Com este artigo, espero apresentar a minha visão do Liberalismo Clássico, a forma como esta filosofia política está ligada à verdadeira Liberdade e à ética, apresentando estes conceitos como essenciais na abrangência política dos Liberais, descartando as moralidades impostas e aceitando os respeitadores dos referidos conceitos. Este texto não pretende ser um texto científico, pretende apenas expressar a minha opinião.

Assim, em primeiro lugar, cumpre apresentar sumariamente a filosofia política do Liberalismo Clássico, não querendo esmiuçar a Doutrina, ficando-me pela explicação sintética:

O Liberalismo Clássico é uma filosofia política que surge no final do séc. XVIII e tem vindo a ser desenvolvida e adaptada ao longo do tempo. As suas características de profundo conhecimento do Ser Humano e das suas necessidades dão-lhe este caráter sempre atual. Esta filosofia política é baseada na defesa intransigente da liberdade individual, em contraposição ao poder do Estado. Assim, na liberdade individual, entende-se que todos os cidadãos são livres, iguais e que isto é assegurado através da Lei, que serve o individuo. Por outro lado, o Direito de Propriedade, a liberdade económica ou o Direito ao fruto do Trabalho, são sagrados pois considera-se que são uma extensão da própria liberdade individual, considerando mesmo John Locke, sem hipérbole, que são uma extensão do Direito ao próprio corpo individual. Acrescento, ainda, que não existe Bem coletivo fora da dimensão de uma soma dos “Bens individuais”. Para que tal se cumpra, é necessária uma dimensão ética muito forte.

Por que razão a ética é tão importante?

Respondendo à pergunta retórica, é necessário distinguir ética de moral, pois esta distinção é relevante para compreender o reflexo político das mesmas mais à frente.

A moral é temporal, conceptual (Logos), social e cultural, mutável e impermanente. A ética é intemporal, não conceptual, não social e não cultural, imutável e permanente. A ética é uma experiência noética (de Nous) e contrariamente à moral que vem das organizações sociais e instituições Humanas, a ética não se sabe ao certo de onde vem. Que se acalmem os materialistas que com isto não me refiro a um Ser superior ou à metafísica. Refiro-me apenas àquele espaço onde há a experiência noética que todos já sentimos de “não devia ter feito isto”, “isto que fiz está errado”, “arrependo-me de ter feito isto”, ou aquela pura intuição de “vou fazer isto que é o correto”, ou “procedi corretamente”. Isto é a ética e é daqui, deste lugar profundo e indeterminado, que ela provém. A ética, por exemplo, é aquilo que levou o Homem Primitivo, ainda na fase da pré-linguagem, a cuidar dos mais velhos e doentes, ou a perceber que não devia assassinar o vizinho, ou roubar-lhe a comida. Ao contrário da moral que em cinquenta anos mudou completamente, a ética do Homem Primitivo, do medieval, do maubere, do japonês, do esquimó, ou do maia é exatamente a mesma que a nossa.

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Podemos, em dois exemplos, compreender a diferença entre ética e moral aplicadas.

  • Nas Constituições ocidentais, desde cedo que se assegura a liberdade religiosa e de culto. A disposição Constitucional que assegura essa liberdade é ética. A liberdade assegurada em cada religião ou culto é moral.
  • No Código Penal temos o Crime de Lenocínio que determina:

“Artigo 169.º
Lenocínio

1 – Quem, profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra pessoa de prostituição é punido com pena de prisão de seis meses a cinco anos.
2 – Se o agente cometer o crime previsto no número anterior:
a) Por meio de violência ou ameaça grave;
b) Através de ardil ou manobra fraudulenta;
c) Com abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela, ou de dependência hierárquica, económica ou de trabalho; ou
d) Aproveitando-se de incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da vítima;
é punido com pena de prisão de um a oito anos.”

O número 1 deste artigo é moral e o número 2 é ética.

Por outro lado, é igualmente importante explicar o conceito de Liberdade com o L maiúsculo. Esta Liberdade é simplesmente a capacidade ou o Direito que cada Ser Humano tem de se cumprir a si próprio, dentro dos limites da ética.

Portanto, alicerçado nestes conceitos de ética e Liberdade, afirmo-me como Liberal Clássico e, como tal, coloco o indivíduo à frente de qualquer bem coletivo. O Bem coletivo não existe e sempre que é invocado é para trazer desastres trágicos à Humanidade. O Bem coletivo só é alcançado através do conjunto de cada Bem individual que, por sua vez, só é alcançado com ajuda da ética e da Liberdade.

Como Liberal Clássico, não gosto de ser conotado filosoficamente com os Conservadores, pois tal comparação é uma pura falácia. Desde logo, porque como Clássico a moral pouco me importa. Por outro lado, os Liberais Conservadores gostam da moral, mas não a pretendem impor aos outros. É aliás precisamente isso que distingue os Conservadores dos Liberais Conservadores, os primeiros querem impor a sua moral aos outros e os segundos apenas gostam da moral, não querendo impô-la aos outros.  Acontece que, como Liberais Clássicos, acreditamos apenas nos limites da Liberdade e da ética, e por essa razão, nós, os Clássicos sentimo-nos confortáveis com a divergência de opinião, desde que essa opinião não nos queira impor os seus valores morais, como acontece no Marxismo (no assumido e no dissimulado, como o animalismo ou ambientalismo de esquerda), no Wokismo, ou no Conservadorismo de esquerda e de direita. O que acontece, é que vários liberais mais conservadores (distinção entre Liberais Conservadores e Conservadores já efetuada) se sentem confortáveis no espaço do Liberalismo Clássico pois sabem que provavelmente é o único ambiente político onde há verdadeira liberdade de pensamento com os limites supra definidos. Por essa mesma razão, mas num raciocínio a contrario sensu os que professam o Wokismo sentem-se desconfortáveis entre os Clássicos, pois querem impor aos outros a sua moral. Coisa que entre os Clássicos é inaceitável!

Não é de espantar que assim seja, pois foram os Liberais Clássicos que ao criarem as primeiras Constituições, criaram disposições éticas que aceitariam todas as manifestações da moral e da Liberdade, desde que não fossem contra a ética.

Para demonstrar que enquanto Liberal Clássico não tenho qualquer traço de Conservadorismo ou moralismo, deixo aqui, a título de mero exemplo, a minha opinião em seis questões, normalmente associadas ao Conservadorismo. Assim, fundamentado na ética e Liberdade, defendo:

  • O Aborto até às dez/doze semanas. Proibir o aborto antes é antiético e fruto da moral e liberalizar após é antiético e fruto da moral;
  • A Eutanásia. Obrigar a prolongar uma vida de extremo sofrimento a alguém que deseja através de um ato médico morrer, com o objetivo de cessar esse sofrimento é, na minha opinião, antiético e contra a Liberdade;
  • O Casamento entre pessoas do mesmo sexo. É simplesmente uma questão de Liberdade e de ética;
  • A legalização da prostituição. Como expliquei acima o art.º 169º do Código Penal só deveria conter a dimensão ética e retirar-se a dimensão moral, ou seja, retirar o n.1 e manter o n.2;
  • A legalização das drogas leves. Mais uma vez, é uma questão de Liberdade;
  • A inexistência de entraves à imigração legal. É uma questão de ética e Liberdade tanto na aceitação como na limitação;

Espero, desta forma, ter demonstrado que ser Liberal Clássico implica a aceitação do outro na sua manifestação enquanto Ser Humano único que procura a felicidade, e que os limites a esta filosofia são apenas relativamente àqueles que tentam impor os seus quadros morais aos outros. Por essa razão, é natural que todos os Liberais que respeitem a ética e a Liberdade, independentemente dos seus quadros morais, sejam muito bem-vindos aos Liberais Clássicos, porque, na verdade, seguindo uma linhagem de Liberdade, ética e tolerância com mais de trezentos anos, já são Liberais Clássicos.