A inovação na indústria automóvel esteve sempre na ordem do dia, num setor altamente competitivo, que investe verbas significativas para constantemente apresentar novos produtos, novos processos e novos sistemas. Sendo o tecido empresarial português, do sector de componentes, caracterizado por um grande número de PME, são facilmente reconhecidas as dificuldades no investimento em I&D+i. Uma das alavancas para o seu desenvolvimento, ao longo dos anos, foram mesmo os grandes grupos internacionais que, focados no seu negócio primário (core business), iniciaram um processo de subcontratação que acabou por levar às nossas empresas o conhecimento e a inovação dos novos produtos. Mas tal não é suficiente para garantir a autonomia estratégica das empresas que, muitas vezes, acabam dependentes dos seus clientes, com todas as dificuldades conhecidas.

Os centros de conhecimento, como as entidades do sistema científico-tecnológico, são por isso necessários para trazer às empresas os fundamentos teóricos que sustentam a investigação e o desenvolvimento necessários à criação de uma cultura de inovação nas empresas.

Aliás, numa altura em que se trabalha para descarbonizar os transportes, toda a indústria automóvel está sob grande pressão para levar ao mercado soluções que possam mitigar a sua pegada ecológica.

O aumento da população urbana e número de veículos tem um impacto muito significativo, quer nas emissões originadas pelos transportes quer pelo aumento dos custos da mobilidade. A elevada dependência do transporte particular e a baixa interoperabilidade entre modos de transporte levaram os legisladores a introduzirem regulamentação que leve a alteração de comportamentos. Os novos conceitos de mobilidade partilhada, conectada, autónoma e eletrificada, sendo um grande desafio para a indústria, é também uma grande oportunidade para a busca de novas soluções disruptivas capazes de criar novas oportunidades de negócio.

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Toda a indústria foi chamada a pensar este novo desafio, recentrando os objetivos e canalizando verbas significativas para as atividades de I&D+i. E, mais uma vez, as pequenas e médias empresas foram confrontadas com este novo desafio da mobilidade, para a qual não tinham dimensão crítica.

O cluster automóvel Português – Mobinov, refletindo sobre estas temáticas e tendo em consideração a realidade empresarial, científica e tecnológica em Portugal, identificou oportunidades para desenvolver a indústria nacional tendo em consideração os desafios de um mercado em permanente mutação.

Esta reflexão culminou com a apresentação, em 2019, de uma candidatura ao programa Portugal 2020 de um projeto mobilizador, PAC – Portugal Auto Cluster for the Future, tendo como objetivo geral posicionar o cluster automóvel nacional nas cadeias de valor globais do carro do futuro. O projeto foi estruturado em 5 subprojectos (PPS): arquitetura de veículos do futuro, interiores do futuro, estruturas e exteriores do futuro, tecnologias de sensorização e conetividade e tecnologias de produção flexível e digital. A gestão, coordenação e disseminação foi garantida por um outro subprojecto, complementar, PPS6.

O projeto PAC, aprovado em 2020, agregou 9 empresas de múltiplas tecnologias e 12 entidades do sistema científico e tecnológico. Com um investimento elegível de 8 M€, foi desenvolvido em 36 meses e gerou 17 demonstradores, tendo sido construído um veículo elétrico que integrou todas as inovações desenvolvidas. Ao longo da vida do projeto trabalharam no seu desenvolvimento 231 pessoas de diversas áreas do conhecimento e foram realizados 30 mestrados e 3 doutoramentos.

O financiamento de projetos mobilizadores, com recurso a programas como o PT2030 e PRR, é, sem dúvida, uma forma de capacitar as empresas, com o apoio dos centros de conhecimento, para os desafios de uma indústria que se reinventa em permanência.

A indústria de componentes em Portugal, tem sido confrontada nos últimos anos com desafios que põem à prova, em permanência, a sua capacidade de adaptação. Mas as 350 empresas que constituem o setor são responsáveis por uma faturação anual de 13.000 Milhões de Euros, sendo que 85% se destina à exportação direta para os principais mercados da Europa. Esta atividade é garantida por um emprego qualificado de 62.000 trabalhadores, o que representa mais de 9% do emprego na indústria transformadora. Temos vindo também a assistir a um crescimento de vendas, sustentado pelo aumento da competitividade do sector. O investimento na modernização das tecnologias, na transformação digital da atividade e uma aposta na inovação de produtos e processos representa valores significativos que ultrapassam os 16% de todo o investimento realizado em Portugal, na indústria. Este esforço tem permitido um aumento das vendas, mesmo quando se verifica uma retração na indústria automóvel e é hoje responsável por 5,3% do PIB. Continuar a apoiar esta indústria na sua modernização, na formação permanente dos seus trabalhadores e nas atividades de I+D+i é o caminho certo para continuarmos a contar com a indústria de componentes no crescimento sustentado da economia portuguesa.

E é precisamente esta evolução e os desafios constantes que esta indústria enfrenta, que estamos a discutir esta semana no 11º Automotive Industry Week, realizada pela AFIA – Associação de Fabricantes da Indústria Automóvel. É importante que se perceba que o futuro na indústria automóvel é já passado sendo urgente a troca de experiências e estratégias entre os diferentes players, para que em conjunto se encontre formas de ajudar as nossas empresas a mostrar o seu valor.