A sul do Mediterrâneo há países de que sabemos muito pouco. A Líbia é um deles. A maioria recordar-se-á dos acontecimentos da primavera árabe e da consequente queda do regime, mas, entretanto, passaram mais de 12 anos.

Em 2011, o vazio criado pelo fim do regime deixou à vista uma intensa fragmentação regional e política, com múltiplas fações étnicas e divisões religiosas, milícias e grupos armados a competir pelos recursos e pelo poder. Em 2014, os líbios foram às urnas (pela última vez), mas o resultado eleitoral foi rejeitado e, depois deste fracasso, radicalizaram-se posições e acentuaram-se conflitos.

O país acabou dividido, resgatado por dois governos rivais: a ocidente, em Tripoli, o Governo de Unidade Nacional; na Líbia oriental, o Governo de Estabilidade Nacional, liderado pelo militar Khalifa Haftar, líder do autoproclamado Exército de Libertação da Líbia.

A produção e exportação de petróleo, principal recurso económico do país, não escaparam aos conflitos armados, aos bloqueios a instalações petrolíferas e às disputas políticas, reforçando a fragilidade da economia líbia. O colapso das instituições – da saúde à justiça e sistema penal –, a falta de manutenção de infraestruturas e a violência contra civis arrasaram a organização social e agudizaram a crise humanitária.

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Para se ter uma ideia da dimensão da crise humanitária na Líbia, apenas de entre os que tentaram a travessia do Mediterrâneo, nos primeiros 11 meses de 2023, mais de 15 mil foram intercetados e presos. Em 2022 este número tinha ultrapassado as 24 mil pessoas. As alterações climáticas têm pressionado a situação, como ficou visível em 2023, quando duas barragens cederam à força da tempestade Daniel, criando uma onda que arrasou grande parte da cidade costeira de Derna, no leste da Líbia, provocando um número indeterminado de mortos, desaparecidos e deslocados.

Ao longo dos últimos anos, a ideia de realizar eleições não conseguiu o consenso necessário. O último esforço de avançar com eleições presidenciais e parlamentares, em 2021, colapsou quase à beira das urnas. A fragmentação política, a desconfiança, a falta de segurança e a sobreposição de interesses (locais e externos) têm minado os processos e adiado as condições para um voto livre e justo, tão necessárias para que uma Líbia unificada se possa reerguer.

As Nações Unidas, secundadas por outras instituições internacionais, incluindo a própria União Europeia, acreditam que a solução para o país passa por um governo técnico de transição, independente das forças e agendas políticas, mas conhecedor das realidades locais. A solução parece ter apoio para avançar rapidamente, mas a grande questão que se coloca é saber quem poderá ser legitimado para liderar este executivo?

O professor universitário e diplomata Ageila Elabbar tem sido apontado como alguém à altura desta complexa missão. A sua abordagem tecnocrata e não política, confere-lhe independência e o respeito de ambas as partes. Adido académico no exterior, é reconhecido, tanto nos círculos internos como na comunidade internacional, pela sua personalidade conciliadora. E é um homem do ensino e do conhecimento, com vasta experiência e produção científica aquém e além-fronteiras.

Personalidade, formação e experiência traduzem as competências pessoais e as aptidões técnicas indispensáveis para fomentar consensos e assegurar a eficácia de um executivo de transição. Ageila Elabbar é, por isso, um nome a reter quando em causa está a criação de uma base comum para a normalização institucional na Líbia.

Sem esta solução, a dualidade de poder tende a perpetuar-se e a alternativa de uma eleição sem este governo de transição – com forças concorrentes (e armadas) a disputar vantagens – não irá, certamente, pavimentar o caminho indispensável para a reconciliação nacional.