Sou professora. Faz, categoricamente, parte da minha identidade. E, desde muito cedo, comecei a refletir sobre a professora que queria vir a ser. Para lá da solidez científica, pedagógica e didática, queria a humanidade como eixo norteador. Lembro-me de ter confirmado a importância desse querer numa das primeiras aulas do Mestrado em Ensino.
Na disciplina de Ética e Educação, ao recordar os professores que nos marcaram, chegamos à conclusão que pessoas com backgrounds complementamente díspares tinham algo em comum: os professores que os marcaram apresentavam traços de caráter positivos. Em poucas palavras, eram humanos e mostravam-se como tal.
Como poderia mostrar-me como humana? Durante a iniciação à prática profissional (estágio), tive a sorte de ser orientada por alguém para quem a construção de uma relação positiva com os alunos era fundamental. Durante aqueles meses, observei e cheguei a algumas respostas àquela questão. Todavia, quando terminei o meu percurso académico, senti que ainda não estava pronta para concretizar esta ideia de ser humana.
Foi a minha experiência de dois anos numa organização na área da educação, a Teach For Portugal, que me trouxe essa concretude. Aprendi que a atenção às necessidades de cada criança e jovem pode ser uma resposta nesse sentido. A atenção e também a procura de respostas para essas necessidades. E como fazer isso na prática?
Enquanto aluna do Mestrado em Ensino, contactei com diferentes orientações do Ministério da Educação (1) que nos dizem que devemos diferenciar o processo de ensino aprendizagem consoante as necessidades de cada um. Podia encontrar algumas indicações sobre como o fazer em documentos como o manual de apoio à prática, para uma educação inclusiva. Todavia, sentia falta de ações concretas, que eu poderia seguir, de forma a corresponder às necessidades de cada um. O leitor já deve ter percebido que entendo o conceito de necessidade de um modo um tanto quanto diferente daquele entendido por estes documentos.
No contexto de formação da Teach For Portugal, contactei com o termo planning for the edges (planear para os extremos ou, com mais sentido para mim, planear para a diversidade) e compreendi como poderíamos colocar em prática aquilo que outrora havia lido naqueles documentos.
Então, durante os dois anos em que trabalhei como Mentora Teach For Portugal numa escola, acompanhando professoras dentro da sala de aula, conseguimos dar resposta às necessidades de cada um porque tínhamos esse conhecimento. Aplicando os princípios subjacentes ao planear para a diversidade.
Assim, em salas de aula completamente heterogéneas, conseguimos fazer com que a Luísa, que aprende melhor através da prática, o José, que apresenta um diagnóstico de dislexia, o Miguel, que tem um interesse por ciências, a Joana, que tem um diagnóstico de hiperatividade, a Magda, que tem um diagnóstico de autismo, e tantos outros com diversas inteligências e particularidades, conseguissem adquirir competências e atingir objetivos.
Estão a ver onde quero chegar com a complementaridade entre ambas? No meu caso, entre a experiência que tive enquanto aluna do Mestrado em Ensino e enquanto Mentora Teach For Portugal.
A entrada neste Programa também me permitiu experienciar, em primeira mão, a importância que tem alguém como eu, inexperiente na profissão, acompanhar pessoas com vários anos de experiência. Como disse, tive a oportunidade de partilhar a sala de aula, durante dois anos, com três professoras experientes.
Acompanhava o seu dia a dia na escola. Colocava muitas questões sobre a profissão, umas mais burocráticas, outras mais pedagógicas e ainda várias didáticas. Aprendi muito com elas nestas três dimensões, o que me preparou, principalmente a nível de confiança no meu trabalho, para ser a professora que me estou a tornar hoje. Defendo, com base nas evidências da minha própria experiência, que seria muito benéfico para cada professor, acabadinho de sair da faculdade, ter a oportunidade de estar alguns anos a acompanhar professores experientes. A mim, trouxe-me segurança e muitas aprendizagens. E, gosto eu de pensar, que àquelas três professoras também trouxe alguma riqueza.
Hoje, enquanto professora, sozinha numa sala de aula, sinto a necessidade da presença de um outro olhar. Sei que há muitas coisas que me escapam, como consequência disso.
Sou consciente de que no ensino secundário está prevista a existência de coadjuvação quando a mesma se justifica. Na minha perspetiva, esta prática, quando efetivamente aplicada, é particularmente útil em contextos de maior heterogeneidade dos alunos e dá resposta a políticas de inclusão, permitindo uma diversificação curricular e diferenciação pedagógica mais eficazes. Por que não adotá-la? Ou aplicá-la com outra roupagem? Talvez recebendo aberta e positivamente projetos fora do currículo “tradicional”. Essa estratégia não poderia ser uma boa adição às estratégias implementadas para a recuperação e melhoria das aprendizagens? (2)
Eu, como professora, sinto a necessidade de continuar a procurar esta complementaridade de experiências, possibilitando o desenvolvimento global dos alunos. E isto é importante, acima de tudo quando aquilo que queremos atingir é o sucesso de todos os nossos alunos e um melhor futuro para todos nós.