As citações são ambas maquiavélicas, uma pretensa prova da existência de uma conspiração mundial em curso para, através da pandemia e das vacinas contra a Covid-19, controlar a humanidade.
Primeiro, a atribuída a Bill Gates, fundador e ex-presidente da Microsoft. Em 2021, o quarto homem mais rico do mundo, com uma fortuna avaliada pela Forbes em 133,8 mil milhões de dólares; desde 2020, mentor, juntamente com a ex-mulher, Melinda, de uma ONG que já doou mais de 55 mil milhões de dólares a inúmeras causas humanitárias em mais de 130 países.
As vacinas de DNA contra a Covid-19 devem dar-nos um controlo extremo sobre a população mundial”, atribui a publicação, que tem sido amplamente divulgada nas redes sociais, a Gates, sem precisar onde nem quando.
“Sócio colaborador do Fórum Económico Mundial” é como o milionário norte-americano surge identificado na montagem, com fotografia a acompanhar.
Logo abaixo, a alegada frase de Klaus Schwab, o economista alemão que em 1971 organizou o primeiro Simpósio Europeu de Gestão, com 400 participantes, todos empresários, na vila suíça de Davos, e 16 anos depois acabou por ter de lhe mudar o nome — não só já não participava apenas a comunidade empresarial como havia quem chegasse de fora do velho continente. Fórum Económico Mundial (WEF, na sigla em inglês) era mais apropriado.
O surto de Covid-19 é o primeiro grande passo para um controlo sem precedentes sobre a humanidade”, teria dito Schwab, de acordo com a publicação, que, uma vez mais, não revela fonte nem data das alegadas declarações, só o identifica como fundador e CEO do WEF.
Não é possível encontrar, numa busca na internet, as entrevistas, comunicados ou intervenções em que tais frases, à partida pouco verossímeis, pudessem ter sido proferidas.
Contactados pelo Observador — para perceber se alguma destas afirmações foi feita em Davos, onde Bill Gates marca presença desde 1996, tendo inclusivamente partilhado o palco com Klaus Schwab pelo menos em duas ocasiões —, os serviços de imprensa do Fórum Económico Internacional não responderam até à data de publicação deste artigo. Ainda assim, à Reuters, Yann Zopf, responsável pelo departamento de comunicação do WEF, já tinha garantido: “Claro que esta citação’ é 100% falsa. O Prof. Schwab nunca disse e nunca diria isto. É o oposto daquilo em que ele acredita. A pandemia deve ser combatida com uma abordagem ‘de toda a sociedade'”. À mesma agência, fonte da Fundação Bill e Melinda Gates assegurou o mesmo: Bill Gates nunca fez tal declaração.
Em entrevista, há pouco mais de um ano, o fundador da Microsoft, que ao longo da pandemia foi visado por uma série de teorias da conspiração — talvez a mais propalada tenha sido a de que teria colocado microchips nas vacinas contra o SARS-CoV-2, exatamente com o tal plano de controlo da humanidade em mente —, revelou-se surpreendido com a quantidade de desinformação produzida a seu respeito. “Mas será que as pessoas acreditam realmente nessas coisas?”, questionou, em conversa com a Reuters. “Vamos realmente ter de aprender sobre isto durante o próximo ano e compreender … Como é que isto muda o comportamento das pessoas e como é que deveríamos ter minimizado este efeito?”
Já Klaus Schwab, em junho de 2020, escassos meses após o início da pandemia, frisou em Davos o contrário daquilo que a publicação em análise lhe atribui. “A crise da Covid-19 está a afetar todos os aspetos da vida das pessoas em todos os cantos do mundo. Mas a tragédia não precisa de ser o seu único legado. Pelo contrário, a pandemia representa uma rara mas estreita janela de oportunidade para refletir, reimaginar e reiniciar o nosso mundo para criar um futuro mais saudável, mais equitativo e mais próspero.”
Conclusão
É falso que Bill Gates ou Klaus Schwab tenham dito que a pandemia e as vacinas contra a Covid-19 são uma oportunidade de controlo sobre a população mundial. Além de não existirem referências às frases partilhadas nas redes sociais, tanto a Fundação Bill e Melinda Gates como o Fórum Económico Mundial, organizações que fundaram e que os representam, recusam que as afirmações tenham alguma vez sido feitas.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook