O famoso psicanalista e filósofo austríaco Viktor Frankl (1905-1997) foi um dos mais influentes pensadores do século XX, tendo vivido alguns dos seus pesadelos mais excruciantes como o holocausto, ao qual sobreviveu após ter experienciado três anos em diferentes campos de concentração, dentre os quais Auschwitz, onde seu irmão e mãe foram assassinados.

Em 1946 publicou em alemão um livro onde narrou sua experiência nos campos de concentração nazi, o qual foi traduzido em 1959 para inglês como Man’s Search for Meaning, com o qual o autor ficou reconhecido mundialmente. Frankl atribuiu constantemente o imenso sucesso do livro, o qual explora, a partir de sua história pessoal, a sede de sentido do homem mesmo diante das situações mais extremas, exatamente à perda do sentido que caracteriza a patologia do nosso tempo, aquilo a que chamou “neurotização da humanidade”. Seus três sintomas estão ao nosso redor e em todos os lugares: a depressão, a agressividade e a adição.

Ora, não é preciso ir longe para observar exemplos não apenas da presença, mas do crescimento dos eventos de depressão, de violência explícita e de adições as mais variadas, dos estupefacientes às redes sociais e telemóveis, em faixas cada vez mais jovens da nossa sociedade, inclusive crianças. Isso é indicativo, no conjunto, não de fragilidades episódicas e isoladas, mas de um fenômeno dos quais depressão, agressividade e vícios são os efeitos e não a causa.

Numa conferência proferida em 1974 no Lindenthal-Institut de Colónia, o Dr. Frankl acresce um outro elemento sintomático que devemos ter em conta: a inflação da sexualidade.

Ora, na falta de um sentido que satisfaça a sua sede, a vontade irresistível do homem de significar a si mesmo e a sua vida, procura-se a fuga pelo prazer. A inflação da sexualidade é um escapismo e, como de resto com todas as ilusões, não apenas é incapaz de dar um sentido satisfatório ao que procuramos, mas ainda cria distorções na própria sexualidade. O Dr. Frankl referia na conferência a sua convicção de que 90% a 95% das disfunções de potência ou orgasmo devem-se à veneração do prazer, a hiper-intenção. Isto é, quanto mais se busca o prazer pelo prazer, menos prazer se obtém. Isso porque a inflação da sexualidade é essencialmente uma desvalorização da sexualidade, sua banalização.

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A pornografia, nessa linha, e toda a indústria bilionária que a promove, é um exemplo do problema. Nela a sexualidade humana é uma mercadoria de montras e não leva ao autoconhecimento ou a valorização do prazer ou do corpo. Ao contrário disso, trata-se de transformar tudo em preço e mercado. E é de se notar, senão de se estranhar, tal como indica o Dr. Frankl na sua conferência, que uma juventude tão informada, tão crítica e atenta, não proteste e não perceba que na indústria pornográfica se encontra uma das formas mais vis e cruéis de exploração do homem pelo homem, o capitalismo em uma das suas versões mais brutais de objetificação da vida.

Contudo, se em relação à depressão, à agressividade e violência e à adição já se notam crescentes preocupações sociais e iniciativas governamentais e não-governamentais de sensibilização e atendimento, tal como a que se vê em relação à saúde mental, quanto à pornografia parece ser o contrário, ou seja, a tolerância, senão sua promoção social e mediática sob uma certa aura de progressismo e libertação das amarras do moralismo.

Este é um assunto que, decerto merece ser tratado em mais espaço de modo a explorar os seus contornos devidamente, porém, para os fins do presente texto basta-nos chamar a atenção para o que está por baixo do tapete nessa abordagem, por assim dizer. Devemos a nós mesmos, senão por outro relevante motivo, pelo menos em nome da tão preciosa razão crítica dos nossos tempos, a pergunta sobre as razões dessa inflação da sexualidade e o que isso nos traz de bem. Se percebemos os seus efeitos e as relações que possui com os outros sintomas perniciosos e perigosos da depressão, da agressividade e das adições para os quais parecemos estar mais atentos.

Colocarmo-nos, honestamente, essas questões já seria um passo relevante para abordar a patologia do nosso tempo de forma mais abrangente e integral.