No quartel dos Bombeiros Voluntários de Guimarães começaram a apagar-se outros fogos esta quarta-feira, com o início do mega julgamento da Operação Fénix, também conhecido por caso Máfias da Noite. Pinto da Costa foi um dos poucos arguidos, de um total de 54, que aceitou prestar declarações em relação aos sete crimes de que é acusado. Antero Henrique, ex-administrador da SAD do clube, só apareceu na parte da tarde, alegando indisposição, apenas para dizer que não queria falar em tribunal. Nos depoimentos seguintes, nenhum dos arguidos reconheceu qualquer das acusações de que é alvo no processo. Mas o dia teve outros apontamentos dignos de registo.
O início
A sessão estava marcada para as 09h45, apesar de só ter começado uma hora depois. Jorge Nuno Pinto da Costa chegou pontual, conduzido pelo motorista e acompanhado pelo advogado, Gil Moreira dos Santos. O presidente do F.C. Porto saiu do carro a falar ao telemóvel e fez o caminho até à entrada do local sem mostrar intenções de falar aos jornalistas. A repórter da CMTV tentava seguir ao seu lado, até que um poste surge no caminho e cada um segue para lados diferentes. “Como podemos ver, Jorge Nuno Pinto da Costa empurra-me”, relata a jornalista. Ao ouvir a frase, o presidente dos Dragões solta uma gargalhada e repreende-a: “Não seja mentirosa. Não seja mentirosa nem provocadora!”, repete. Nas redes sociais, as imagens do momento estão a ser analisadas como se de um penálti se tratasse. Só não há árbitro para decidir se houve ou não empurrão e dar um cartão.
As dispensas
Quase nenhum dos arguidos se mostrou disposto a prestar declarações em tribunal, o que, como explicou o juiz, em nada os prejudica. Do total dos 54, três pediram dispensa antes do dia da audiência de julgamento, 27 pediram dispensa esta quarta-feira e três vão ser julgados em processos separados, aos quais se soma um arguido que não depõe, por ser pessoa coletiva (a empresa SPDE).
Eduardo Silva, responsável pela empresa de segurança SPDE e principal arguido, foi o primeiro a mostrar-se disponível para falar. No entanto, porque o seu processo é mais complexo, ficará para o fim. Pinto da Costa, Luís Filipe Pinto Magalhães, Paulo Sousa, Francisco Magalhães e Óscar Campelo foram os cinco arguidos que falaram voluntariamente esta quarta-feira.
Após o depoimento, Jorge Nuno Pinto da Costa foi dispensado até ao final e Antero Henrique ficou dispensado apenas por 15 dias.
As frases de Pinto da Costa
O primeiro convidado a falar foi o presidente do F.C. Porto, que mostrou desconhecimento sobre se a empresa SPDE – Segurança Privada e Vigilância em Eventos fazia segurança pessoal — vulgo guarda-costas — sem estar habilitada para tal. Confrontado pelo juiz com diversas situações em que foi visto com Eduardo Silva ou com outros seguranças da SPDE, negou ter conhecimento dos contratos e de ter requerido esse tipo de serviços de guarda-costas. “É coisa que nunca tive.”
Pinto da Costa reconheceu que, por vezes, esteve acompanhado por Eduardo Silva e outros vigilantes. Mas não por se sentir inseguro. E deu como exemplo as visitas que fazia à zona da Afurada, altura em que muita gente se aproximava para o cumprimentar. “Não era para serviços de segurança, mas para eu não ser asfixiado“, disse. “Até seria um insulto para aquela gente” aparecer lá com guarda-costas, sublinhou. Os vigilantes serviriam apenas para “proteção dos afetos, para não deixar que caíssem todos em cima de mim.”
De nada serviram as várias situações recordadas pelo juiz, sobre momentos em que Eduardo Silva aparece ao lado ou atrás de Pinto da Costa. Na apresentação do seu livro, no camarote presidencial ou em hotéis e estádios aquando das deslocações do F.C. Porto. Em relação ao livro, Eduardo Silva estaria presente apenas para manter a ordem num evento onde apareceram cinco mil fãs do presidente. No camarote presidencial? “Parece-me ridículo que eu precisasse de ter segurança no camarote do Porto. Nunca tive”, respondeu. Nos hotéis, a presença de Edu (o petit nom do chefe da SPDE) serviria para manter os adeptos fora de portas. Nos estádios ou na rua em Lisboa, “nunca estive acompanhado de ninguém e saía a pé sem nunca ser incomodado”.
Se Eduardo Silva, Nélson Matos e outros membros da SPDE estavam presentes, “nunca viajaram com a comitiva”, clarificou. “Qualquer cidadão pode ir onde quiser. Não estou a dizer que ele não foi, estou a dizer que não me recordo ou não vi.” Em suma: “Não preciso de ninguém para me defender nem proteger-me dos adeptos.”
“Em 2014/2015 tinha o numero de telefone de Eduardo Silva?”, perguntou o juiz. “Não lhe sei dizer. Posso ver, creio que não tenho mas posso ter ligado mesmo sem ter o número.”
O roubo
Tudo aconteceu mesmo em frente à porta do tribunal improvisado, aparentemente como retaliação à altercação matinal entre a jornalista da CMTV e Pinto da Costa. À saída para a pausa de almoço, um grupo de homens, alegadamente ligados à claque portista dos Super Dragões, apareceu no local e danificou a câmara do canal. Um dos rapazes, de blusão e capuz na cabeça, roubou mesmo o microfone à jornalista. A PSP identificou um homem. Pouco tempo depois, Fernando Madureira, líder da claque dos Super Dragões, publicou um vídeo na sua conta de Instagram com o microfone a ‘dançar’ ao som de uma música do F.C. Porto.
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Os momentos caricatos
Nenhum dos arguidos que quis prestar declarações admitiu qualquer das acusações de que é alvo no processo. Perante os desmentidos e justificações, o juiz lia passagens de SMS ou escutas que fazem parte da acusação. “Isto de foder os cornos a alguém, no fundo, é agredir. Não é?”, tentou clarificar o juiz, em dado momento, ao arguido Paulo Sousa, envolvido na escuta.
“Infelizmente, nem uma cama sei fazer, sr. dr. juiz.” O arguido Francisco Magalhães terminou assim a sua justificação perante a acusação de crime de posse de arma proibida.
No caso da recuperação de um Audi Q7, o juiz leu ao arguido Óscar Campelo, acusado de crime de extorsão, algumas escutas que serviram de base à acusação para o pronunciar no caso. O arguido nega qualquer contratação à SPDE para a recuperação do veículo com recurso a métodos mais violentos. “O sr. Óscar usa a expressão ‘pendurar o empregado e o sr. Rodrigues’. Porque é que não disse falar?”, contestou o juiz. “Ó sr. juiz, pendurar é falar. É calão”, justificou.
Os números
A presença de nomes mediáticos atrai as atenções. E os números justificam que a Operação Fénix seja apelidado de mega julgamento. Aqui vão alguns dos números do dia:
Uma hora de atraso no início da sessão.
54 arguidos.
Pelo menos 40 advogados.
134 testemunhas de acusação e 123 testemunhas de defesa.
Apenas oito lugares disponíveis para jornalistas, familiares e público em geral que quisessem assistir à primeira sessão do julgamento.
Dezenas de forças de segurança no local.
45 sessões já marcadas até ao dia 1 de setembro.