Mais de mil médicos dentistas portugueses estão a trabalhar no estrangeiro, um aumento de 45% desde o início da crise económica, em 2008, segundo dados de 2014 da Ordem que representa estes profissionais. “O destino dos jovens dentistas portugueses é o desemprego ou a emigração”, lamenta o bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas, Orlando Monteiro da Silva, em declarações à agência Lusa.

Esta é uma tendência que se tem agravado todos os anos e que tem a crise económica como pano de fundo de “um caldeirão” onde também o excesso de médicos dentistas e de cursos de medicina dentária contribui para esta realidade. A par disto, Monteiro da Silva lembra que em Portugal não existe uma convenção do Serviço Nacional de Saúde com os médicos dentistas, o que faz com que a medicina dentária praticamente só exista para quem pode recorrer ao privado.

“Estou mais preocupado até com o impacto que a crise está a ter na saúde oral dos portugueses. Não tendo uma resposta da parte do Estado, através de uma convenção nacional, deixam de tratar da sua boca e dos seus dentes e isto tem um impacto na saúde geral das pessoas”, afirmou. Para o bastonário, é urgente tomar medidas no sentido de assegurar que os portugueses tenham direito a cuidados de medicina dentária. O responsável lembra que na Madeira e nos Açores já há mecanismos de reembolso previstos para os utentes que recorrem a tratamentos privados de saúde oral.

Segundo os dados revelados esta quinta feira à Lusa pela Ordem, dos 8.147 médicos inscritos, mais de mil já tiveram de procurar emprego noutro país. A maioria (65%) dos que exerce lá foram trabalha em Inglaterra, surgindo França como o segundo destino. Mais de metade dos médicos dentistas emigrados tem entre 26 e 40 anos.

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Contudo, o número de médicos inscritos na Ordem dos Dentistas não tem parado de crescer nos últimos 10 anos, à medida que crescem o número de cursos: há sete faculdades portuguesas com 3.000 alunos inscritos em dentária. Aliás, atualmente há em Portugal um médico dentista para cada 1.296 habitantes, quando o rácio recomendado pela Organização Mundial da Saúde é de um por cada 1.800 a 2.000 habitantes.

Bastonário defende que o Estado pode e deve criar “mecanismos de estímulo” para atrair médicos dentistas a instalarem-se em “zonas com muito pouca ou mesmo sem cobertura”.

Apesar disso, mais de 150 mil pessoas em 30 concelhos portugueses vivem sem dentista, segundo dados oficiais da Ordem dos Médicos Dentistas, que admite uma distribuição de profissionais “demasiado acumulada nas zonas do litoral”.

“São concelhos pequenos, relativamente despovoados, fundamentalmente do interior do país. São regiões que estão numa desertificação crescente e que têm dificuldade em atrair médicos dentistas e concelhos com uma população muito baixa”, especificou Orlando Monteiro da Silva em declarações à agência Lusa. “Como não existem praticamente dentistas nos hospitais ou nos centros de saúde temos o problema de ter muita gente que não tem capacidade económica de aceder ao dentista na medicina privada”, acrescentou.

O bastonário defende que o Estado pode e deve criar “mecanismos de estímulo” para atrair médicos dentistas a instalarem-se em “zonas com muito pouca ou mesmo sem cobertura”, lembrando que as câmaras municipais “também têm o seu papel”. “É fundamental que o Governo, o Estado, estude fórmulas de selecionar alguns tratamentos fundamentais para ajudar as pessoas a terem acesso à medicina dentária”, defendeu.

Os últimos indicadores avaliados mostram uma melhoria na saúde oral dos portugueses que estão abrangidos pelo programa dos cheques dentista, como as crianças e as grávias. No entanto, Monteiro da Silva avisa que a generalidade da população tem sentido o impacto da crise ao nível da saúde oral e que pode mesmo haver um “retrocesso grave”.

Alcoutim, Aljustrel, Alvito, Arraiolos, Barrancos, Chamusca, Corvo (Açores), Figueiró dos Vinhos, Freixo de Espada à Cinta, Gavião, Marvão, Nisa, Oleiros, Ourique, Penamacor, Viana do Alentejo ou Vila Velha de Ródão são alguns dos concelhos sem dentistas registados.