A direção-geral do Património Cultural (DGPC) determinou o arquivamento da classificação das 85 obras de Joan Miró, provenientes da coleção do antigo Banco Português de Negócios (ex-BPN), mas isso não significa que o leilão dos quadros que foi cancelado no ano passado se possa já realizar.

Os dois anúncios com o despacho de arquivamento foram assinados pelo diretor-geral do Património Cultural, Nuno Vassalo e Silva, a 19 de agosto, e abrangem as 13 obras de Miró pertencentes à Parups e as 72, propriedade da Parvalorem.

O arquivamento do processo verifica-se cerca de uma semana depois de, a 11 de agosto, as duas sociedades proprietárias dos quadros de Miró terem informado a DGPC de que não reconheciam interesse na sua classificação, no âmbito do processo aberto no passado mês de julho, por decisão do secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier.

O secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, solicitara à DGPC, a 22 de julho, a abertura do processo de classificação e inventariação das 85 obras de Joan Miró na posse do Estado.

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De acordo com uma nota de imprensa do gabinete do secretário de Estado da Cultura, então divulgada, esta decisão do governante surgiu “na sequência da decisão judicial do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa” (TACL), relacionada com as providências cautelares apresentadas pela Procuradoria-Geral da República, sobre a exportação dos quadros.

A não classificação, contudo, não significa que as obras possam ir agora a leilão. Isto, porque ainda decorre o processo judicial, no qual o Ministério Público alega que as obras estão em Portugal há mais de dez anos e têm que ser classificadas, não podendo sair do país. A leiloeira Christie’s, que já cancelou por duas vezes um leilão destes quadros, tem dito que enquanto houver dúvidas jurídicas não quer fazer nova tentativa de venda.

Carlos Cabral Nunes, o primeiro peticionário de uma iniciativa que chegou a ser discutida no Parlamento e que pedia a manutenção dos quadros em Portugal, afirmou ao Observador que, este mês, a secretaria de Estado da Cultura, “apenas tentou sacudir a água do capote”, remetendo para a Parvalorem e a Parups o ónus de recusar a classificação.

Segundo Cabral Nunes, o processo dos Miró está longe de chegar ao fim pois ainda decorre o processo judicial, que vai determinar se os quadros estão ou não há mais de dez anos em Portugal. As duas empresas proprietárias alegam que algumas licenças de importação das obras foram pagas em outubro de 2004, ou seja, tinham nove anos quando foi marcado o primeiro leilão.

Carlos Cabral Nunes, que é diretor artístico da Perve Galeria, lamenta ainda que os quadros continuem sem ser expostos, “o que beneficiaria muito todas as pessoas” e revela que a Fundação Berardo disponibilizou-se para exibir os quadros, revertendo a receita da exposição para o Estado. Segundo adiantou , já foi pedida autorização ao Ministério Público para que os quadros fossem expostos e este não se opôs. Os quadros estão atualmente guardados no depósito da Caixa Geral de Depósitos.

As 85 obras de Joan Miró (1893-1983) – 13 obras pertencentes à Parups e 72 à Parvalorem – estão na posse destas sociedades anónimas de capitais públicos, criadas pelo Estado em 2010, para gerir os ativos e recuperar os créditos do ex-Banco Português de Negócios (BPN), nacionalizado em 2008.

As empresas tentaram este ano, por duas vezes, realizar um leilão, em Londres, através da Christie’s, mas foi sempre cancelado, devido a sucessivas providências cautelares e a uma ação principal, interpostas pelo Ministério Público contra a saída do país, e aceites pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa (TACL).

Segundo a Lei de Bases do Património Cultural, de 2001, “salvo acordo do proprietário, é vedada a classificação como de interesse nacional ou de interesse público do bem nos dez anos seguintes à importação ou admissão”.