A Inteligência Artificial está a mudar a forma como os humanos pensam e tomam decisões. A prazo, afetará a forma como os humanos priorizam os processos cognitivos, modificando e adaptando a sua aprendizagem, comportamentos, treino e capacitação, bem como as suas organizações. A capacidade e velocidade no processamento de dados supera, sobremaneira, a limitação determinista da condição humana, ampliando o conhecimento do ambiente operacional e reduzindo a carga cognitiva do decisor.

Começa a ser um lugar-comum ouvir que os humanos que usam IA vão substituir os humanos que não usam IA. Ou então, na versão mais extremada, a narrativa é de que a IA vai substituir os humanos. Desta consideração, resulta evidente que a IA é incontornável na transformação do nosso modus vivendi, desafiando os líderes contemporâneos a uma realidade dual – humana e artificial – que urge conciliar.

Criar condições para que os seus (os humanos) possam competir neste âmbito híper dinâmico implica reinventar o papel e a contribuição humana, na hibridação de um sistema cognitivo integrador e inclusivo, capaz de colaborar e desafiar os companheiros/camaradas artificiais. Pilotar a utilização da IA numa organização incrementa a complexidade, aporta novos riscos, amplia os existentes e introduz questões legais e éticas. Muito provavelmente, implica, desde logo, repensar a metáfora organizacional que subsiste – da máquina à rede – ou o pensamento vigente, seja ele de pendor mais hierárquico, linear ou sistémico.

Na aclimatação organizacional à omnipresença da IA, um inibidor relevante é o efeito Einstellung, que resulta do mecanicismo e rigidez mental em que a predisposição atitudinal para resolução de um problema se foca apenas em situações similares vividas em experiências anteriores, preterindo assim a inovação, o desenho de uma solução mais eficaz, ou a adoção de melhores alternativas. A natureza humana é resistente à mudança e desconfia de uma realidade emergente, cujos contornos desconhece.

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A construção de confiança na IA afirma-se assim crucial, para que a curva de aprendizagem seja gradual e consistente. Uma confiança calibrada com adequado nível de controlo, que procure mitigar os efeitos do uso inadvertido ou mal-intencionado, mas que não coarte ou afaste eventuais melhores propostas de solução proporcionadas pela IA.

Esta mudança, na vertigem da disrupção, abala os princípios mais enraizados do empreendimento que é a organização humana. Tem de ocorrer na cultura, na estrutura e sistema organizacional, no comando, na liderança, e na edificação de um modelo mental partilhado que pacifique a relação com o ainda desconhecido. Os líderes têm de potenciar nos seus (os humanos) o pensamento crítico, a inteligência emocional, a criatividade, promover a curiosidade, a empatia, a comunicação, a colaboração, desenvolver a capacidade de adaptação, a flexibilidade cognitiva, a aprendizagem contínua, a exploração, a descoberta.

O verdadeiro potencial estratégico1 – aqui definido como o conjunto de capacidades de qualquer natureza, morais e materiais, que uma organização tem à sua disposição para, em maior ou menor escala, em função das circunstâncias, utilizar em apoio da sua estratégia – reside nas pessoas e nas suas qualidades humanas únicas.

1 Definição adaptada do conceito de PE nas Relações Internacionais.