A Hipertensão Arterial (HTA) – principal fator de risco cardiovascular em todo o mundo – continua a ser pandémica e a gravidez não é momento de exceção.

Cerca de 5 a 10% das gravidezes continuam a ser complicadas por esta doença, com graves consequências na morbilidade e mortalidade materna, fetal e neonatal: isto é, a HTA causa problemas não só na mãe, mas também no bebé antes, durante e após o parto. Mais ainda, já se tem provado que tem também implicações no futuro da mulher e da criança no que respeita ao risco cardiovascular a longo prazo. Na mulher grávida assume assim particular importância o diagnóstico precoce e o tratamento adequado.

De salientar ainda que há poucos números nacionais e mundiais sobre a prevalência da HTA na grávida e continuamos a falar em 5-10% desde há muitos anos… mas assumindo que dado que a prevalência de HTA no mundo continua a aumentar, a obesidade é cada vez mais frequente em especial na população jovem, e o facto das mulheres engravidarem cada vez mais tarde (sendo que a idade gestacional avançada é outro fator de risco para as complicações hipertensivas na gravidez), provavelmente há ainda mais mulheres com complicações derivadas a pressão arterial alta neste período da sua vida do que temos conhecimento.

A gravidez é o chamado momento de “teste de stress” – o corpo da mulher é posto à prova em vários aspetos cardiovasculares, metabólicos, vários tipos de desafios/ transformações aos quais os órgãos são submetidos, e quando não são capazes de responder da melhor forma, podem surgir as complicações da doença hipertensiva com implicações para o presente e o futuro.

A única forma de diagnosticar a HTA na grávida, tal como no resto da população, é medir a pressão arterial (PA). É um ato simples, ao alcance de todos, seja em casa, na farmácia, no consultório médico, com regras simples de cumprir, e que permitem um diagnóstico rápido e eficaz. Falamos em hipertensão na gravidez quando o valor de pressão arterial sistólica, vulgo valor da “máxima” é igual ou superior a 140mmHg e a mínima igual ou superior a 90mmHg. Esta medição deve ser repetida de preferência em duas ocasiões diferentes (ou pelo menos com 15 minutos de diferença se estivermos a falar de HTA grave, ou seja, >160/110mmHg, que foi o valor definido como tal na grávida, com um limite menor do da população em geral).

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Há vários tipos de HTA na grávida conforme o momento em que é diagnosticado e, em determinados tipos, também os valores com que se apresenta ou os sinais ou sintomas que revela. Atenção que não deixa de ser o “assassino silencioso” como na população geral, uma vez que a hipertensão não dá sintomas a não ser que se complique. Na grávida a HTA pode ser suficientemente grave para valores menores que os habituais, levando às chamadas pré-eclâmpsia e eclâmpsia, que implicam medicação endovenosa, internamento e um parto emergente. Caso não sejam medidas tomadas atempadamente podem ter consequências muito graves como convulsões, AVC, problemas cardíacos graves e mesmo a morte. Uma gravidez com qualquer um dos tipos de hipertensão tem risco de voltar a ter complicações numa gravidez seguinte, pelo que a vigilância e a prevenção são novamente palavras – e mais do que isso, medidas – fundamentais.

Há vários medicamentos que podem ser tomados durante a gravidez, sem prejudicar a mãe ou o bebé, pelo que quando a mulher está a fazer medicação e pretende engravidar, ou percebe que está grávida, deve de imediato alertar o seu médico para confirmar se está a fazer medicação compatível e se a PA está devidamente controlada. Também no período de amamentação há medicamentos seguros, pelo que a mãe pode continuar a cumprir o seu tratamento sem prejudicar o bebé.

As mulheres com complicações relacionadas com a hipertensão no período da gravidez, e em especial as que tiveram um parto urgente ou emergente por causa desta doença, têm de ser seguidas atentamente dado o risco futuro acrescido de doença cardiovascular. Mesmo quando a pressão arterial normaliza no pós-parto, deve haver uma vigilância pelo menos anual com medicação da PA em consulta durante o resto da vida da mulher. Isto porque se provou que há maior risco de desenvolvimento de HTA mais tarde na vida da mulher, e maior risco também de AVC, enfarte/ doença cardíaca, doença renal, diabetes, doenças da tiroide, e mesmo maior risco de demência.

Continua ainda a haver muitas mortes atribuídas a estes eventos, em especial nos países menos desenvolvidos em que a mulher grávida é menos acompanhada. Em Portugal, apesar de nem todas as mulheres terem médico de família, mesmo não tendo um médico previamente atribuído, no momento em que engravida a mulher passa a ser acompanhada no centro de saúde com regularidade e não há razão para que estas situações descritas não possam ser prevenidas. A maioria das grávidas hipertensas são encaminhadas para uma consulta de especialidade a nível hospitalar para maior vigilância, investigação e tratamento.

Obviamente que o melhor remédio é mesmo a prevenção: um estilo de vida saudável na mulher jovem, com a vigilância médica adequada, dieta equilibrada, exercício físico moderado, evicção do tabaco e do álcool, redução do consumo de sal. Ser saudável em idade fértil e criar bons hábitos desde cedo vai reduzir francamente a probabilidade de desenvolver HTA, antes ou durante a gravidez. E caso esta seja diagnosticada antes de engravidar, deve ser devidamente medicada e vigiada.

A Hipertensão não deve ser desvalorizada em lado nenhum do mundo, seja por homem ou mulher, jovem, adulto ou idoso. Mas na mulher tem particular implicação a sua abordagem no momento tão valioso que é a gravidez e mais uma vez põe à prova a capacidade de responsabilização, força e cuidado da mulher: a forma como é cuidada a pressão arterial ao longo das várias semanas em que cresce uma vida dentro de si, vai ditar o futuro da mãe e do bebé.