Escreve Abel Matos Santos no Observador de 23 de Novembro um artigo em que sou visado directamente, com o título “Pode um psicólogo assim ser bastonário da Ordem dos Psicólogos?. Entendo que é importante que o “psicólogo assim” tenha oportunidade de resposta.

Assim, fico surpreendido que de uma só penada ignore as posições sobre este assunto de organizações de psicologia e de outras profissões, começando pela posição da mais prestigiada organização de psicologia, a American Psychological Association, que tanto trabalho tem desenvolvido em prol da nossa ciência e que refere explicitamente “Treatments that are based on the assumption that homosexuality or same-sex sexual attractions are a mental disorder or based on inaccurate stereotypes regarding LGB people are to be avoided because they run counter to empirical data and because reports of harm suggest that such treatments can reinforce restricting stereotypes, increase internalized stigma, and limit a client’s development” (Report of APA Task Force on Appropriate Therapeutic Responses to Sexual Orientation)

Assim, e no mesmo sentido vão as posições da British Psychological Society, American Academy of Pediatrics, American Psychiatric Association, American Medical Association ou da Pan American Health Organisation, um ramo da Organização Mundial de Saúde que conclui “Services that purport to “cure” people with non-heterosexual sexual orientation lack medical justification and represent a serious threat to the health and well-being of affected people”, só para citar algumas. Talvez estes consensos não cheguem para o colega, reflectindo os estudos e a apreciação apurada e prolongada dos seus resultados.

Assim, fico surpreendido que confunda consenso com unanimidade. Em nenhum assunto de ciência existe unanimidade, mas existem consensos importantes que determinam as práticas dentro de cada época. E estão bem expressos nas posições de profissionais relevantes e associações e sociedades científicas que se debruçaram sobre estes assuntos,

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Assim, percebo o quanto acha que o bastonário perante o elevado número de manifestações e reclamações de profissionais e cidadãos, e perante uma flagrante contradição das declarações de um membro da Ordem com o que entendo serem os deveres profissionais, se devesse calar sem se demarcar das interpretações que estavam a ser feitas. Como seria interpretado esse silêncio?

Assim, rejeito a manipulação das comparações fáceis com nazis, soviéticos e outros tipos de práticas ditatoriais, que se distinguiram principalmente por perseguirem e eliminarem todos os que consideravam degenerados (como os homossexuais, pessoas de etnia cigana e outros). Todos temos um passado e posições que nos trouxeram até hoje, e o que escrevemos é o resultado do desenvolvimento desse pensamento, e não mero circunstancialismo de ocasião. Vê-se que não me conhece nem ao meu passado.

Assim, percebo a conta em que tem os seus colegas do Conselho Jurisdicional que, repito, para que fique cada vez mais claro, são eleitos e funcionam independentemente da Direcção e de outros órgãos da Ordem. Cinco colegas que seriam tão influenciáveis pelo que o bastonário poderia ter ou não dito, que não necessitariam de julgar o caso, bastando-lhes passar a respectiva sanção, que já estava pré-determinada. Talvez seja a sua visão de como deve funcionar um Conselho Jurisdicional, não é certamente a minha, e tenho como exemplo os seis anos de convivência correcta e independente com o Conselho Jurisdicional, no respeito pelos Estatutos da Ordem.

É verdade que um psicólogo assim pode ser bastonário da Ordem dos Psicólogos. E que depois de mais de 30 anos de ensino universitário, investigação e prática clínica, tendo sido fundador da Ordem e por duas vezes eleito pelos seus pares para ser bastonário, me assiste a legitimidade de me pronunciar sobre diversas situações no âmbito da psicologia, deixando aos respectivos órgãos o exercício em liberdade das suas funções.

Assim, espero que continuemos a fazer avançar a psicologia, como ciência e prática, elegendo o dever de beneficência e de não-maleficência – como está no nosso Código Deontológico – na nossa maior aspiração para a acção.

Assim.

Bastonário da Ordem dos Psicólogos Portugueses