Médicos que chegam a Portugal oriundos de países fora da União Europeia queixam-se das dificuldades que lhes são impostas para além do previsto e de pelo menos metade chumbar no exame de equivalência.

Vários profissionais disseram à agência Lusa que, no exame, que este ano se realizou no início de junho, os médicos são confrontados com perguntas relativas a especialidades médicas, que lhes obrigam a ter um conhecimento mais profundo de problemas que, enquanto médicos de clínica geral e familiar, não têm a obrigação de ter.

“No ano passado, apareceram-me muitas perguntas de oncologia e não consegui responder, apesar de ter formação nessa área, porque não são para o nível de um médico de clínica geral e familiar”, contou à agência Lusa Vivian Cabral, uma cubana a residir há um ano e meio e a tentar exercer em Portugal.

“A mim saíram-me perguntas de cirurgia que só um cirurgião sabe responder”, exemplificou por sua vez o cubano Ernesto Tase Hart.

A mesma opinião é partilhada também pela angolana Engrácia Costa e pelo guineense Rui Sambu.

Apesar das várias tentativas pela Lusa, o Ministério da Ciência e do Ensino Superior não deu quaisquer esclarecimentos.

Os médicos ouvidos pela Lusa apontam ainda como dificuldades a falta de estágios e de um programa de estudo de orientação para o exame, assim como a não uniformidade de critérios na avaliação da prova por parte das universidades.

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“Existe falta de transparência porque as universidades não fizeram todas o exame ao mesmo tempo”, como estipula o regulamento, acrescenta Engrácia Costa.

Vivian Cabral já se submeteu duas vezes ao exame, a última das quais este ano na Universidade Nova de Lisboa e conta que, dos 80 examinandos, “mais de metade chumbou” e ela foi um dos casos.

“Portugal tem falta de médicos e fecham-nos as portas. Alguma coisa está a acontecer para mais de metade [dos candidatos] chumbarem”, afirma Vivian Cabral, que vai trabalhando como cuidadora de pessoas com cancro.

Ernesto Tase Hart, médico há dez anos e a viver desde há quatro em Portugal, e Engrácia Costa, médica há quatro anos e desde há um ano a residir no país, foram dois dos 50 profissionais a realizar este ano o exame na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.

Ambos se mostram “intrigados” pelo facto de mais de metade ter também reprovado.

Enquanto não consegue exercer medicina em Portugal, Ernesto Tase Hart vive do trabalho como auxiliar em lares de idosos e do negócio de venda e aluguer de imóveis.

Engrácia Costa depende economicamente do marido, que ficou em Angola.

Rui Sambu, que está desde 2007 em Portugal, chumbou duas vezes no exame, a primeira das quais em 2009 na Universidade de Coimbra e a segunda em 2014 na Universidade Nova de Lisboa.

O guineense trabalha como auxiliar de apoio domiciliário e como vigilante, enquanto não consegue ser médico em Portugal. Também a esposa é médica e reprovou no exame.

Confrontado também pela Lusa, o Ministério da Saúde remeteu as respostas para a Administração Central do Sistema de Saúde, que apenas se limitou a esclarecer que, em dezembro de 2016, existiam 1300 médicos estrangeiros a exercer em Portugal no Serviço Nacional de Saúde (SNS), cerca de 4,71% do total dos médicos.

Destes, 626 eram oriundos de países fora da União Europeia.

Além destes, existem 23 médicos cubanos que se encontram a exercer funções no SNS, ao abrigo de um Acordo com o Estado cubano.

Para exercerem em Portugal, os médicos oriundos de países fora da União Europeia são obrigados a ter residência em Portugal e a submeter um processo de reconhecimento de competências, em que têm de obter em Portugal equivalência aos seus cursos e prestarem provas antes de se escreverem na Ordem dos Médicos.