Há dias assim. Uma equipa faz (quase) tudo bem, a outra (quase) nem existe. Facilitemos a vida a quem quer saber o que se passou na primeira parte de uma forma curta e grossa: aos 14′ o FCP registava 11 ataques contra zero; aos 24′ sufocava; aos 27′ tinha 65% de posse de bola; aos 35′ assinava 24-2 em ataques; e, finalmente, perto do intervalo tinha qualquer coisa como 72% de posse de bola. Que dizer depois disto? O chefe Lopetegui está a acertar com o sal. Mas haveria uma reviravolta na alma da partida. O FC Porto ganhou o Vitória por 1-0, resolveu Brahimi, que assinou o décimo golo da época.

FC PORTO: Fabiano, Danilo, Maicon, Marcano, Alex Sandro, Casemiro, Herrera, Oliver, Quaresma, Brahimi, Jackson

V. GUIMARÃES: Assis, Bruno Gaspar, João Afonso, Josué, Breno, Bouba, Cafú, Bernard, Alvez, Sami, Alex

Jackson, em dose dupla, foi o primeiro a assustar Assis, que não sonhava certamente com o que lhe esperava. Os homens de azul estavam naqueles dias. A saliva avolumou-se na boca dos seus adeptos, certamente. É que houve momentos a roçar a perfeição. Houve triangulações, pressão, houve tabelas, coração, houve toca e vai, movimentações mil, houve variações de flanco, houve um central a fazer passes à Frank de Boer (Marcano), houve um super-avançado a fazer o que um super-avançado faz… Houve tanta coisa, senhoras e senhores. Quaresma e Brahimi em campo, mais Oliver e Herrera na dose certa. E convém dizer que o rival não era uma equipa qualquer. Sim, perdeu Hernâni para o FCP (entrou aos 87′), mas este Vitória é sempre uma equipa organizada, rigorosa, batalhadora, competente e fiel a um sentimento que envolve aquela equipa. O FCP anulou isso tudo (na primeira parte).

Casemiro foi o homem que se seguiu, através de um livre direto à bomba — Assis agarrou com segurança. Depois, por segundos, o vendaval que pairava sobre o Estádio do Dragão sossegou e o inimigo deu sinais de vida. Foi perto da meia hora de jogo e cortesia de Bernard. O ganês, natural de Accra, quis mostrar que ali também morava qualidade e toque de bola e, arriscando um puxão de orelhas do Porto a Melbourne, livrou-se dos três homens do FCP do meio-campo e arrancou em direção à área de Fabiano. O remate saiu fraco, muito, muito longe da baliza do brasileiro, mas ficou o safanão. Nem que seja para injetar moral nas tropas.

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Jackson, o tal super-avançado, não estava para atinar com a baliza de Assis: falhou mais duas bolas. Mas haveria alguém para corrigir a narrativa desta história de encantar, que merecia ver algo acontecer. Tanto futebol sem golos é como um comer um delicioso cozido à portuguesa sem os famosos enchidos. Ora bem, e o golo? Marcou Brahimi, aos 30′. Danili cruzou, Óliver, num jeitinho muito seu, rodou e descobriu do lado esquerdo Brahimi. O argelino deu três toques na bola e colocou no poste mais distante, à Henry (os defesas ainda tocaram na bola), 1-0.

Intervalo no Dragão. O resultado era magro, muito magrinho para o futebol que se viu. O Vitória estava irreconhecível, mas foi engolido por um dragão cheio de estilo, vontade e identidade. Quando uma equipa, quando está a atacar, consegue enfiar quatro jogadores na área adversária e, a seguir, é capaz de recuar e abafar logo, está tudo dito. É o melhor de dois mundos, que complica a vida ao rival. Sufoca, anula, faz desaparecer do mapa. É certamente este o FC Porto que Lopetegui quer. Mas há também uma nota para o Vitória: sim, não foi fácil este primeiro tempo, mas, e apesar do massacre, nunca se meteu num autocarro de três andares. Manteve a identidade, a defesa estava subida, tentava pressionar na medida do possível, claro. Cafú e Bernard eram os melhores dos vimaranenses. Faltava o coração e raça de André André, que se encontrava a cumprir castigo.

A segunda parte não podia ser mais diferente. A escuridão do Vitória ganhou luz. Recuperou a ousadia do costume e lavou as feridas, que resultaram do tiqui-taca que se viu no Dragão no primeiro tempo. Viu-se mais Guimarães e os homens da Invicta mais relaxados. Tanto que depois se assustaram. É que o rival entrou muito forte e acreditou até ao fim. Afinal, só contam as bolas que entram e estava apenas 1-0…

Os cerca de 26 mil adeptos que estavam no estádio viajaram do paraíso, de um país chamado “Perfeição”, até à terra do susto. A sério. Marcano e Jackson cederam dois cantos para os visitantes logo a abrir. Alvez, camisola 10, rematou com pinta, aos 52′, mas saiu fraco e Fabiano agarrou com facilidade. A intensidade dos homens da casa fugiu. O Vitória ganhara um GPS ao intervalo, já sabia onde ficava a baliza da outra equipa.

Lopetegui sentiu o barco tremer, sentiu que o ponto rebuçado já era e lançou Rúben Neves e Tello — saíram Brahimi e Herrera — para segurar e estabilizar o meio-campo e ganhar nova competência na hora de contra-atacar. O jogo ficaria equilibrado, mais disputado, aberto. Os visitantes acreditavam que o empate já não era miragem. A montanha que rasgava os céus e o infinito parecia impossível de alcançar, mas neste segundo tempo a cantiga foi outra.

A maior agressividade do Vitória levou os jogadores aqui e ali a cometer alguns excessos. Exemplo disso foi o que aconteceu aos 69′, quando Cafú virou Casemiro com uma senhora pancada. Virar é um termo aceitável. O único que acabaria expulso seria Rui Barros, o pequeno génio de outrora que estava fora de si. Cafú levou cartão amarelo. Do outro lado, também Alex Sandro, Danilo e Casemiro acabariam por ver o amarelo, ou seja, falharão a viagem ao Estádio do Bessa na próxima jornada. Fica a dúvida se será estratégia, pois eram os únicos três jogadores em risco (a jornada seguinte será com o Sporting).

O FC Porto continuou, a espaços, a tentar matar o jogo. Maicon esteve muito perto do golo, depois de um livre de Quaresma, mas o cabeceamento ao segundo poste para a baliza saiu torto. Danilo esteve perto de faturar, ele que deve andar nas nuvens com os rumores de que será o Daniel Alves do Real Madrid. Hernâni, que entrou aos 88′, esteve muito perto de ter uma estreia de sonho: a primeira vez que tocou na bola foi de cabeça, ao segundo poste, e quase festejou de dragão ao peito.

Ponto final. Perfeição e resultado magro na primeira parte. Na segunda houve muito menos controlo e muito mais Vitória. Acabou por ser um bom jogo, com intensidade e grandes momentos. Os dragões estão agora a apenas a um ponto do Benfica, que entrará em campo domingo, contra o Vitória de Setúbal. Convém também lembrar o que vem aí no calendário dos homens da Invicta: Basileia, Boavista, Sporting, Sp. Braga e Basileia. Mais uma moedinha, mais uma voltinha…