A figura do arquiteto enquanto profissional liberal, que outrora habitava o espaço da criação solitária, encontra-se hoje perdida entre a engrenagem da burocracia e a teia da legislação. O arquiteto independente, tal como tantos outros profissionais liberais, enfrenta um mundo onde o sonho do traço livre se vê ensombrado por exigências técnicas e legislativas, tornando o que era uma profissão de alma numa luta incessante contra o sistema.

Tal como em tantas outras áreas, muitos profissionais independentes sucumbiram ao chamamento das grandes empresas. O que era um ofício de autonomia, de expressão única, vê-se progressivamente absorvido por entidades maiores, que oferecem segurança financeira e o apoio que o mercado exige. A recompensa é clara: a estabilidade. Mas a que custo? A individualidade perde-se, o traço pessoal dilui-se na coletividade, e a obra, que antes era reflexo de um só olhar, torna-se uma peça numa engrenagem maior, mais eficiente, mas menos singular.

Claro que não é necessariamente mau. A integração em estruturas maiores oferece recursos, permite sonhos mais ambiciosos, projetos que escapam ao alcance do trabalhador isolado. E, no entanto, neste movimento para a integração, perde-se algo. Como alguém disse, “Deus está no pormenor”. E é precisamente nesse pormenor que reside a alma da arquitetura. Quando o detalhe se uniformiza, o espírito individual esvai-se.

Será este o caminho inevitável? Talvez. Mas é um caminho que nos deve fazer pensar. O arquiteto, o verdadeiro arquiteto, não é apenas um técnico. É um poeta do espaço, um pensador de linhas e formas. É preciso que a profissão liberal continue a ser um lugar de liberdade, onde o detalhe não seja sacrificado em nome da eficiência, onde a alma de cada projeto ainda possa refletir a individualidade do seu criador.

No fundo, como em tudo na vida, trata-se de um equilíbrio delicado. Nem a total independência, que deixa o arquiteto perdido no caos legislativo, nem a total integração, que o esvazia da sua essência. Precisamos de proteger o espaço do profissional liberal, de garantir que o mercado não o esmaga com as suas exigências, e que a criatividade possa ainda fluir, livre e sem medo de ser diferente.

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