tinha mais um mandato de eleição quase certa pela frente – muitos no PSD disseram que estava apostado em voos maiores, eventualmente concorrer à liderança do partido ou um percurso como deputado. Isso acabou por não acontecer. Mas se a promoção a vice-presidente se concretizar, ganhará uma dimensão nacional que há muito procura.
Montenegro discreto nos convites
O novo líder do PSD tem tentando evitar ao máximo fugas de informação que comprometam a boa imagem com que quer chegar ao próximo congresso do partido e o seu poder negocial com todas as estruturas. Montenegro tem feito abordagens discretas, no sentido de aferir eventuais disponibilidades, mas os convites formais só deverão começar a surgir a dois ou três dias do Congresso do PSD.
Ainda assim, na lista final dos próximos vice-presidentes não deverá faltar o nome de António Leitão Amaro, antigo secretário de Estado da Administração Local do Governo de Pedro Passos Coelho. Muito próximo de Montenegro desde esses tempos, esteve em ambas as diretas ao lado do antigo líder parlamentar – em 2020, chegou a coordenar a moção global estratégica com que foi a votos.
Tido como um dos quadros mais promissores da geração que chegou à primeira linha de combate durante a intervenção da troika em Portugal, fez um fadeout político durante a era rioísta. Na noite eleitoral que confirmou a vitória de Montenegro, em Espinho, era um dos mais entusiasmados apoiantes do agora novo líder social-democrata.
Depois, Montenegro terá de escolher uma forma de encaixar figuras como Pedro Duarte. Antigo líder da JSD e fundador do movimento cívico Manifesto X, que serviu de base à moção estratégica às eleições de 2020, voltou a ajudar a coordenar o atual documento estratégico.
Apesar de ser apontado com alguma insistência para um cargo de vice-presidência, segundo apurou o Observador esse cenário é infundado nesta altura. Mesmo assim, é esperado que possa vir a ter um papel na direção mais alargada do PSD.
O mesmo vale para Pedro Reis. Ex-presidente Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) e antigo presidente do Instituto Sá Carneiro, o social-democrata teve um papel determinante no programa eleitoral com que Pedro Passos Coelho foi a votos em 2015. Sendo uma figura do passismo, houve uma clara tentativa de promoção da imagem de Pedro Reis pela equipa de Montenegro, tendo-se desdobrado em entrevistas e aparições públicas ao lado do antigo líder parlamentar. Terá seguramente um lugar importante na futura organização do partido, ainda que não necessariamente com um cargo da importância de uma vice-presidência.
Pedro Alves, antigo líder distrital do PSD/Viseu e apoiante de sempre de Montenegro, foi uma das figuras, a par de Hugo Soares, mais relevantes na organização da última campanha interna. No PSD, havia quem apostasse nele como candidato a secretário-geral, mas essa corrida parece estar definitivamente perdida para Hugo Soares. Poderia, ainda assim, desempenhar o papel de secretário-geral-adjunto, ainda que para Montenegro fosse difícil gerir esse equilíbrio.
Joaquim Miranda Sarmento, o homem das contas de Rui Rio e que acabou a coordenar a moção estratégica de Montenegro, também poderá desempenhar funções em órgãos nacionais, mas provavelmente longe da comissão executiva do partido. O mesmo vale para Carlos Coelho, antigo eurodeputado afastado por Rui Rio, que desempenhou nestas diretas a função de diretor de campanha e que Montenegro quererá, certamente, manter por perto.
Carreiras out. Mulheres procuram-se
A grande dificuldade de fazer escolhas para direção do partido é que, em muitos casos, abraçar determinados cargos implica abdicar do salário ou do emprego de origem. Se o novo líder do PSD remunerar os seus colaboradores mais próximos – e não há nada no partido que o impeça – a folha salarial poderia crescer porque a grande maioria dos apoiantes de Montenegro está fora do Parlamento e da vida política ativa. Por outras palavras: teriam de dedicar tempo e dinheiro para servir o PSD e a nova liderança — ou receber por isso.
De todo o modo, e ainda que subsistam muitas dúvidas em relação à composição final da futura direção social-democrata, uma coisa é certa: apesar de ter sido avançado que Carlos Carreiras seria vice-presidente do partido, o Observador sabe que o atual presidente da Câmara de Cascais não está disponível para exercer funções executivas no partido.
Montenegro terá ainda de garantir representatividade de género nos órgãos máximos do partido. O nome mais óbvio entre mulheres que estiveram sempre ao lado de Montenegro é o de Margarida Balseiro Lopes, antiga líder da JSD e crítica desde o primeiro minuto de Rui Rio – acabou mesmo por deixar o Parlamento em rota de colisão com o ainda formalmente presidente do partido.
Mexidas na bancada podem ajudar a conter estragos
Depois de ter conseguido agremiar tantos apoios, juntar tantos líderes regionais e tantas sensibilidades diferentes, Montenegro vai ter de deixar gente de fora quando for escolher a equipa que o vai acompanhar. Ou seja: existe o potencial para ferir alguns egos.
Eventuais mexidas na distribuição do poder dentro do grupo parlamentar podem ajudar a esvaziar alguma tensão. Nas últimas semanas, Luís Montenegro e Paulo Mota Pinto têm conversado pontualmente, mas em nenhum momento foi dito ao atual líder da bancada parlamentar que o seu lugar estava assegurado.
A ambiguidade de Montenegro nesta matéria, que o acompanha desde o primeiro dia de campanha interna, pode significar que Mota Pinto tem muito provavelmente os dias contados à frente do grupo de deputados – isto, apesar de ter sido escolhido por uma maioria esmagadora de 92% votos expressos.
Apesar de herdar um grupo parlamentar maioritariamente rioísta, Montenegro tem suficientes apoios (Miguel Santos, Paulo Rios de Oliveira, João Moura, Paula Cardoso…) para reorganizar a bancada e, assim, compensar algumas estruturas que eventualmente se sintam melindradas por não ocuparem órgãos nacionais. Esse pode ser um trunfo a ser usado nos bastidores do próximo congresso.
Mas, para decepar Mota Pinto, Montenegro terá de encontrar uma alternativa capaz – algo que não será fácil numa bancada que, como já se disse, é maioritariamente rioísta e/ou inexperiente politicamente.
Existem, portanto, poucos nomes com características e reconhecimento político para virem a suceder a Mota Pinto. Ricardo Batista Leite, que se notabilizou com Rio, seria um deles, até por não ter grandes anticorpos junto do montenegrismo — aliás, numa das suas mais recente declarações parlamentares fez rasgados elogios a Montenegro, que foram notados por jornalistas, montenegristas e rioístas.
Mas a promoção de Batista Leite a líder parlamentar, ainda que conjugada com novos coordenadores das comissões e novos vice-presidentes, continuaria sem resolver o problema de fundo: não satisfaria os indefetíveis do novo líder que venham a ficar sem acesso ao poder. É sobre este gelo fino que Montenegro caminhará até julho. E depois.