O “salto no tempo” remonta a 1972, ano em que foi lançado o documentário “Pink Floyd: Live at Pompeii”, e realiza-se poucos dias antes da publicação de um novo disco da banda britânica, “The Endless River”, marcada para a próxima segunda-feira, 10 de novembro.

A conversa com José Pinheiro é em francês, porque o realizador – nascido em Paris a 13 de junho de 1945 -, nunca aprendeu português, algo que lamenta “severamente” e que ainda pretende retificar: “A minha mãe era francesa. O meu pai era um operário português imigrante, que não sabia ler nem escrever. Para ele, era muito importante que eu falasse bem francês para estar bem integrado e ter uma vida melhor”, conta.

Em 1972, o francês de origem portuguesa “‘era mais’ jazz e rock’n’roll” e não conhecia os Pink Floyd, antes de editar o filme dirigido por Adrian Maben, em Itália, e de “ter vivido meses inteiros com a música deles”. Esta, porém, transformou-se num “constituinte algo íntimo”, admite, de sorriso nos lábios.

“Fiz a montagem [do filme] numa residência de artistas que se chamava o Moulin d’Andé, na Normandia. Éramos apenas o editor, o realizador e a assistente de edição. Por vezes, chateávamo-nos, mas havia uma grande união quanto ao resultado que queríamos”, conta.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

José Pinheiro considera ter contribuído para a criação de “uma obra realmente original e única”, em que “a montagem foi a alma do filme”, depois da “ideia louca” do realizador Adrian Maben de “juntar quatro câmaras Mitchell 35 mm, extremamente pesadas, e colocar os Pink Floyd numa arena vazia de Pompeia”, em Itália.

https://www.youtube.com/watch?v=8edjfDUv-Ck

Para gravar o “Live at Pompeii”, os músicos David Gilmour, Roger Waters, Richard Wright e Nick Mason instalaram-se com todo o material de digressão num anfiteatro das ruínas de Pompeia, em outubro de 1971, e deram um concerto, sem qualquer público a ouvir, a não ser os técnicos que filmavam.

Ainda que não tenha assistido às gravações, José Pinheiro foi obrigado a passar a pente fino tudo o que foi registado para a edição do filme, sendo o artesão da montagem manual, à antiga, em que se cortava e colava a película, sem haver margem para erro, e depois se juntavam os “truques”, efeitos especiais.

Os Pink Floyd foram, depois, para um estúdio de Paris, para gravar mais músicas e sons para o filme: “Eles estavam completamente concentrados no som, davam pancadas nas máquinas, tinham os sintetizadores e era uma espécie de ‘bricolage’ bastante genial ao nível sonoro, com colagens. Mas a base era mesmo o som direto da captação”.

Ainda que o inglês fosse um obstáculo para comunicar com os músicos britânicos e, apesar de insistir que “era apenas o técnico”, o editor conheceu os Pink Floyd nesses dias de passagem por Paris. Foi comer ostras com eles e recorda-os como “um grupo muito descontraído, com uma grande autoconfiança e domínio do seu trabalho”.

“Eu era apenas o técnico”, recorda José Pinheiro, que se encontrava então no início da carreira, anos antes de dirigir “Parole de flic”, com Alain Delon. “Eles ficaram satisfeitos com a montagem, mas reconheço que talvez tenha favorecido o baterista [Nick Mason], porque eu próprio toquei bateria quando era mais novo. Eles barafustaram e tivemos de mudar certos planos”, continua.

José Pinheiro foi o editor da versão de 1972, tendo havido nova versão em 1974 e, depois, em 2003. O realizador Adrian Maben ainda continua a trabalhar no filme, tendo voltado a Pompeia “há algumas semanas” para filmar com drones, “provavelmente para lançar uma versão restaurada, por ocasião do novo álbum dos Pink Floyd”.

“The Endless River”, que chega às lojas a 10 de novembro, é o primeiro disco da banda em vinte anos, tendo como base material inédito gravado em 1994, nas sessões de gravação de “The Division Bell”, em Londres.

Quanto a José Pinheiro, depois de ter montado o documentário dos Pink Floyd, continuou a editar documentários do realizador e fotógrafo francês Raymond Depardon, até 1976, tendo depois abraçado o mundo da realização e rodado com o conhecido ator francês Alain Delon (“Paroles de Flic”, “Ne réveillez pas un flic qui dort”).

No currículo, contam-se ainda séries de televisão e, atualmente, concentra-se na escrita de argumentos e na procura de novos desafios. “Navarro”, “Comissário Moulin” e “Les Fauves” são trabalhos que fez, nos últimos anos, para televisão.

Por Carina Branco, da agência Lusa, em Paris