A decisão de abrir publicamente o capital é um marco importante no ciclo de vida de uma empresa, mas, no caso das empresas familiares, essa decisão torna-se ainda mais complexa devido às componentes emocional e identitária associadas a este tipo de organizações.
Existem dois motivos principais pelos quais as famílias empresárias consideram a possibilidade de abrir o seu capital: financeiros ou de governance. Os motivos financeiros prendem-se com a necessidade de investir e/ou fazer crescer o negócio sem recorrer ao capital dos acionistas. Uma oferta pública inicial (IPO) permite captar novos recursos (Pagano et al., 1998), que podem financiar expansões, investir em novas tecnologias e realizar aquisições estratégicas (Hsieh et al., 2011). Consequentemente, ao aumentar a flexibilidade financeira, as empresas conseguem ter acesso a alternativas de financiamento, a novos investimentos e atrair novos investidores, como fundos de venture capital (Bancel & Mittoo, 2009).
Do ponto de vista de governance, uma IPO melhora a transparência e a responsabilidade, o que fortalece a credibilidade no mercado (Arthurs et al., 2008). Empresas listadas publicamente são percebidas como mais profissionais e transparentes, o que pode atrair melhores talentos, melhorar a sua competitividade e contribuir para uma melhor imagem e reputação. Adicionalmente, esta operação também poderá ser usada como uma estratégia de saída, oferecendo aos acionistas a possibilidade de liquidez parcial ou total dos seus investimentos (Souitaris et al., 2020). Para as famílias, esta operação pode representar uma forma de garantir a continuidade da empresa, mesmo sem o controlo direto da família.
Mas então, a que se deve a reserva na tomada de decisão de avançar ou não com uma IPO? Os receios prendem-se com a potencial perda do controlo para acionistas externos (Helwege & Packer, 2009). Isto é, a entrada de acionistas externos pode diluir o poder da família (Helwege & Packer, 2009). Adicionalmente, as empresas públicas enfrentam um maior escrutínio e são obrigadas a divulgar informações sensíveis, o que pode ser desconfortável para as famílias que valorizam privacidade. Finalmente, os custos relacionados a uma IPO são elevados e incluem despesas legais, de marketing, e de compliance (Ritter & Welch, 2002).
Recentemente, um estudo de Carbone e colegas (2024) identifica três caminhos possíveis seguidos pelas empresas familiares ao decidir abrir o seu capital, dependendo das suas motivações e objetivos estratégicos: (i) o caminho brilhante, quando a IPO é vista como uma oportunidade para financiar o crescimento sem comprometer o controlo familiar; (ii) o caminho da continuidade, seguido por aquelas que querem assegurar a sobrevivência no longo prazo, mesmo que isso implique a redução da influência familiar; (iii) e finalmente, o caminho do desafio, normalmente promovido pela segunda geração, e reflete o desejo de inovação e modernização. Neste caso, a IPO impulsiona a adoção de novas tecnologias e a exploração de oportunidades de mercado. No entanto, e apesar da maior abertura, as decisões estratégicas continuam sob a alçada da família.
A abertura do capital pode alterar a dinâmica interna da empresa. Se por um lado, promove uma maior transparência e a inclusão de novos agentes na tomada de decisões, por outro lado, também pode gerar tensões entre as gerações, especialmente quando há divergências sobre os rumos estratégicos.
Assim, aquando da tomada de decisão de abrir o capital, há todo um trabalho de casa que deve ser feito antes e que passa por alinhar os objetivos financeiros com os seus valores familiares, uma vez que para além das novas possibilidades financeiras que se abrem, existem também consequências emocionais e culturais que resultam dessa transição.