Ainda recentemente tive a oportunidade de revisitar imagens de Lisboa na década de 80 do século passado e é incrível verificar as mudanças que existiram quer em termos de urbanismo, quer em termos de mobilidade, quer em termos de infraestruturas, para não falar do tipo de roupa que se usava à época. Quando vemos vídeos da baixa pombalina cheia de carros, ou da praça dos restauradores a ser um estacionamento repleto de automóveis, e quando assistimos a todo o esforço de renovação e modernização que foi feito ao longo de décadas, percebemos que a evolução foi muita. A “criação” de uma nova cidade na zona onde se organizou a Expo98 foi outro marco de evolução brutal, que permitiu mudar radicalmente a vida na cidade, e que demonstra bem a importância do “bom” investimento público estruturante para o futuro, neste caso, das cidades. E, por via do turismo e de uma promoção internacional bem conseguida, passou a existir uma procura crescente pela renovação imobiliária na cidade de Lisboa, que mudou a cara da cidade. Lisboa é, atualmente, uma cidade diferente. Mais “sexy”. Mais cosmopolita. Mais viva.
Refiro o caso de Lisboa apenas para exemplificar que a modernização é valorizada e deve ser promovida. Ninguém aceitaria viver agora em Lisboa nas mesmas condições que tinha no início do século XXI (para recuar apenas 24 anos), sem beneficiar das melhores práticas, das melhores tecnologias ou dos melhores equipamentos. Todos queremos beneficiar do conforto proporcionado pelo desenvolvimento.
Mas porque é que estou a fazer esta introdução?
Porque quero fazer um paralelismo com o território rural.
Em Portugal, apenas Lisboa tem uma população de mais de 500 mil habitantes, e as áreas metropolitanas de Lisboa (com cerca 2,8 milhões de pessoas) e Porto (com cerca de 1,8 milhões) concentram aproximadamente 45% do total da população residente no Continente. Numa faixa costeira até 25 km da costa, Portugal concentra cerca de 60% da população.
No entanto, e apesar disso, Portugal é predominantemente um país rural. E, quem vive nas cidades, e que elege os representantes políticos da Assembleia da República devido ao nosso sistema eleitoral, tem um sentimento de algum paternalismo sobre o mundo rural. Esse paternalismo passa por olhar para esse “mundo” como algo que deve ser preservado e que, por isso, deveria estar imune ao ritmo frenético da evolução da cidade. É o mundo em que é possível relaxar. É o mundo calmo, em que o tempo é o de antigamente. E isso, nesta visão paternalista, deve ser preservado.
De facto, as zonas rurais são um elemento central da identidade nacional, e europeia. Em Portugal representam, se incluirmos os matos, cerca de 90% do território. É nessas áreas que se produzem alimentos, que se gerem recursos naturais, e que se protegem paisagens naturais, que em muitos casos suportam a recreação e o turismo. Muitas das nossas tradições, festivais e cultura têm as suas raízes nas zonas rurais.
As zonas rurais portuguesas têm, por outro lado, a sua economia muito centrada na agricultura e na floresta. Em muitas regiões nacionais, o emprego no sector primário excede 20% e nalgumas representa mesmo quase metade de todo o emprego. E as mudanças sociais e económicas das últimas décadas, incluindo a globalização e a urbanização, estão a alterar o papel e a natureza dessas zonas rurais. As zonas rurais também evoluíram. E muito.
Uma grande parte desta transformação deve-se à agricultura e à floresta, que evoluíram bastante. Tornaram-se mais produtivas, mas também mais eficientes. Onde há condições propícias, as culturas são mais intensivas, mas mais sustentáveis. São mais mecanizadas e tecnológicas e permitem criar mais oportunidades a quem vive nos territórios rurais.
Quem não acompanha de perto o setor pode não saber que, nos últimos 10 anos, Portugal aumentou 12 vezes o valor das exportações de pequenos frutos, e que nos últimos 20 anos as exportações de azeite aumentaram 12 vezes em volume e 18 vezes em valor, praticamente sem aumentar a área de produção.
Provavelmente também não tem a perceção que a intensificação sustentável da agricultura é uma realidade e que se reflete em diversos indicadores, como a utilização de menos de metade da quantidade de fitofármacos por hectare do que se usava há 20 anos, ou com uma eficiência no uso de água de rega três vezes superior ao que se passava há 40 anos. Ou que o nível de utilização de tecnologia na gestão agrícola, e florestal, tem permitido atrair talento de novas áreas de formação para o interior do país.
O que acaba por ser mais visível, e ainda bem, é que se tem desenvolvido o turismo de natureza em grande parte do território, ou que se têm desenvolvido programas de restauro da natureza que permitiram, por exemplo, o sucesso da recuperação das populações de lince ibérico.
Ao longo dos últimos meses, e de uma forma descomplexada, o B-RURAL procurou mostrar, sobretudo a quem não vive nas zonas rurais, o tanto que se tem feito de bom no mundo rural e na agricultura nos últimos anos. Ainda são os primeiros passos de uma longa jornada. Porque há mesmo muito para mostrar e para falar.
As áreas rurais, tal como as áreas urbanas, evoluíram muito. E isso é bom. Isso é mesmo muito bom!