António Feijó, professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e presidente do Conselho Geral Independente da RTP (CGI) acredita que a criação do novo órgão é um passo decisivo para independência da estação pública em relação ao poder político. Em entrevista a Maria João Avillez, no Observador, Feijó explica porquê:
“O Estado teve sempre uma posição dominante no produto público, no sentido em que, para além de ser o acionista, determinava a vida da empresa – decidia quem era o Conselho de Administração e temos todos conhecimentos de histórias perversas de interferência na linha editorial, de alinhamentos de telejornal que eram feitos em ministérios, etc.”, denunciou.
Por isso, sustentou Feijó, “talvez o Estado deva divorciar-se da gestão da televisão pública”. Agora, com a criação do CGI e com o fim das indemnizações compensatórias – ou seja, o fim das subvenções diretas na empresa – a “RTP terá uma independência política muito maior”, porque não está refém do “ascendente político e financeiro” dos sucessivos governos, explicou.
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Desafiado por Maria João Avillez a comentar o eventual fim do novo modelo aprovado para a gestão da RTP com uma vitória do Partido Socialista nas próximas eleições legislativas, António Feijó preferiu desvalorizar tal cenário, até porque, acredita, mesmo entre socialistas há quem defenda uma “segregação entre o Estado e a RTP”.
Além disso, as principais críticas apontadas à solução adotada pelo ministério tutelado por Miguel Poiares Maduro têm origem em “fogo amigo”, ou seja, em figuras com relações ao PSD, acusou.
“O grande fogo sobre este modelo não tem sido da oposição. Tem sido de figuras gradas do PSD que detêm o comentário político em Portugal (…), como Morais Sarmento, Marques Mendes e Marcelo Rebelo de Sousa, em parte, (…) que fizeram uma série de pronunciamentos, por vezes violentos, sobre o CGI. Há tensões internas no partido maioritário da coligação que se refletem nisso [nessas críticas]”, afirmou António Feijó.
Quanto ao PS, caso seja o vencedor das eleições legislativas, o professor catedrático deixa o desafio: “Se alguém não gosta deste modelo só tem uma alternativa: eleger-se e mudar a lei. (…) A única coisa que eu acho é que as forças maioritárias em Portugal – e que neste momento têm o poder como horizonte possível – perante um cenário em que a televisão pública ficou finalmente arredada das mãos do Estado, se quiserem alterar esse modelo, (…) têm pelo menos o ónus de explicar porque querem repor o Estado numa posição dominante“.
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Questionado sobre como pretende o novo Conselho de Administração (CA) da RTP articular a aposta num serviço público de maior qualidade com uma lógica menos concorrencial em relação aos privados e aos números de audiência, António Feijó foi claro: é possível fazer serviço público e programação de qualidade sem estar preso aos números da audiência e às receitas comerciais.
“Há um ponto crucial deste debate: se há qualidade de programação, as audiências baixam; se as audiências baixam, as receitas comerciais baixam, portanto o serviço público deixa de ter relevância… E temos aqui os braços de um dilema de onde nunca se sai. [Ora], eu acho que este dilema é um falso dilema, por uma razão muito simples: a qualidade não tem necessariamente elitista“.
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Foi esta visão sobre o que deve ser o serviço público que, na opinião do presidente do novo órgão, motivou a cisão entre a anterior Administração e o CGI. Na entrevista ao Observador, António Feijó repetiu as críticas que já em diversas ocasiões teceu em relação ao Plano Estratégico apresentado pela equipa de Alberto da Ponte: o projeto “não era bom, era inaceitável“.
Quanto às acusações de Alberto da Ponte, que, em entrevista ao Expresso, admitiu ter sido forçado a sair da RTP e descreveu o ministro Poiares Maduro como “um erro de casting“, António Feijó revelou-se “surpreendido” pelo teor da entrevista. “Pensei que podíamos encerrar esta questão. Mas não foi isso que aconteceu e devo confessar que me surpreendeu um pouco”, admitiu o presidente do CGI.
Em relação ao novo Conselho de Administração, presidido por Gonçalo Reis e composto, ainda, por Nuno Artur Silva e Cristina Tomé, António Feijó sublinhou o currículo e competência dos três indigitados e assumiu o apoio total à nova equipa e ao projeto estratégico apresentado pela nova equipa. “A nossa posição em relação ao CA que acabamos de indigitar é muito simples: terão todo o nosso apoio”.
“Nós escolhemos estas pessoas por entender que têm o perfil adequado às funções. Têm um projeto interessante para a televisão pública e só nos compete apoiá-los”, garantiu Feijó.
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