Em visita a Luanda, o vice-primeiro-ministro respondeu ao Observador sobre as relações entre Portugal e Angola – e sobre o caminho que leva o investimento estrangeiro em Portugal – e de empresas portuguesas lá fora. Paulo Portas admite que com Angola se viverá “um período mais difícil”, mas gradualmente recuperável. E garante que deixa “uma base sólida e sustentável para o crescimento económico de Portugal” para o próximo governo.
Sendo há quatro anos responsável no Governo pela captação de investimento estrangeiro, sente que as visitas de Estado têm algum efeito – mesmo que a prazo?
Durante o período mais difícil da crise, os empresários portugueses fizeram-se ao caminho e foram procurar novos mercados e novos investidores. O nosso papel não podia ser o de ficar em casa, a nossa missão foi acompanhar esse esforço, assegurar oportunidades e mostrar as boas razões para se acreditar em Portugal.
As visitas e as missões servem para fazer boas relações e estabelecer confiança – dois fatores decisivos para os investidores decidirem apostar em Portugal. Poder dizer – olhos nos olhos – que o nosso país é uma base segura para criar valor, uma porta de entrada na Europa, com boas relações em África e na América do Sul, com boas acessibilidades e infraestruturas e, além disso, que foi capaz de fazer reformas e apoia o investimento estrangeiro. Não foi por acaso que muitos investidores estrangeiros escolheram Portugal como acesso ao mercado europeu.
Mas as missões empresariais não tratam apenas de atrair investimento, são igualmente oportunidades para abrir portas às nossas empresas. Para mostrar o talento de Portugal – na arquitetura, na engenharia, no software ou nos produtos gourmet, nas infraestruturas, nas renováveis ou no turismo. Para que os problemas destas empresas não fiquem por resolver, e para que não se percam contratos por falta de apoio a nível político, estas delegações oficiais são importantes. Tudo começa com bons produtos e bons serviços, mas, perante duas ofertas de qualidade, sobretudo quando estamos a falar de grandes contratos com o setor público de outros países, a boa relação entre os países pode ser o elemento determinante.
Penso que os efeitos são bem visíveis. Basta olhar do lado das exportações – estamos a crescer 5,5 por cento sobre o melhor ano de sempre – e para o número de empresas exportadoras. Isso é, antes de mais, mérito das próprias empresas, dos seus gestores e colaboradores. Tenho conhecido exemplos extraordinários de empresas que dão cartas em mercados novos como no Golfo ou na Ásia e que disputam mercados que antes eram considerados “coutadas” de outros países, por exemplo na América Latina, África e Ásia. E quanto ao investimento, também estamos a níveis recorde e isso só foi possível passando, convicta e insistentemente, uma mensagem de confiança aos investidores estrangeiros. Hoje podemos dizer que somos um destino atraente para investir, ao nível dos melhores, e que somos olhados com confiança. Isto faz toda a diferença.
Estando ainda no terreno, vai deixar algumas boas notícias para o próximo Governo?
As boas notícias são para os portugueses – com a maior confiança das empresas podemos ter mais investimento e, por isso, mais emprego e crescimento. Temos hoje uma trajetória clara de melhoria no comércio externo e, graças ao crescimento das exportações de bens e ao grande momento de algumas atividades de serviços como o turismo. Vamos ter, quase de certeza e pelo 3º ano consecutivo, uma balança comercial positiva em 2015. Isto é algo que não tínhamos desde os anos 1940, e não podemos desperdiçá-lo. Os números do investimento são os melhores da última década. Mais do que boas notícias, temos hoje uma base sólida e sustentável para o crescimento económico de Portugal. Se nos competir a nós continuar este trabalho, estará seguramente no topo das prioridades dos próximos anos.
Qual é o fator determinante para um país ser apetecível para as empresas externas? Quais são os nossos principais competidores?
O fator determinante é a confiança. Confiança na qualidade e qualificação dos trabalhadores portugueses, em leis laborais flexíveis e feitas por acordo social, na previsibilidade de uma redução fiscal continuada, numa regulação eficaz, num mercado aberto e justo – mas, mais ainda, na atitude de um país que cumpre os acordos internacionais e por isso é confiável.
Não foi fácil, ganhar esta confiança no estrangeiro. Mas conseguimos graças ao esforço de todos. Felizmente, a cada dia que passa, o ano de 2011 está cada vez mais longe. Não é só a ordem do calendário mas, mais ainda, a mudança de atitude.
Diria que o primeiro desafio que vencemos foi o da descrença: não faltaram por aí durante o período do resgate alguns tecnocratas – que, curiosamente, não eram empresários e nem sequer sabem o que é pagar um salário ao fim do mês ou vender um bem ao exterior – que previam que tinha sido atingido um limite para as exportações. A realidade desmentiu-os em 2014 e voltará a fazê-lo em 2015. Diziam até que Portugal não ia conseguir livrar-se tão cedo do cogoverno com os credores.
Como calcula, não seria apropriado nomear os países com quem competimos, mas também é fácil constatar que temos conseguido ganhar muitos investimentos para Portugal – é bom lembrar que Portugal subiu 15 posições no último ranking do Fórum Económico Mundial, índice de referência para o investimento estrangeiro. Mais investimento em Portugal significa mais emprego para os portugueses. E esse é o grande desafio que nos espera nos próximos anos.
Angola: Pode falar-se já de um restabelecimento das relações diplomáticas normais? Há uma taxa sobre transferências para o exterior (de que as empresas portuguesas se queixam muito), uma quota à importação de produtos básicos – e o problema de sempre dos vistos. As exportações portuguesas para Angola estão em queda acentuada. E sempre que um governante vai a Angola sai a dizer que é desta. É desta?
Portugal e Angola são povos e países amigos e conhecem-se muito bem. Quando assim é, não há sobressalto a que não resista uma boa e longa amizade, nem há divergência demasiado profunda para quem realmente se entende. As nossas empresas estão a trabalhar juntas nos dois países, as nossas famílias estão ligadas e quase não há dia que passe que não surja um novo negócio ou uma nova parceria, em tempos mais fáceis e nos menos fáceis também.
Há ainda uma diferença importante em relação a outros países: a nossa visão para Angola é de longo prazo. Muito longo prazo mesmo. Pode haver dificuldades hoje, daqui a um mês ou daqui a um ano, mas estaremos a trabalhar para que as relações sejam próximas, para estimular as relações comerciais e para apoiar o desenvolvimento de Angola. Com o novo Observatório do Investimento, é certo que vamos tornar o relacionamento mais ágil e mais eficaz. Nos últimos quatro anos, as nossas exportações para Angola cresceram quase 1.300 milhões de euros e ganhamos quase 2.000 novos exportadores para este país. A contração que temos em 2015 é relevante e explicável, vai ser um período mais difícil, mas acredito que gradualmente recuperaremos nos anos seguintes.