A urina humana pode ser utilizada para produzir fertilizantes ou eletricidade. A valorização dos nutrientes presentes na urina, como o azoto e o fósforo, é o objetivo do projeto europeu “Value from Urine” coordenado pelo Centre of Excellence for Sustainable Water Technology (WETSUS), na Holanda. Ainda faltam dois anos para o final do projeto, mas a Agência Espacial Europeia (ESA) já mostrou que tem interesse em integrar, nas suas instalações, a tecnologia desenvolvida.

O saneamento doméstico dos países ocidentais mistura todos os resíduos, sejam eles mais ou menos poluentes, aumentando o custo do transporte até às estações de tratamento. Separar as águas residuais, como se faz com o lixo doméstico, permite valorizar alguns dos componentes, nomeadamente a urina, como explica ao Observador Madalena Alves, investigadora no Centro de Engenharia Biológica da Universidade do Minho e coordenadora do projeto em Portugal.

Na sanita podemos ter urina e fezes, que produzem dois tipos de resíduos diferentes. Enquanto as fezes podem ser misturadas com as águas resultantes do lava-loiça e as águas das máquinas de lavar roupa ou loiça, a urina pode ser valorizada. E quanto menos diluída melhor. Os sistemas de saneamento descentralizado não misturam todos os efluentes como os sistemas tradicionais: reutilizam a água dos banhos e do lavatório no autoclismo e separam a urina das fezes em sanitas com dois compartimentos. Além disso, estas sanitas especiais usam um sistema de vácuo reduzindo a quantidade de água usada na descarga, diminuindo também a diluição da urina.

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Saneamento descentralizado: a água do banho é usada no autoclismo e a urina é separada dos restantes efluentes – Universidade do Minho

Este tipo de saneamento descentralizado já está a ser usado num condomínio privado com 200 casas na Holanda. Um dos edifícios da autoridade holandesa que gere os recursos hídricos e o saneamento também tem em teste uma sanita com compartimentos diferenciados ligada a uma célula microbiana de fluxo – um reator que usa bactérias e urina para produzir eletricidade -, conta a investigadora. Quando as bactérias decompõem a matéria orgânica (neste caso urina) produzem eletrões que são transferidos para o ânodo. Os eletrões passam do ânodo (polo negativo) para o cátodo (polo positivo) através de um circuito elétrico à semelhança do que acontece com uma pilha. Desta forma é possível produzir eletricidade a partir da urina.

Este tipo de tecnologia será mais valorizado em locais sem redes de esgotos e sem redes elétricas. A ESA, que tem equipas a trabalhar em zonas remotas, já se mostrou interessada no projeto por poder vir a suprir as necessidades energéticas e de fertilizantes nestes locais. Para começar vai instalar o sistema de saneamento descentralizado na sede da agência.

O consórcio junta, além da Universidade do Minho como parceiro universitário, várias empresas europeias que serão responsáveis pela produção dos elétrodos, pela avaliação económica do projeto, pelo sistema de saneamento descentralizado e pela comercialização do produto final. Por agora, o projeto procura aumentar a eficiência e reduzir os custos da tecnologia. “É preciso baixar os custos de produção dos fertilizantes para se tornarem competitivos no mercado”, afirma Madalena Alves.

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