Na primária, a minha professora costumava dizer que não iríamos andar sempre com uma calculadora no bolso. Hoje, não só carregamos calculadoras nos bolsos, mas também dispositivos com capacidade de processamento milhares de vezes superior ao computador que levou o homem à Lua. Este avanço tecnológico revolucionou todos os aspetos das nossas vidas, incluindo a Medicina. À medida que a inteligência artificial (IA) e outras tecnologias avançam, a relação médico-doente está a mudar de uma forma que apresenta tanto desafios como oportunidades para os profissionais de saúde.

As vantagens mais promissoras da IA na saúde incluem a rápida análise de enormes quantidades de dados, que podem ajudar os médicos a fazer diagnósticos mais precisos e a personalizar tratamentos. A IA está a transformar a saúde – desde o diagnóstico até à automação de tarefas administrativas. Isso não só aumenta a eficiência, mas também permite que os médicos se concentrem mais no cuidado direto ao doente.

No entanto, esta transformação trará novos desafios. Os médicos devem adaptar-se a novas formas de obter e validar informações. A IA está em constante evolução e será capaz de fazer diagnósticos cada vez mais precisos e altamente personalizados. No entanto, essa dependência crescente da tecnologia exige que os médicos mantenham uma forte capacidade crítica e avaliativa. Sem isso, corremos o risco de nos tornarmos demasiado dependentes da tecnologia, comprometendo a nossa capacidade de tomar decisões informadas e humanizadas, e aí sim, obsoletos.

A interação médico-máquina-doente está a redefinir o papel do médico. Tome-se como exemplo a telemedicina; acelerada pela pandemia de COVID-19, está aqui para ficar. Hoje, com sistemas de IA a apoiar os médicos, a monitorização remota de pacientes, a previsão precoce de problemas de saúde e até a modificação de tratamentos em tempo real são possíveis. Mas a humanização do atendimento não pode ser esquecida. A capacidade de perceber as nuances na condição de um paciente – muitas vezes indo além dos dados quantificáveis – ainda é uma competência crítica que os sistemas de IA, por agora, não podem replicar.

Além disso, a utilização de tecnologias como os chatbots e assistentes virtuais tem mostrado ser eficaz na triagem inicial e no fornecimento de informações básicas. Estudos recentes mostram que esses sistemas podem melhorar significativamente a acessibilidade e a eficiência do atendimento, especialmente em áreas com escassez de profissionais de saúde. Esses assistentes virtuais são capazes de responder a perguntas comuns, agendar consultas e até mesmo monitorizar sintomas, libertando mais tempo para que os médicos se concentrem em casos mais complexos.

A relação médico-doente está a mudar, impulsionada pelo avanço tecnológico. No entanto, ao adotarmos todas estas novas ferramentas, precisamos ter muito cuidado para não perder a nossa capacidade crítica e avaliativa. A tecnologia deve ser uma aliada, não uma substituta da competência humana. A professora primária não via o futuro da calculadora, mas hoje conseguimos ver a mudança diante de nós. Agora, cabe-nos criar um futuro em que a tecnologia e a empatia andem lado a lado em prol de um melhor cuidado aos nossos doentes.

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