Lá chegamos aquele momento do ano velho em que iniciamos balanços, refletimos e renovamos ambições. Para o ano, queremos sempre ser mais e melhor do que o que fomos, e o início de um novo ano é sempre a oportunidade para repensar prioridades e definir rumos.
Na saúde, o momento exige coragem para enfrentar os desafios, abandonar preconceitos e construir soluções que deem resposta às necessidades dos portugueses. Mas é também o tempo e o momento de nos capacitarmos que já cansa ouvir o mesmo de sempre, e quem acompanha os assuntos da saúde, não pode deixar de se espantar como, ano após ano e sempre em volta do cash flow público do Serviço Nacional de Saúde (SNS), são debitadas as mesmas soluções e, de emergência em emergência, se vai depauperando o acesso dos cidadãos aos cuidados, sempre com maior gasto do dinheiro dos contribuintes nos hospitais do SNS (agora modernamente intituladas como Unidades Locais de Saúde).
Alimentando a esperança de sermos capazes de libertar o SNS e o sistema de saúde das amarras que o consomem, aqui ficam 12 desejos para transformar o sistema de saúde e colocá-lo ao serviço de todos:
Revalorizar o setor convencionado como parceiro indispensável do SNS
É tempo de reconhecer o setor convencionado como essencial na resposta às necessidades dos utentes; complementa o SNS, garante eficiência e contribui para reduzir os tempos de espera, sendo crucial reforçar a sua integração no sistema. Toda a capacidade existente em Portugal – pública, privada e social – já se viu que não é suficiente para aquilo que os Portugueses precisam, havendo que articular toda a capacidade existente. Os associados da ANL garantem anualmente o atendimento a cerca de dez milhões de utentes, sendo quase seis milhões a título de beneficiários do SNS. Estes seis milhões de utentes querem acesso às suas análises com qualidade, rapidez e eficiência, e não querem discussões filosóficas sobre a natureza pública, social ou privada dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde.
Revisão urgente dos preços convencionados
Esperar que o setor privado convencionado continue a operar com preços que não são atualizados há quase duas décadas é não só irrealista, mas também uma afronta à sustentabilidade do setor. Fruto de um “wokismo” instituído em volta da discussão público versus privado, quem não defenda um aumento de pelo menos 50% de qualquer coisa no SNS é, seguramente, contra a saúde e contra as pessoas. E quem defenda um aumento de 1% no setor convencionado, que diariamente atende centenas de milhares de utentes do SNS, é, seguramente, um qualquer malfeitor. No final do dia, todos atendem os utentes do SNS e de acordo com as regras deste, pelo que é imperativo ajustar os valores às realidades económicas atuais, garantindo a viabilidade de quem presta cuidados de qualidade e o acesso dos utentes aos cuidados.
Liberdade de escolha para os utentes
A liberdade de escolha não é apenas um direito dos cidadãos, mas também um instrumento poderoso para melhorar a qualidade do sistema. Permitir aos utentes decidir onde e como querem ser tratados promove a concorrência saudável e beneficia a eficiência do setor. Não raras vezes a desculpa de “aproveitar a capacidade instalada” do SNS mais não é do que uma tentativa de fuga à pressão da concorrência e do poder soberano do utente.
Implementação efetiva do Despacho n.º 12876-C/2024
Este despacho representa uma mudança estrutural que o SNS há muito precisava. É essencial garantir a sua aplicação plena, promovendo um acesso mais ágil, justo e equitativo aos cuidados de saúde e reforçando a integração do setor convencionado. Que o ano de 2025 não seja mais um ano em que as boas ideias ficam no papel, à conta de uma qualquer dificuldade burocrática ou técnica suscitada na sombra dos gabinetes de quem esteja habituado a tentar manter tudo sempre na mesma.
Melhor acesso aos cuidados de saúde
O acesso deve ser medido e monitorizado de forma permanente e técnica, e publicitado de forma capaz para que todos os cidadãos conheçam a sua evolução. Que 2025 nos traga menos conversa e mais estudos técnicos e independentes de monitorização do acesso aos cuidados de saúde.
Proximidade e “desospitalização” nos cuidados
O reforço da rede convencionada de saúde e a aposta em laboratórios convencionados são essenciais para garantir que os portugueses não tenham de percorrer quilómetros para aceder a serviços básicos. Os cidadãos devem ter o mesmo direito de acesso aos cuidados, independentemente do local onde vivam, e aqueles que promovem processos de internalização de análises clínicas deveriam ser confrontados com os danos que causaram, e causam, ao acesso aos cuidados.
Cumprimento rigoroso das regras de licenciamento e qualidade pelas unidades hospitalares públicas
É inaceitável que as unidades hospitalares do Estado continuem a operar fora das normas de licenciamento e qualidade que o setor privado cumpre há anos. Que o ano de 2025 seja o ano da uniformização destas exigências e da efetiva fiscalização das unidades hospitalares do Estado, garantindo equidade no sistema de saúde.
Abertura e regulamentação da profissão de flebotomista (*)
A saúde precisa de mais profissionais. Apesar disso, a “guerra” das profissões é diária, e percebe-se bem porquê, enquanto herança de uma cultura de corporativismo. Os cidadãos querem os seus problemas resolvidos, e no que concretamente respeita aos laboratórios de análises clínicas, a criação e regulamentação da profissão de flebotomista ajudará a responder à crescente procura nos laboratórios e a aliviar a pressão sobre os serviços.
Reforçar o cumprimento das regras em farmácias e colheitas de análises clínicas
A segurança dos utentes deve ser uma prioridade máxima. É urgente proibir práticas não reguladas em farmácias e garantir que as colheitas de análises sejam realizadas de acordo com os requisitos de licenciamento e boas práticas.
Apostar na prevenção e na promoção da saúde
A prevenção é a chave para uma população mais saudável. Os programas de rastreio devem ser uma prioridade para evitar doenças e reduzir a pressão sobre o sistema de saúde. A rede dos laboratórios convencionados, com mais de 3300 pontos de acesso espalhados pelo país, está disponível para auxiliar.
Fim de preconceitos ideológicos na saúde
O sistema de saúde não pode continuar a ser refém de interesses ideológicos, retóricas populistas ou disputas de protagonismo. O foco deve estar na eficiência e no bem-estar dos utentes, e não em agendas políticas. A saúde é um direito dos cidadãos, não um qualquer troféu.
Investimento na prevenção e modernização tecnológica
A saúde pública deve priorizar a prevenção, promover estilos de vida saudáveis, adotar tecnologias que melhorem a gestão, reduzir burocracias e tornar o sistema de saúde mais eficiente e mais amigo do cidadão. Será assim tão difícil?
2025 deve ser o ano em que passamos a olhar para a saúde como o que realmente é: um direito essencial que exige compromisso, seriedade e ação concreta. Estes 12 pedidos são mais do que desejos — são exigências para um sistema que deve servir quem mais dele precisa: os cidadãos portugueses.
(*) Um flebotomista, frequentemente designado por técnico de colheitas, é um profissional da saúde treinado para a colheita de amostras de sangue de doentes para análises laboratoriais, transfusões de sangue ou doações de sangue.