Os desafios eram e continuam a ser muitos. Porque não é de um dia para o outro que se monta um evento à volta de uma doca que costuma estar às moscas. Ou às gaivotas. Há anos que o espaço lhes pertencia e, por isso, devem ter estranhado quando se começou a erguer a estrutura para acolher uma tenda com 250 metros de comprimento. Tanto que, durante os primeiros dias, dezenas pousavam no topo, insistentes, escoando depois as necessidades para cima da tenda. Não podia ser. Daí que a organização tenha instalado umas colunas na estrutura que vão repetindo “o som de gaivotas a morrerem”, aos altos berros, para manter afastadas as que estão vivas.
O truque resulta e basta olhar para o céu e vê-las pairar, em círculo, sem que uma ouse pousar ali. Este foi um entre vários “imensos desafios” que para instalar na Doca de Pedrouços, já na fronteira entre Lisboa e Algés, o palco que, entre 25 de maio e 7 de junho, acolherá uma paragem da Volvo Ocean Race. Ou uma stopover, toda a gente da organização lhe chama. Um deles é José Pedro Amaral, diretor da Urban Wind, empresa que toma conta da organização, que mais do que falar de desafios, pisca o olho às oportunidades. Fala-nos das empresas, das marcas, das muitas pessoas que virão a Lisboa pela regata e dos turistas que, nessa semana, vão encher as medidas ao turismo. “Por curiosidade, visito muitas vezes os sites de marcação online e, nessa altura, o nível de ocupação é elevado e permanente ao longo da prova. Tal como os preços que os hotéis cobram”, garante, durante a espreitadela do Observador às obras.
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A visita acontece quando faltam duas semanas e meia para sete barcos de 20,37 metros de comprimento e mais de 12 toneladas de peso ali chegarem. Quase tudo ainda vai a meio: os escritórios vão-se montando no interior da antiga fábrica da Docapesca, a tenda para alimentar mais de mil pessoas por dia, entre organização, staff e velejadores, vai-se compondo por dentro, e a outra tenda, a tal dos 250 metros, reservada para 36 marcas e patrocinadores, ainda só vai nos 120 metros de comprimento. Mas sem gaivotas a chatearem. Tudo, garante José Pedro, ficará pronto a tempo. E este tudo virá de “um investimento global a rondar os 4 milhões de euros” que volta a trazer a Portugal uma paragem da regata que se realiza a cada três anos — já em 2012 tinha parado em Lisboa e há acordo para, em 2017, acolher outra escala. Nesta edição há uma certeza: a entrada é gratuita e ninguém tem de pagar bilhete.
José Pedro Amaral diz que “não há volta ao mundo sem Lisboa” e veria como “um problema grave” se a Volvo Ocean Race não fizesse uma paragem em Portugal durante os 10 meses de prova. E difícil será encontrar alguém que vibre tanto com este stopover do que Rodrigo Moreira Rato. Mais do ser o responsável pela comunicação do evento, Rodrigo já perdeu a conta aos anos que leva a adorar a vela. Acompanha-nos durante toda a visita, mostra-nos tudo e tenta trocar por miúdo tudo o que é conceito e termo técnico. “É um sonho. Temos imensa sorte em ter isto cá pela segunda vez. Há milhares de cidades no mundo, e isto é um facto, que gostavam de ter esta prova”, garante, enquanto parece vibrar com as mil e uma coisas que lhe vão na cabeça sobre o evento. E não tarde em dizer-nos uma delas.
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Rodrigo salienta que será ali mesmo, na Doca de Pedrouços, que os sete barcos vão sair do mar pela última vez na regata. Exemplifica, gesticulando, que uma grua os tirará da água e os colocará durante uns dias ao lado da doca, para irem a uma espécie de revisão. “Os barcos vêm de uma travessia Atlântica. São retirados por uma grua, vão para um berço e são todos revistos. O mastro sai, as velas também e todas as peças são fiscalizadas. O mastro é radiografado. E por isso vamos também ter esse lado aqui em Lisboa, como se fosse as boxes da Fórmula 1″, explica, enquanto nas mãos uma miniatura dos barcos que vão a 25 de maio chegam a águas portuguesas.
É dentro desses barcos, diz, que os velejadores “vivem em condições espartanas” e onde, por exemplo, o banho “ainda se toma com [toalhitas] Dodot”. Rodrigo Moreira Rato está ansioso por ver chegar a Lisboa “a vivência da travessia Atlântica”. Já falta pouco.