Os doentes com diabetes tipo 1 têm de se injetar todos os dias com insulina, em maiores ou menores doses, para suprir uma falha do organismo. Mas um estudo levado a cabo por investigadores da Universidade da Califórnia e Yale, nos últimos cinco anos, e publicado esta quarta-feira na revista Science, vem abrir uma janela de esperança a estes doentes, mostrando que pode ser possível travar a destruição das células do pâncreas que produzem insulina, através do reforço do sistema imunitário, e desta forma evitar a administração diária de insulina.

O normal é o sistema imunitário proteger o organismo das infeções, mas no caso dos doentes com diabetes tipo 1, as células T (subtipo dos linfócitos T) não só atacam os agentes externos, como atacam também as células boas do organismo, mais concretamente as células beta do pâncreas, responsáveis pela produção de insulina. Por sua vez, as T-regs (células T reguladoras) têm a capacidade de perceber quando há células que estão a ficar disfuncionais e que começam a atacar o próprio organismo.

Basicamente, o que estes investigadores fizeram, neste estudo que começou em 2010, foi pegar em 14 pessoas, entre os 18 e os 43 anos, com diabetes tipo 1 recém-diagnosticadas, retirar-lhes sangue, separar as T-Reg (células T reguladoras), cultivá-las e aumentá-las, voltando a injetar, nesses doentes, milhares de milhões de células T reguladoras. O que aconteceu foi que ao fim destes anos se verificou que “em algumas pessoas parou o processo de destruição” durante um ano, de forma segura.

“Usando as T-regs para ‘reeducar’ o sistema imunitário, podemos ser capazes de mudar o curso desta doença. Esperamos que as T-regs sejam uma parte importante do tratamento contra a diabetes no futuro”, afirmou Jeffrey Bluestone, um dos autores do estudo e professor de metabolismo e endocrinologia da Universidade da Califórnia, citado pelo The Telegraph.

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Bruno Almeida, médico de medicina interna da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal e assistente da Faculdade de Medicina, da Universidade de Coimbra, frisou ao Observador que “o grande interesse deste estudo é no caso dos doentes recém-diagnosticados”.

“A utilização destas células poderá ter um potencial de sucesso, mas apenas nas pessoas recém-diagnosticadas porque ainda produzem alguma insulina”, disse o médico, explicando que este processo trava, mas não reverte a destruição das células beta do pâncreas, pelo que nos casos de doentes que já não produzem qualquer insulina, deixar de injetar insulina diariamente nunca poderá ser uma solução.

Pedro Melo, diretor de serviço de Endocrinologia do Hospital Pedro Hispano, acrescentou que “futuramente, e do ponto de vista clínico, poderá haver ainda maior interesse deste potencial tratamento nas pessoas ainda sem diabetes tipo 1 propriamente dita, mas que apresentem elevado risco ou sinais do processo fisiopatológico de destruição das células beta. O problema aqui será o de identificar corretamente este grupo de alto risco”.

Sublinho que, 

Ambos os médicos alertam para o facto de a amostra utilizada neste estudo ser muito pequena. “Sendo muito interessante e promissor, trata-se de um estudo muito preliminar (fase 1), em escasso número de doentes”, finalizou Pedro Melo. Bruno Almeida acrescentou que será necessário “fazer mais estudos com mais pessoas para chegar a uma conclusão estatisticamente significativa”, sublinhando que um tratamento deste género é muito “complexo e dispendioso”.

A diabetes tipo 1 é geralmente diagnosticada até aos 18 anos e é uma das doenças autoimunes mais comuns nas crianças, embora se possa manifestar em qualquer idade. 

De acordo com o último  relatório anual do Observatório Nacional da Diabetes – “Diabetes: Factos e Números”, em 2013 existiam cerca de 60.000 pessoas com diabetes (tipo 1, tipo 2 e gestacional) em Portugal, e 3.262 crianças e jovens, com idades compreendidas entre os 0 e os 19 anos, tinham diabetes tipo 1, um número que tem vindo a crescer ao longo dos anos.