1. A esmagadora maioria das propostas em torno do Orçamento de Estado de 2018 são, quer à esquerda quer à direita do PS, no sentido de agravar o défice das contas públicas em relação àquilo que é o anunciado objetivo governamental (um por cento). Fora do governo olha-se muito para o amanhã, para cada um dos sectores profissionais que vivem do orçamento, mas esquece-se o objetivo de médio prazo. Não é nada de novo, tem sido a história das nossas finanças públicas. É fácil culpar a “classe política” por este “curto-termismo”, mas diga-se em abono da verdade que ele apenas reflete aquilo que os cidadãos, e as empresas, estão a fazer. Portugal é, dos países europeus, um daqueles em que a taxa de poupança é mais baixa, mesmo quando os rendimentos das famílias aumentam. As baixas taxas de juro podem explicar parcialmente uma tendência para o decréscimo da poupança, mas não explicam que, com semelhantes taxas, a poupança em Portugal seja muito inferior à de congéneres europeus. Está tudo de certa maneira ligado. Somos relativamente mais pobres que outros países, temos porventura uma maior aversão ao risco e a aplicações no mercado de capitais, por natureza mais volátil, e quando as remunerações de depósitos ou de ativos com pouco risco é baixa, gastamos e não poupamos. Esta a racionalidade económica individual, compreensível, mas que já nos trouxe problemas no passado e que poderá voltar a trazer no futuro se não tomarmos as devidas cautelas. Tem de ser um desígnio económico nacional aumentar a taxa de poupança e se o mercado aqui falha, pois sobrevaloriza o consumo presente em relação ao consumo futuro, cabe em particular ao Estado tentar colmatar essa falha para o qual pode implementar várias políticas das quais saliento quatro. Desenvolver, em parceria com a sociedade civil, programas de literacia económica e financeira que mostre a importância da poupança. Reforçar os instrumentos públicos já existentes para reforçar a poupança voluntária de capitalização individual, quer associada à reforma (regime público de capitalização da segurança social associado ao fundo dos certificados de reforma/FCR), quer a uma eventual cessação do contrato de trabalho (fundo de compensação do trabalho/FCT). Repensar a possibilidade de reintroduzir benefícios fiscais moderados (dado o seu carácter regressivo) nas aplicações poupança-reforma. Finalmente, colocando no mercado, através do IGCP produtos suficientemente atrativos para canalizar as poupanças dos portugueses (digamos que os últimos deixam algo a desejar…). Importa fazer um balanço da experiência com os fundos de capitalização referidos. Lendo o Relatório destes fundos (último disponível de 2015), ficamos com a sensação que não tem havido vontade política para desenvolver o FCR, que está numa certa letargia (com apenas 7618 aderentes!), mas que o FCT tem tido sucesso dado o diferente enquadramento legal envolvendo trabalhadores e empresas. Há, decerto, muito a fazer neste campo e o Estado não se pode demitir das suas responsabilidades.
2. Devemos olhar para o OE2018 a pensar em 2020. Dir-se-á que há muita coisa incerta no horizonte. Não sabemos como evoluirá a União Europeia, desconhecemos quem será o futuro líder da oposição em 2018, quais os resultados das legislativas em 2019 e que solução governativa emergirá delas, o que acontecerá ao preço do petróleo e se a Coreia do Norte despoletará um incidente a desestabilizar a região e o mundo. Com tantas incertezas, para quê olhar para 2020? Acontece que também há algumas certezas e elas são suficientes para olharmos para elas. A primeira é que em 2019 Mario Draghi, sairá do BCE e não sabemos quem se lhe seguirá. Lembremo-nos que Draghi assegurou a sobrevivência do euro, e que tem sido o responsável pela política monetária do BCE que, não sendo a ideal para Portugal, nos tem ajudado. A segunda é que Portugal vai ter um pico nas suas necessidades de financiamento em 2021, pelo que o IGCP já antecipa a necessidade de aumentar sobremaneira a “almofada financeira” do Estado em 2020. Isto é, vamos aos mercados financiarmo-nos numa quantidade apreciável. Incerto, mas provável, é a subida das taxas de juro à medida que o Banco Central Europeu diminuir o montante de compra mensal de ativos o que acontecerá já em 2018. Ou seja, já sabemos hoje que provavelmente haverá uma subida da despesa com juros, mesmo assumindo que haverá uma descida do peso da dívida bruta e líquida no produto. A União Europeia desenvolveu uma trama complexa de regras orçamentais (no PEC, “six pack”, “two pack”, Tratado Orçamental) que podemos aproximar com duas simples regras. Até que se atinja o défice desejado não pode haver redução significativa do nível de fiscalidade. Adicionalmente, o crescimento da despesa em prestações sociais e em pessoal deve ser inferior ao crescimento do PIB nominal. A dificuldade desta segunda parte da legislatura é que é difícil discutir um OE a pensar em 2020, ou discutir o impacto do descongelamento de carreiras num dado sector, a pensar no impacto macroeconómico que ele terá. Uma coisa é certa, o ganho reputacional do país que está a ser conseguido pela redução do défice e do peso da dívida implica manter uma trajetória de consolidação orçamental. Também com o novo quadro comunitário, preparemo-nos já para 2020.