É professora há 12 anos e, denuncia o brilho intenso nos olhos, adora o que faz. Andria Zafirakou dá a disciplina de Artes e Têxteis numa zona pobre e turbulenta da cidade de Londres, onde lida com situações de grande carência económica, violência e desafios sociais profundos numa comunidade que junta uma diversidade étnica muito alargada e mais de 130 línguas faladas. O investimento pessoal que aplica nos seus alunos e a forma inspiradora como olha para a educação valeu-lhe a vitória no Global Teacher Prize 2018 – uma espécie de Nobel da Educação, que a estabeleceu como a actual melhor professora do mundo. Humilde, apaixonada e contagiante, Andria rejeita o protagonismo que pelo mundo inteiro lhe atribuem. Diz-se agradecida pela oportunidade de fazer parte do Global Teacher Prize, iniciativa que lhe permitiu aprender com tantos professores que, todos os dias, lutam para fazer o melhor pelos seus alunos. E, sobre os finalistas à edição portuguesa do Global Teacher Prize, que conheceu numa curta viagem a Lisboa, diz-se inspirada pela diversidade de percursos e pela boa energia que encontrou.
A Andria venceu o Global Teacher Prize e é, por isso, apelidada de “a melhor professora do mundo”. O que diria a todos os outros professores que, por todo o mundo, olham para o seu exemplo?
Sinceramente, não acho que eu seja a melhor professora do mundo. Aliás, penso que tal pessoa não existe, porque há imensa gente que, na educação, está a fazer trabalhos incríveis dentro das suas comunidades. O importante é salientar que, sim, eu fui nomeada porque houve quem me indicasse, mas há muitos outros professores que simplesmente não foram encontrados ou indicados pelos seus colegas, cujo trabalho é fantástico. É algo que faço sempre questão de lembrar porque é nisso que acredito.
Não existe, portanto, um único melhor professor, da mesma forma que não existe uma única melhor escola…
Exacto, cada comunidade é diferente e, acredito, cada professor faz o seu melhor pelos seus alunos, no sentido de os ver progredir e alcançar o sucesso educativo. É essa a nossa vocação enquanto professores, é para isso que alguém se torna professor. É uma profissão muito altruísta, nesse sentido, e é isso que a torna tão bela: nada do que um professor faz é concebido a pensar em si mesmo, mas a pensar nos outros.
É professora na Alperton Community Secondary School, na zona Oeste de Londres.
Sim, é uma escola que se localiza numa zona carenciada da cidade de Londres. Na nossa freguesia são faladas cerca de 150 línguas distintas e, apenas na nossa escola, estão identificadas 40 línguas diferentes. Os alunos da minha escola vêm de origens variadas e chegam à escola em estádios de aprendizagem escolar muito díspares. Por exemplo, na semana passada, entrevistei um aluno de 11 anos que veio da Índia e que não tem qualquer grau de escolaridade. Trata-se de uma escola que tem uma bela e ecléctica mistura de crianças e culturas.
Como é que se lida com uma turma de alunos com origens tão diferentes?
Julgo que essa é uma das coisas mais belas em ser-se professor, é nesses momentos que nos desafiamos a nós próprios. O que considero mais significativo de assinalar é que, na minha escola, não existe um determinado padrão de aluno que se possa dizer que é o “normal” – cada aluno é diferente à sua maneira e, numa mesma sala de aula, podem existir cerca de 20 nacionalidades diferentes. É uma espécie de Nações Unidas (risos). O que é verdadeiramente difícil é descobrir como comunicar com todos estes alunos, na medida em que o seu inglês pode não ser suficientemente avançado. Quanto a isso, tenho alguma sorte porque a minha disciplina – sou professora de Artes – permite-me ensinar exemplificando aos alunos aquilo que se pretende em cada exercício. Isto é particularmente poderoso quando se tem alunos que não falam inglês mas que manifestam elevada inteligência e que se percebe que, muito rapidamente, irão assimilar a língua. O que eles precisam mesmo é de crença e de encontrar algo que, de certo modo, os inspire. Fazer parte desse processo é um dos grandes benefícios do meu trabalho.
Se considera que as Artes são uma espécie de língua universal que lhe permite chegar a todos os alunos, como vê o facto de, tantas vezes, a sua disciplina não ser tratada como prioritária por quem define o currículo nacional e as políticas públicas de educação?
Sinto-me profundamente desiludida com isso, com essa mentalidade. Muita gente ainda não percebeu quão importante é a Arte em termos de transformação da vida, em termos de oferecer aos alunos competências essenciais de que necessitarão ao longo da sua vida. Por exemplo, competências como a curiosidade, como comunicação, como trabalho em equipa, como auto-expressão. Ou, ainda, como a criatividade, uma das competências cada vez mais relevantes nos locais de trabalho – os empregadores valorizam cada vez mais as pessoas que têm essa visão criativa, uma vez que esta é essencial para quem quer liderar nos mercados onde se insere. Se retirarmos as disciplinas artísticas do currículo, se não valorizarmos estas disciplinas, estaremos a prejudicar os nossos filhos e alunos, em especial no momento em que, à saída da escola, entrarem no mercado de trabalho. Não estou a sugerir que todos devem tornar-se actores, músicos ou artistas, não é esse o ponto. O ponto é valorizar o conjunto de competências que estas disciplinas desenvolvem nos alunos, incluindo até para a sua saúde mental. As Artes ajudam a encontrar uma paz emocional própria dos momentos criativos. As Artes dão-lhes instrumentos para que conheçam melhor a sua personalidade, para que definam o que gostam e o que não gostam, para que desenvolvam o seu processo de tomada de decisão. As disciplinas artísticas são, nessa medida, essenciais para a formação pessoal dos alunos.
[Vejo o vídeo de Andria Zafirakou quando era uma das finalistas]
Diria que, no caso dos alunos socialmente mais desfavorecidos (como os seus), as Artes têm um papel ainda mais importante?
Da minha experiência, constato que as disciplinas artísticas são aquelas com as quais esses alunos automaticamente se envolvem. Talvez porque produzem um ambiente de segurança onde os alunos sentem que se podem expressar livremente. E, para os professores, estas disciplinas permitem uma rápida identificação das preocupações dos alunos, através da sua expressão artística ou da música, que permite aos professores implementar estratégias para apoiar cada aluno nas suas necessidades.
Como um instrumento de diagnóstico?
Absolutamente.
Explicou há pouco que a sua escola se insere num contexto socialmente desfavorecido. No entanto, a sua escola é também uma das mais bem-sucedidas do país em termos de melhorias de desempenho dos alunos. O que faz a sua escola diferente de outras que, em contextos semelhantes, estão a falhar?
Sinceramente, não tenho uma resposta no que concerne as outras escolas. Quanto à minha escola, aquilo que a torna melhor, a meu ver, é o facto de não nos focarmos meramente na dimensão académica do desenvolvimento educativo dos alunos. Não somos uma fábrica, não temos a ambição de preparar em massa alunos para que consigam responder a questões de exame. A nossa abordagem é holística, queremos garantir um ambiente de aprendizagem que seja seguro para eles e, através desse ambiente, guiar os alunos no seu processo de formação enquanto indivíduos. Nós sabemos os problemas que existem fora dos portões da escola. Sabemos que, em casa, enfrentam grandes desafios e que muito do que testemunham e conhecem em contexto familiar é-lhes prejudicial. Várias vezes pensamos “meu Deus, as coisas com que este aluno de 11 anos tem de lidar em casa, é demasiado cedo para ter experiências deste tipo”. Portanto, o que fazemos na minha escola é criar um abrigo, um espaço seguro onde as crianças possam ser crianças, onde possam praticar desporto, onde possam canalizar a sua agressividade e as suas frustrações para as diversas actividades controladas que lhes oferecemos. E, nestes anos enquanto professora, reparei que, quanto mais abertos estiverem os portões da escola, melhor serviço à comunidade se presta – por exemplo, se a escola abrir às 6 horas da manhã, haverá alunos para receber, porque a comunidade percebe que aquele é um abrigo e um espaço seguro onde as crianças podem estar. Outra coisa que fazemos é garantir um pequeno-almoço na escola a todos os alunos. Sei que isto parece coisa pouca para algumas escolas, mas no caso dos nossos alunos não sabemos se eles jantaram na noite anterior (e é muito provável que não tenham jantado). Ou seja, tentamos fazer com que a nossa escola seja uma espécie de “casa fora-de-casa”, onde se garante a segurança, os estímulos educativos, os afectos, os apoios e onde se desafiam os alunos a estabelecer amizades e relações sociais saudáveis. No fundo, prepará-los enquanto indivíduos, para que possam posteriormente ter um impacto positivo na sociedade.
Ouvindo-a, torna-se claro que uma das apostas da sua escola passa pelo envolvimento dos pais dos alunos, algo particularmente exigente nos contextos sociais mais desfavorecidos. Como é que a sua escola estabelece essa “parceria” com os pais?
É efectivamente difícil gerar o envolvimento dos pais. Mas, da minha experiência, diria que uma das coisas que melhor resulta é o elogio.
Elogiar os alunos?
Sim. Ao longo dos anos, tenho verificado que quando os professores ligam sucessivamente para casa para reportar aspectos negativos dos alunos, os pais fecham-se. É fundamental que os pais sintam que os professores têm a missão de ajudar a família na formação dos seus filhos, isto é, que somos aliados e que todos temos o mesmo objectivo, que é dar a cada aluno os instrumentos para que ele seja bem-sucedido na sua vida. Quando, finalmente, uma família percebe isso, quando percebe que todos na escola têm como prioridade os interesses dos seus filhos, aí sim gera-se um maior envolvimento. Dito assim parece simples, mas é um processo muito difícil. Por exemplo, eu tive uma mãe a quem, há cinco anos, assinalei a minha preocupação em relação ao facto de o seu filho passar períodos longos a jogar videojogos e pedi-lhe que revisse o tempo de exposição aos videojogos que permitia ao seu filho. Na altura, essa mãe ficou bastante incomodada com a minha observação e reagiu bruscamente: “Você não tem que me dizer como é que eu educo os meus filhos”. Essa mesma mãe, com quem acabei por desenvolver uma boa relação, pediu-me ajuda na semana passada precisamente sobre esse mesmo assunto: o filho tem exames em breve e não consegue largar os videojogos, já está viciado e a mãe anda desesperada sem saber o que fazer. Claro que este é um caso extremo, mas ilustra a importância do estabelecimento desta relação de confiança entre os pais e a escola. Se os pais não se abrirem à escola, o percurso formativo dos seus filhos terá mais obstáculos, pelo QUE é efectivamente importante trazê-los a bordo desta viagem desde o início.
A Andria parece descrever uma profissão que a ocupa 24 horas por dia, dentro e fora da escola. É preciso esse compromisso para se desempenhar bem a profissão de professor?
Ser-se professor não é exactamente uma profissão. É o que digo sempre às pessoas: se quiserem ser professores, tenham em atenção que este não é um trabalho das 9 às 5. É um trabalho que consome, que é parte diária das conversas e dos passeios. Nunca se desliga o interruptor. Um professor está sempre a pensar, as suas tarefas nunca estão terminadas, os alunos precisam sempre de mais. E, de facto, há sempre algo mais que um professor pode fazer, nomeadamente para melhorar no seu trabalho. É assim que encaro as coisas: ser professor é, de certo modo, parte da minha vida e é para mim tão natural quanto andar ou respirar. É a minha identidade.
Diria que todos os professores são assim?
(hesitação) A maioria dos meus colegas, digo-o com pena, é assim. E digo que tenho pena que sejam assim porque me preocupo com o seu bem-estar. Eles nunca desligam e isso desgasta-os. Eu, que tenho sorte, tenho consciência dos limites, tenho apoio e construí mecanismos de defesa que me permitem gerir essa pressão, mas nem todos conseguem fazê-lo. Acresce, por exemplo, que em Inglaterra, neste momento, estamos a enfrentar um problema de desgaste rápido dos novos professores, pois muitos não aguentam mais do que três anos em funções. Diria que é uma das responsabilidades das escolas, garantir que os professores têm as condições adequadas para trabalhar.
Quando o debate das políticas de educação aborda os professores, um dos desafios está na constatação de que os professores não se sentem socialmente reconhecidos pelo seu trabalho. Também sente isso?
Sim, absolutamente. E nesse ponto reside, aliás, um dos grandes benefícios do Global Teacher Prize, e é fantástico saber que, com a sua primeira edição em Portugal, os professores portugueses também tirarão proveito disso: esta iniciativa aumenta a atenção pública para a qualidade do trabalho dos professores e eleva o seu estatuto social. Na prática, faz com que os professores se sintam mais alinhados com a nobreza da sua missão. Que missão é essa? Estamos a inspirar as gerações futuras, somos uma espécie de mentores para um mundo novo de oportunidades, estamos a inspirar vidas. E isso é grande, enorme mesmo. Por que razão pessoas com estas responsabilidades não se sentem reconhecidas na sociedade? Será pelo dinheiro? Eu falo com muitos professores e do que eles se queixam não é do dinheiro, mas sim da ausência de reconhecimento e apreço junto dos alunos, pais e comunidade. Não sei como é que esta afirmação soará em Portugal, mas acredito mesmo que toda a gente deveria olhar para esta questão com muita atenção. Toda a gente é mesmo toda a gente, governo incluído. A pior situação com que um país se pode confrontar é ter falta de professores bons, motivados, entusiasmados com o seu trabalho e disponíveis para partilhar a sua paixão com as suas turmas.
Se um ministro da Educação lhe perguntasse o que fazer para ter professores melhores e mais motivados, o que recomendaria?
Perguntar-lhe-ia de volta: como é que o Senhor Ministro está a investir no desenvolvimento dos seus professores? O que fez para os manter formados, com as competências necessárias, com o que é necessário para garantir que as suas práticas pedagógicas permitem dar resposta às necessidades dos seus alunos? O que fez para lhes dar espaço e tempo para que desenvolvam novas ideias, novas práticas, novos conceitos, ou simplesmente para que possam reflectir sobre a sua disciplina e trocar boas práticas com outros colegas do resto do país? Julgo que são estas as dimensões mais urgentes para intervenção das autoridades públicas.
Nesse domínio da qualidade dos professores, uma das medidas políticas geralmente mais discutida é a definição de critérios mais exigentes para o acesso à carreira docente, como acontece na Finlândia. Olhando para os seus colegas, diria que essa é uma questão relevante para a melhoria do sistema educativo?
Diria que há alguma verdade nisso, alguma selecção pode ser benéfica. Os professores que se percebe estarem na profissão por sentirem uma vocação, um certo chamamento para o ensino, são efectivamente os professores mais bem-sucedidos. Como disse há pouco, esta não é uma profissão das 9 às 5, não é um trabalho baseado na produção em que, saído do posto de trabalho, não há nada mais em que pensar. É muito mais do que isso. São os professores que têm maior relacionamento e compromisso pessoal com o sucesso dos seus alunos que conseguem extrair mais das crianças e levá-las mais longe no seu percurso educativo. E, meu Deus, não dá para fazer isto tudo sem se gostar de lidar com crianças! Reconheço que já vi professores que, manifestamente, entraram nesta carreira sem se dar conta da situação e do que ela exige. Dito isto, parece-me fulcral a existência de um excelente programa de formação de professores, que os prepare para a variedade de alunos, escolas, comunidades e desafios com que terão de lidar no exercício da profissão. A sua formação tem de os habilitar a exercer em qualquer contexto.
Todo o trabalho dentro de uma escola que funciona bem requer coordenação e uma liderança forte. Sendo a Andria uma das líderes da sua escola, como utiliza essas funções de direcção para desenvolver a sua escola?
As minhas funções permitem-me inspirar e guiar os outros professores. Considero-me muito sortuda, uma vez que as minhas responsabilidades de direcção estão associadas à área do desenvolvimento profissional dos professores. Por isso, sinto que é uma responsabilidade enorme, mas também um grande privilégio, porque me compete ajudar os professores a serem melhores, a dar aulas melhores e a melhor adaptar as práticas pedagógicas às necessidades dos alunos. É uma tarefa de liderança da maior importância. Afinal de contas, os professores são um recurso caro e precioso – não há recurso educativo mais valioso numa escola. Por isso, preocupo-me em garantir que os professores na minha escola têm a formação de que precisam, que há sistemas de apoio ao seu trabalho e que conseguem dar aulas de forma eficaz. Na minha opinião, estas questões são vitais para o sucesso de qualquer escola. Sei bem que, enquanto director de escola, a tentação é ter o foco apenas nos desempenhos e nos resultados. Mas acredito que é igualmente necessário saber quem são as pessoas com quem se trabalha e tratar delas, porque é também assim que se defende os interesses dos alunos.
Acredita, portanto, que a aposta na formação dos professores é estratégica numa escola?
Sim. Mas não é só a formação, é também a mentoria para ajudar os novos professores. Por exemplo, tenho uma colega que, actualmente, está a fazer o seu primeiro ano na nossa escola e que é também o seu primeiro ano a dar aulas. E, como se imagina, o início é sempre um pouco atribulado, porque há nervosismos, inexperiência, timidez. Então, organizámos uma mentoria, de modo a que ela tenha o apoio necessário de outros colegas, mas também para que possa ir visitar outras escolas para assimilar boas práticas. Além disso, filmei-a a dar aulas, para que ela possa rever e perceber onde deve melhorar. Ou seja, é mais do que a formação, há todo um conjunto de coisas que é possível fazer para ajudar os professores a melhorar. E, se me perguntar se estou a ter sucesso nisso, respondo com clareza: tenho a certeza que sim. Digo-o porque vejo professores que formei tornarem-se, hoje, líderes na minha escola ou noutras escolas onde agora trabalham. Sinto que os empoderei para que eles possam ser aquilo que desejam ser.
Com tanto investimento na formação, considera que a estabilidade do corpo docente na escola é fundamental para o seu sucesso?
Nem por isso. É minha convicção que, se investirmos no staff de professores, eles investirão em nós. Portanto, se houver professores que mudam de escola e têm novas oportunidades, isso é excelente, porque significa que tiveram acesso a promoções profissionais e que o seu trabalho foi reconhecido. Do ponto de vista de uma gestão inteligente, isto obriga a ter sempre alguém em vista e pronto para assumir as responsabilidades dos que saem, ou seja ter alguém já treinado e preparado para o exercício das funções que irá ocupar.
Regressando aos grandes debates da educação: hoje discute-se muito qual deve ser o foco da educação, isto é, se deve estar mais no conhecimento ou se deve estar mais no desenvolvimento de competências transversais. O que pensa sobre isto?
Acho que ambos são fundamentais e indispensáveis. Sem desenvolver as competências, deixa de ser possível aplicar o conhecimento, e sem o conhecimento as competências servem de pouco. Cada criança é diferente à sua maneira, cada uma aprende à sua maneira e cada uma terá as suas próprias opções de vida. Enquanto líder de uma escola, o importante é diversificar e dar aos alunos todas as opções possíveis, para que eles possam tomar as suas decisões, para que eles possam perceber quais são os seus pontos fortes. Pode-se ser excelente a Matemática, mas se a isso se juntar as Artes, um jovem ficará capacitado para pensar “fora da caixa” e de forma criativa, o que lhe abrirá horizontes – ele poderá então querer tornar-se um arquitecto ou conceber cenários, por exemplo. O objectivo deve ser dar aos miúdos todas as opções para que possam ser bem-sucedidos na sua vida.
Não é preciso escolher um dos lados.
Não é, de todo. E eu valorizo e aprecio imenso os líderes educativos que percebem que não pode ser tudo à volta da Ciência, da Tecnologia ou da Matemática. É igualmente necessário incluir as Artes e desenvolver outras competências.
O seu exemplo enquanto professora está a dar a volta ao mundo. O que gostaria que, do seu trabalho, inspirasse os outros professores?
(risos) Uma espécie de mensagem? Se eu tivesse uma mensagem, diria que seria algo deste género: assegurem-se que conseguem demonstrar aos vossos alunos o quão são apaixonados pela matéria da vossa disciplina. Porque, se não o fizerem, se não evidenciarem as possibilidades das Artes ou das Ciências, os alunos não se irão inspirar e não irão envolver-se realmente na aprendizagem da matéria. Diria mesmo aos professores: não tenham medo de ser criativos, de inovar, de ousarem de forma até um pouco radical dentro da sala de aula, porque serão essas as memórias que as crianças vão guardar, é isso que os irá inspirar ao longo da vida. E, já agora, acrescento ainda uma outra ideia: arranjem tempo para reflectir sobre o que estão a fazer. Isto é, não se coloquem na posição do hamster que corre e corre na roda da gaiola mas que não vai a lado nenhum. Não tenham medo de parar para pensar “será que isto resultou com os meus alunos, como será que posso fazer um pouco melhor?”. Nós, professores, não podemos nunca cair no ponto em que acreditamos saber tudo. Nós não sabemos tudo. Veja-se o óbvio: os miúdos de hoje são muito mais tecnológicos do que alguma vez nós seremos. Mas isso não nos deve intimidar, temos de abraçar essa vulnerabilidade, que é parte da nossa realidade, e desafiar os nossos alunos a ensinar-nos também aquilo que não sabemos. Julgo que essa é uma atitude muito bonita para um professor: não só ensinar, mas estar disponível para aprender com os seus alunos.
Alexandre Homem Cristo foi Conselheiro Nacional de Educação e, entre 2012 e 2015, foi assessor parlamentar do CDS na Assembleia da República, no âmbito da Comissão de Educação, Ciência e Cultura. É autor do estudo “Escolas para o Século XXI”, publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, em 2013. Escreve sobre Educação no Observador.