O Ministério Público pediu, esta quinta-feira, pena máxima de 25 anos para Pedro Dias pelos homicídio na forma consumada do militar da GNR Carlos Caetano e do casal Liliane e Luís Pinto, bem como do homicídio na forma tentada do militar António Ferreira.

“Entendemos que, por cada um dos crimes de homicídio, deve ser condenado em penas parcelares próxima da moldura máxima”, afirmou a procuradora, esta quinta-feira em tribunal.

O MP deixou, contudo, cair o crime de homicídio na forma tentada de Lídia da Conceição, mulher sequestrada em Moldes, considerando que se tratou antes de um crime à integridade física.

“O arguido atentou contra a vida de quatro pessoas“, afirmou a procuradora, referindo que o militar António Ferreira só não “perdeu a vida por circunstâncias alheias à vontade do arguido”. “A vida que António Ferreira tinha antes, em função das lesões produzidas pelo disparo do arguido, nunca mais será a mesma.”

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O Ministério Público destacou ainda o facto de as quatro vítimas serem “jovens”. “Gente com ambição, com arte e com engenho para conquistar o mundo”, afirmou a procuradora, acrescentando que foram “surpreendidas pelo arguido de forma brutal”. “Duas vítimas quando cumpriam a nobre missão de defender o seu semelhante e outros dois que queriam cumprir um sonho.”

“A morte do um ser humano é sempre uma tragédia, mas [aqui] é muito maior.”

O Ministério Público destacou ainda as razões “mesquinhas” que levaram o arguido a cometer os crimes. No caso dos dois militares, porque não queria que lhe fosse feita “uma revista pessoal” e que fosse “descoberta a arma” e no caso do casal Pinto porque precisava do carro para se deslocar.

A procuradora considerou ainda a versão dos factos apresentada por Pedro Dias, esta manhã, “absolutamente incoerente e inconsistente“. “Não encontra qualquer apoio na prova que foi anteriormente produzida”, defendeu a procuradora, acrescentando que estas declarações “não põem em causa qualquer elemento de prova produzido em tribunal”.

“Esta narrativa do arguido tem tanto de infame como de inconsequente em termos processuais. A procuradora referiu ainda que o arguido “não mostrou qualquer arrependimento, qualquer respeito” pelos “pais que perderam os filhos” bem como pelas vítimas que sobreviveram, “mas que perderam a vida que tinham”.

Relativamente aos factos que ocorreram no hotel em construção nas Caldas da Cavaca, a procuradora afirmou Pedro Dias teve “a percepção” de que lhe seria feita uma “fiscalização pessoal”, levando à descoberta da arma para a qual não tinha licença, e que isso motivou o seu comportamento, nomeadamente o disparo contra o militar da GNR Carlos Caetano.

“Não há margem para qualquer dúvida de que o arguido matou Carlos Caetano para que não lhe fosse feita uma revista pessoal. Não há indícios de que tenha havido luta“, adiantou a procuradora, referindo-se ao relato de Pedro Dias, que disse ter sido agredido pelo militar Caetano.

A procuradora contestou ainda a versão contada por Pedro Dias, em que afirmou que o casal Liliane e Luís Pinto foram mortos pelo militar da GNR António. De acordo com a própria, os “indícios” recolhidos no local onde António Ferreira “permitem concluir” que o militar foi baleado entre as 5h07 e as 5h12. Ora, a essa hora, o casal ainda estava em casa.

É inquestionável que a morte dos civis ocorreu seguramente depois de o militar Caetano e de o militar Ferreira serem alvejados, portanto a versão do arguido cai por terra”, afirmou a procuradora, baseando-se nas provas recolhidas no local do crimes, os testemunhos ouvidos em tribunal e as declarações e o relatório da médica legista. Como Pedro Dias “não quis regressar ao local onde tudo tinha começado com o carro patrulha”, continuou a procuradora, matou o casal Pinto e usou o carro deles para regressar ao local onde tinha assassinado Carlos Caetano.

Relativamente aos acontecimentos na casa de Moldes, onde Lídia da Conceição e António Duarte foram sequestrados, o Ministério Publico considerou que os factos não se passaram “da forma leve e serena” como António Duarte relatou no seu testemunho e recordou que foram encontrados vestígios de sangue nas roupas de Pedro Dias, posteriormente descobertas no carro de António Duarte. Ainda assim, considerou que o crime de homicídio na forma tentada de Lídia da Conceição deveria “ser resumido a cime à ofensa da integridade física”

Quanto à investigação, a procuradora considerou que é “inegável” de que se trata de uma investigação “rigorosa”. “Este processo é mesmo um excelente exemplo do que pode ser uma investigação“, afirmou a procuradora, acrescentando que houve “desde logo” uma “especial atenção” na recolha da prova. Tudo isto, considerou, permite “formar um juízo robusto” quanto à pratica dos crimes dos parte do arguido.

Pedro Proença: declarações do arguido são “homicídio ao carácter das vítimas”

Nas alegações finais, Pedro Proença, advogado do militar António Ferreira e dos pais do GNR Carlos Caetano, subscreveu grande parte do que foi dito pela procuradora e também pediu a pena máxima para o arguido. Considerou que, com as declarações do arguido, houve um “homicídio ao carácter das vítimas”, “ao seu bom nome” e que se tratou de um “momento próximo da infâmia e do insulto às vítimas”.

“O que ouvi hoje deu-me vontade de perguntar ao arguido se acha que os demais intervenientes deste processo são burros, ao ponto de darem alguma credibilidade a esta versão dos factos”, afirmou Pedro Proença.

Para o advogado, o arguido antecipou que ia ser revistado e que os militares iriam encontrar a arma que tinha carro. Algo que poderia pôr em causa a guarda filha mais velha, que tinha conseguido dias antes dos crimes, logo “a solução” foi matar os GNR.

O advogado referiu-se ainda aos problemas médicos que o arguido diz ter, em particular ao nível das costas — durante o julgamento, o juiz até deu autorização a Pedro Dias para se levar, caso precisasse, devido ao seu problema nas costa. Tendo em conta estes problemas de saúde e o facto de o arguido ter relato agressões por parte do militar Carlos Caetano, Pedro Proença questionou como é possível “que um homem que sofre dos problemas que sofre, depois de levar a tareia que levou, poucas horas depois passeia no Lidl [supermercado em São Pedro do Sul onde as imagens de videovigilância mostram Pedro Dias] sem qualquer sintoma de ter sido agredido.”

E recordou ainda o testemunho da antiga companheira, com quem o arguido esteve na manhã seguinte aos crimes e a quem pediu para dizer que tinham passado a noite juntos. Ana Cristina Laurentino disse não ter detetado “qualquer ferimento, qualquer lesão significativa” no arguido.”Isto é completamente implausível“, considerou.

Pedro Proença destacou outras incoerências na versão apresentada por Pedro Dias, nomeadamente o facto de o casal Pinto ter sido assassinado pelo militar António Ferreira. “Tendo por consideração o facto de o guarda Ferreira ter estado sem consciência por tempo indeterminado e que depois de ter baleado o militar, o arguido esteve vários minutos a pensar se tirava a vida ou não, era impossível cronologicamente que o guarda Ferreira tenha sido baleado depois de Liliane e Luís Pinto.”

O advogado referiu ainda que não há qualquer explicação para, segundo contou Pedro Dias, o casal ter parado o seu carro junto ao da patrulha da GNR, quando ia a caminha de Coimbra para uma consulta. “Para quê? Porquê? Há algum contacto do senhor Luís para o 112? Alguém faria isso àquela hora da manhã? Não tem qualquer plausibilidade.” Para Pedro Proença, Pedro Dias matou o casal para poder ficar com o carro, mas também para “dificultar a percepção dos crimes”.

O advogado sublinhou também a “postura extremamente calculista” do arguido durante todo o julgamento, em que passou todo o tempo a tirar apontamentos enquanto se ouviam as testemunhas. Para Pedro Proença, Pedro Dias esteve “impávido e sereno” e “alheado a tomar apontamentos”, considerando que esta postura do arguido, “potenciada por estas declarações”, revela “um perfil autocentrado” e  uma “incapacidade total de estabelecer laços, ou pelo menos empatia com outras pessoas”.

Tal como a procuradora, o advogado considerou que há um “padrão” nestes crimes: as vítimas foram todas “abatidas a tiro”, um “tiro à queima roupa na face”. E o facto de apenas Liliane não apresentar os mesmos ferimentos demonstra, para Pedro Proença, mais uma inconsistência no discurso de Pedro Dias. O advogado afirmou que Liliane não tem ferimentos de bala na cara porque foi atingida enquanto arrastava o corpo do marido e se efetivamente tivesse sido o militar Ferreira a disparar a arma a tão curta distância, os disparos teriam sido certeiros, o que não aconteceu. Isso revela que a pessoa que disparou a arma não está habituada a lidar com a mesma, tendo sido por isso disparada por Pedro Dias e não pelo GNR, como relatou o arguido. “O arguido dá dois tiros e não acertam no sítio onde queria, queria atingir a cabeça da vitima. Um militar com treino, a 50 centímetros [de distância], não falha.”

E se o arguido não tivesse cometido os crimes como airma, a primeira coisa que faria era pedir ajuda, considerou ainda Pedro Proença. “Alguém que está na situação desesperante que diz que estava, o que faz é pedir ajuda, é partilhar, é contar. Não é ter todo um comportamento que indicia culpa na pratica destes factos.”

“Este caso merece uma pena máxima para o arguido porque só assim se fará justiça.”