Os números são cruéis, mas não retratam integralmente a realidade na Saúde em Portugal. No último ano registaram-se no nosso País 1.632 episódios de violência contra profissionais de saúde. Quase cinco casos por dia. Nunca como em 2022 tantos casos foram reportados na plataforma Notifica, um sistema destinado à notificação e gestão de incidentes ocorridos no Sistema de Saúde, no qual o cidadão ou o profissional de saúde podem reportar situações relacionadas com a segurança do doente na prestação de cuidados de saúde.
São 1.632 casos que nos deviam fazer corar de vergonha, uma vez que são cometidos, desde logo, contra profissionais de saúde em particular os enfermeiros que diariamente dão o seu melhor para cuidar dos portugueses e da sua Saúde.
São, na verdade, mais 1.632 razões para reforçar o apelo que mais de 32 mil pessoas fizeram aos deputados da Nação para que sejam agravadas as consequências das agressões cometidas contra qualquer funcionário público no exercício das suas funções e que as mesmas, quando exercidas sobre profissionais de Saúde, sejam consideradas crime público.
Há um ano, e após mais um caso de agressão a um enfermeiro do Hospital de Vila Nova de Famalicão, o Sindicato dos Enfermeiros lançou uma petição a exigir o reconhecimento da Enfermagem como profissão de Alto Risco e de Desgaste Rápido e a simplificação da concretização da queixa-crime aquando de agressões a profissionais de saúde.
Todos sabemos que os enfermeiros estão – e têm estado – na linha da frente no atendimento à população. Muitas vezes em contextos de grande tensão, como são os serviços de urgência, onde há sempre um maior nervosismo, inerente ao estado de saúde fragilizado de quem ali recorre.
A tipificação destas agressões como crime público retira dos profissionais de Saúde o ónus de ter de formalizar a denúncia deste tipo de situações. Até aqui, se um enfermeiro for agredido em contexto de trabalho tem forçosamente de formalizar a queixa junto das autoridades de segurança. O que, bem sabemos, muitas vezes acabam por não fazer por temerem represálias por parte dos agressores e, não raramente, das próprias famílias.
Depois de um abrandamento durante os anos da pandemia, as notificações de agressões a profissionais de Saúde têm vindo a aumentar, novamente, nos últimos dois anos. É fundamental que o Governo reconheça a perigosidade e risco da nossa profissão, além do seu desgaste rápido. E que tenha a coragem de modificar a tipificação deste tipo de crimes, para que as agressões aos profissionais de saúde possam ser alvo de queixa de qualquer pessoa, incluindo a entidade laboral destes profissionais.
Um passo que pode ser dado a partir da petição lançada pelo SE a 22 de fevereiro do ano passado e que rapidamente se tornou na maior petição de sempre na área da saúde, tendo sido entregue na Assembleia da República em julho passado.
Continuamos a aguardar que a mesma seja discutida pelos deputados. Mas a verdade é que, até que tal aconteça, é fulcral que sejam criadas condições de segurança, para que os profissionais de Saúde possam desenvolver o seu trabalho sem terem de estar preocupados com este tipo de situações. Sobretudo no Serviço de Urgência, uma área onde a pressão e a complexidade dos casos tratados são sempre maiores e mais exigentes, onde se necessita que os profissionais estejam focados no seu trabalho.
Custa assim tanto proteger aqueles que têm por missão cuidar de nós?