A exploração espacial não é um fim em si mesmo. Ainda que o fascínio do desconhecido seja evidente e entusiasmante – e nós, Portugueses, conseguimos facilmente imaginar quanto – o que verdadeiramente interessa é o que se consegue obter do espaço com os pés na terra.

O espaço é um oceano extraterrestre, repleto de informação e dados que só podemos aproveitar se alcançarmos fronteiras tecnológicas e desenvolvermos e financiarmos tecnologias inovadoras. E as usarmos para fins relevantes como melhorar a vida diária e proteger o planeta.

Dois dos maiores desafios da transformação económica europeia têm sido tão repetidos que já são amplamente conhecidos. E fazem, exatamente, parte do que pode beneficiar desta exploração, indo mais longe. A transição verde e a transição digital são tanto um caminho para responder às alterações climáticas e à economia dos dados, como fazem parte de um processo global de cooperação e competição.

É neste contexto que se tem de perceber a aventura espacial europeia. Não se trata tanto de ter naves espaciais, foguetões impressionantes ou homens que poisam na Lua. Verdadeiramente importante é saber obter a informação útil que nos permita responder, entre outros, aos desafios climáticos com mais ciência, mais conhecimento e maiores possibilidades de inovar em produtos, serviços e tecnologias. E não depender tanto dessa ciência, tecnologia e conhecimento dos outros.

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Foi para falar sobre isso que se juntaram mais de 30 oradores internacionais na conferência Climate Science from Space, no final do mês de Abril, “em Portugal”. Ou melhor, a partir de Portugal e no âmbito da presidência portuguesa da União Europeia, mas cobrindo bem os quatro cantos do mundo.

A pergunta fundamental deste encontro era saber o que podemos aprender com a informação que se obtém a partir do espaço, a partir das infraestruturas e aplicações europeias. Que uso lhe podemos dar que contribua, precisamente, para responder às alterações climáticas. A resposta curta é: muito. Imenso. Cada vez mais.

Investigação, desenvolvimento e produção de estruturas leves de gama alta para programas espaciais e tecnologias que aprimoram motores de combustão, permitindo reduzir o consumo de combustíveis e a emissão de gases poluentes, como fazem empresas portuguesas como a Optimal Structural Solutions e a Ultimate Power. Informação útil para responder às alterações climáticas com dados e capacidade de previsão, indo das respostas em larga escala à recuperação das fundamentais dunas costeiras, passando pela proteção dos Oceanos (uma das prioridades da nossa presidência da UE e, de um modo geral, de Portugal).

Visto de longe, é provável que muitos não saibam o que tem sido feito pela Europa neste domínio. Ou quantas empresas, universidades e investigadores nacionais têm contribuído com resultados tangíveis. É pena, porque é importante e tem impacto.

Para dar uma visão rápida, nos últimos tempos foi inaugurado o Centro de Conhecimento para a Observação da Terra, que, com base em dados obtidos através do Programa Copernicus, reforçará a elaboração de políticas europeias para a preservação do ambiente e mitigação das alterações climáticas, contribuindo para a execução do Pacto Ecológico Europeu. Na Ilha de Santa Maria, nos Açores, foi inaugurada a nova antena de 15 metros, instalada na Santa Maria Tracking Station, no âmbito do acordo entre a Agência Espacial Europeia (ESA) e a República Portuguesa, que permite não só monitorar os lançadores europeus, como apoiar a Agência de Segurança Marítima Europeia (EMSA) na gestão ambiental e segurança do Atlântico. Capitalizando nestas infraestruturas, o Governo regional lidera o desenvolvimento de um Ecossistema Espacial em Santa Maria até 2026, apoiado por parceria entre a ESA e a Agência Espacial Portuguesa (Portugal Space). Ao mesmo tempo, o Conselho e o Parlamento europeu chegaram a um acordo provisório sobre a primeira Lei Europeia do Clima. E, fundamental para que haja capacidade de investimento, foi adotada a posição do Conselho sobre o programa espacial da UE para os anos de 2021-2027. Com um investimento de 14,88 mil milhões de euros, o maior orçamento de sempre, o programa espacial da UE impulsionará a economia, permitirá modernizar os programas espaciais emblemáticos da Europa, garantir o acesso autónomo da UE ao espaço e apoiar a indústria.

Tudo isto aconteceu no mesmo mês em que se realizou a conferência “Ciências do Clima a partir do Espaço: sinergias para uma economia de inovação mais verde”, organizada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior com o apoio da Comissão Europeia, no âmbito da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.

Claro que o impacto do lançamento de um foguetão, ou o imaginário de quem será o primeiro humano a pisar Marte impressiona mais. É compreensível. Mas, como em quase todas as aventuras, mais do que a emoção da descoberta, é o que aprendemos que faz a diferença e nos permite avanços tecnológicos, crescimento económico e reputação geopolítica. Sem perdermos a nossa marca universalista, é natural que queiramos que esse desafio seja especialmente europeu, com tecnologia e empresas europeias. E português, porque nos transporta para os tempos do conhecimento e da navegação marítima. É o que está a ser feito, e bem, estratégica e paulatinamente, com o esforço coletivo europeu, mas também com ciência, empresas e infraestruturas nacionais, primordiais, não só para o desenvolvimento da economia do espaço, mas particularmente para responder às alterações climáticas.

Esta conferência Ciências do clima a partir do Espaço”, testemunha a importância do oceano extraterrestre e da cascata de dados recolhidos para que os cientistas transformem em saber e engenho que protege a vida e bem-estar no planeta.