Dois dias a calcorrear a imensa Messe de Berlim, onde decorre (entre 1 e 6 de setembro) a feira IFA, chegam para perceber para onde se dirige a indústria da eletrónica de consumo, quais as maiores tendências, que linhas de produtos têm potencial e quais são aquelas onde o potencial que existiu já está a ser espremido até à última gota. Conheça algumas das novidades apresentadas na feira tecnológica e os produtos mais marcantes.
A invasão da cozinha pelos ecrãs e pelos robôs
Tradicionalmente, há dois grandes grupos de produtos para ver numa feira como a IFA: a eletrónica para entretenimento — televisores, telemóveis, auscultadores — e os eletrodomésticos — frigoríficos, máquinas de lavar roupa, etc. Essa divisão está cada vez mais esbatida, porém, porque depois da sala e do quarto, a cozinha parece, claramente, ser cada vez mais o filão que as marcas querem explorar.
Fruto da popularidade dos programas de culinária na TV — ou, simplesmente, porque era a divisão ainda menos explorada pelas novas tecnologias — a cozinha afirmou-se como o cenário onde existe maior potencial de crescimento e de diferenciação. Com tanta conversa sobre a sala de estar, as empresas estão a olhar para a cozinha como “o coração da casa”, onde as pessoas passam muito tempo — que se quer de qualidade. E a tecnologia quer ajudar.
Um estudo da GfK sinalizou recentemente que este ano irá ver um crescimento substancial das vendas de eletrodomésticos de gama alta. Em parte devido ao efeito das taxas de juro baixas, as pessoas estão a aproveitar para comprar eletrodomésticos mais caros e com maiores garantias de durabilidade, eficiência energética e, claro, conectividade inteligente.
Não seria fácil contar quantos frigoríficos havia na IFA que são capazes de tocar uma série no Netflix na porta ou, simplesmente, mostrar que alimentos estão no interior com apenas dois toques no vidro — como o Instaview da LG, que a marca voltou a trazer à IFA deste ano.
Uma das novidades mais interessantes que vimos foi o conceito de frigorífico móvel — e, claro, inteligente — da Panasonic. Controlado pela voz — outra tendência para (quase) tudo na feira — este pequeno frigorífico sai da parede e deambula pela cozinha ou sala de jantar para nos levar uma bebida fresquinha sem termos de levantar e sem nos afastarmos da conversa à mesa de jantar.
A glimpse of Panasonic's concept robotic, mobile fridge, on show at #IFA2017 pic.twitter.com/6JuMnG45g4
— Martyn Landi (@MartynLandi) September 1, 2017
Os smartphones são um mercado enorme. Mas e o crescimento?
Aproveitando a presença de vários empresários e jornalistas do setor em Berlim, várias marcas apresentaram novos produtos — no recinto ou em hotéis nas redondezas — nas vésperas do início da feira. Foi o caso da LG, que apresentou o novo “smartphone” V30, que a imprensa especializada considera um dos telemóveis do ano e que mostra que a marca sul-coreana não quer desistir de dar luta à Samsung e, claro, à Apple, numa autêntica Guerra dos Tronos que se disputa neste mercado. Um mercado que dá receitas cruciais mas que parece muito próximo da maturidade.
O padrão nos “smartphones” já está elevadíssimo e já não é possível conquistar quota de mercado apenas com garantias de mais memória ou um processador xis % mais rápido — os progressos nessas áreas são cada vez mais impercetíveis para o utilizador. Assim, a aposta já não pode ir apenas para o hardware e está a ser feita, cada vez mais, no software.
É aí que a chinesa Huawei se quer posicionar. Este sábado, na IFA, apresentou uma tecnologia de Inteligência Artificial que, diz a marca, nos irá lembrar que os telemóveis de hoje em dia não são inteligentes – são espertos. Em vez de ter máquinas capazes de estar constantemente a ir à nuvem buscar informações que nos ajudem — como está o tempo em Berlim, por exemplo — a Huawei quer apostar na inteligência artificial dentro do próprio aparelho, transformando-o num assistente pessoal que está realmente nos nossos bolsos e não apenas uma (super-)máquina ligada à “nuvem”.
Veremos até que ponto esta aposta faz sentido numa altura em que, com as ligações de internet cada vez mais rápidas, a tendência é cada vez mais aceder-se a capacidade computacional remota e não andar com ela no bolso ou tê-la pousada na mobília. As consolas de videojogos, por exemplo, caminham nesse sentido: comprar uma consola recheada de componentes internos será em breve uma abordagem ultrapassada e será substituída por televisões ainda mais inteligentes capazes de aceder a computadores remotos.
Televisores de fazer cair o queixo, finos como papel
Por falar em televisores, não é difícil ficar de queixo caído com a qualidade de imagem dos aparelhos topo de gama mas, também, cada vez mais, das gamas mais baixas. A tecnologia continua a evoluir, com o OLED a tecnologia mais promissora (mas há rivais). Porém, o que mais impressiona é a capacidade da engenharia de criar ecrãs com 2,57 milímetros de espessura — e sem qualquer aparato de cabos ou fios à volta. A LG, por exemplo, desde julho já vendeu em Portugal uma mão cheia de televisões W de 77 polegadas da sua gama Signature, com a implacável tecnologia OLED.
Custam cerca de 20 mil euros e quem compra recebe em casa um técnico especializado para fazer a instalação, já que tudo tem de ficar perfeito com a televisão e com a quase invisível fibra que alimenta o aparelho. Consegue ver os fios que estão a alimentar o ecrã?
2.57mm #LG #IFA2017 pic.twitter.com/Zw9X7rh6i2
— Edgar Caetano (@EdgarCaetano) September 3, 2017
Outro televisor que impressiona é da Philips: o Quantum Dot TV — uma tecnologia que rivaliza com a OLED e onde a Philips e a Samsung estão a apostar. Um dos modelos desta gama, o 8602, traz a tecnologia Ambilight, que projeta cores para a parede que está por trás — um efeito interessante.
A “realidade” que poderá sair vitoriosa: a “realidade mista”
A tecnologia que mais dará que falar nos próximos tempos, suspeitamos, é a chamada “realidade mista”, que receberá um impulso com a atualização que a Microsoft se prepara para fazer do Windows 10. Uma alternativa à realidade virtual e à chamada “realidade aumentada”, a realidade mista — que poderá ser uma plataforma mais promissora e mais escalável do que as outras duas. Marcas como a Asus e a Lenovo apresentaram na IFA 2017 os headsets (capacetes?) — que, em última análise, podem substituir a forma como nos habituámos a interagir com os computadores (teclados, ratos, touch).
Realidade mista é, basicamente, realidade virtual mas sem a parafernália de sensores e câmaras que são necessários para essas soluções. A única coisa que é necessária, além do computador, é o visor e os dois comandos (wireless). A tecnologia é capaz de nos transportar para o nosso desktop, em vez de ter ícones ter divisões de uma “casa” onde nos deslocamos. É como se conseguisse enfiar a cabeça dentro do monitor e começasse a ver os ícones e as janelas a correr, à sua volta, em três dimensões. A tecnologia tem um grande, grande potencial, sobretudo pela conveniência e maior simplicidade do que a realidade virtual pura e dura.
Numa feira que pareceu ter um pouco menos de robôs do que se poderia prever, a exceção foi para as potencialidades para o ensino da robótica aos mais pequenos — um filão que está a crescer rapidamente, com os pais preocupados em dotar os filhos de talentos nesta área perante a ameaça da automação para os empregos e carreiras.
A integração com assistentes pessoais (como a omnipresente Alexa, da Amazon) foi outra tendência marcante dos produtos apresentados na IFA, em conjugação com a já consolidada aposta na Internet das Coisas. Desde a iluminação até às escovas de dentes, todos os aparelhos que temos em casa estão a tornar-se conectados. E é intensa a luta entre as marcas para criar o dispositivo que será o centro de tudo, de todos esses componentes ligados à Internet e uns aos outros.
A IFA (Internationale Funkausstellung Berlin) é a maior feira de eletrónica de consumo da Europa. Realiza-se todos os anos, no final do verão em Berlim e rivaliza em importância com a CES de Las Vegas. A edição deste ano decorre entre 1 e 6 de setembro.
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Fotogaleria. Quando o teletexto e a televisão 16:9 eram o futuro
O jornalista viajou até Berlim a convite da LG Portugal.