Depois do lançamento do primeiro título, Motor Toon Gran Prix, sob a alçada da gigante nipónica Sony, Kazunori Yamauchi fundou a sua própria empresa para alcançar a liberdade criativa que não conseguia ter numa equipa de desenvolvimento da Sony. Foi assim, através da Polys Entertainment (renomeada Polyphony Digital em 1999) que, em 1996, terminou o desenvolvimento de Motor Toon Gran Prix 2 e aproveitou o seu esqueleto (físicas e motor de jogo) para desenvolver o que em 1997 se tornou Gran Turismo, o primeiro dos vários títulos de simulação de condução dos videojogos, inúmeras vezes aclamados como a experiência definitiva dentro do género.

No entanto, a indústria tem visto nos últimos anos um aumento da oferta deste tipo de jogos para um público que está longe de se poder apelidar de numeroso (principalmente quando comparado a outros títulos de modalidades desportivas), com características apelativas e catálogos de carros e pistas numerosas. Da série Forza e suas múltiplas iterações, ao também recentemente lançado Project Cars 2, Dirt 4, Need for Speed, passando pela série F1, há de tudo um pouco e para todos os gostos, esteja o consumidor à procura de enormes lamaçais ou da tensão da alta competição.

Mas não é só sobre o jogo que a fama da série incide. O nome Gran Turismo é não só construído devido à excelência dos videojogos, mas também graças às diversas parcerias e iniciativas associadas a este. A título de exemplo, no Gran Turismo Sport os veículos encontram-se divididos em classes de acordo com o tipo de condução que proporciona. A Polyphony Digital estabeleceu parcerias com vários fabricantes de automóveis para disponibilizar variações de carros adaptados a este tipo de grupos. É o caso do Toyota FT1 Vision Gran Turismo ou o Mazda 6 Group 3, que são adaptações de carros destas marcas para um estilo competitivo GT3.

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Outro exemplo é a parceria firmada com a PlayStation e a Nissan, que permitiu a criação da Gran Turismo Academy — um torneio virtual internacional que coloca jogadores lado a lado a competir para uma oportunidade a se tornarem verdadeiros condutores profissionais de carros de corrida, sendo que o vencedor da primeira edição, o espanhol Lucas Ordóñez (também presente na BGW2017) –, em 2008. Este conquistou já inúmeros títulos, tal como um segundo lugar de equipa em 2011, num 24 hours of Le Mans.

O Rubber Chicken, a convite da PlayStation Portugal, teve a oportunidade de estar à conversa com Kazunori na Barcelona Games World 2017, na passada sexta feira, onde este, quando confrontado com o porquê deste mais recente título ter perdido a numeração que se havia estabelecido como padrão, argumentou que isso se devia ao facto de este reunir as melhores características de cada título da série com o objetivo de criar um dos melhores jogos de toda a série Gran Turismo.

Sendo a série Gran Turismo uma série exclusiva das consolas PlayStation e sendo esta última pioneira em vários passos importantes na evolução da indústria de videojogos, como duas opções de hardware diferentes capazes de concretizar conteúdo 4K, HDR, ou a tão badalada realidade virtual, como é que se monta em tempo útil um videojogo de uma série que outrora se mostrou benchmark das consolas em que residiu?
Tal como referiste, os aspetos técnicos deste jogo foram as coisas mais difíceis de alcançar no Gran Turismo Sport. O 4K, 60 frames por segundo, HDR, Wide Colour — tentámos que todas as tecnologias disponíveis estivessem disponíveis no nosso jogo. E para incorporar todas estas tecnologias no jogo, tivemos de desenvolver um novo motor de renderização e tornar toda o conteúdo do jogo o mais leve possível sem baixar a qualidade do produto final.

Relativamente à tecnologia HDR e Wide Colour, tentámos que um dos mais importantes aspetos no Gran Turismo Sport fosse conseguir reproduzir toda a iluminação que conseguimos encontrar no mundo real e incorporá-la no nosso jogo. Isto melhora a experiência porque o jogador pode gozar do mesmo tipo de iluminação no nosso jogo que no mundo real, contribuindo de forma inédita para uma sensação de imersão. Isto foi um trabalho contínuo de quatro anos porque usar estas tecnologias é fácil, mas calcular todos os detalhes, toda a ciência que está presente no mundo real, como o quão brilhante é a luz na natureza, como esta incide na superfície ocular, calcular índices de refração, entre outros, é o verdadeiro desafio. E o produto alcançado acusa a diferença.

Há uma série de parcerias de GT com a indústria automóvel, passando pelo GT Academy que encontra os melhores condutores virtuais e transporta-os para o ambiente de corrida real. Qual é afinal a “missão” de Gran Turismo?
O nosso objetivo com a série Gran Turismo, as parcerias, o GT Academy e todos outros projetos relacionados têm o intuito de promover e contribuir para os jogos de condução desportiva e indústria automóvel. Segundo a minha visão e da Polyphony Digital, é impossível desenvolver um jogo de condução realista sem insight da indústria. Portanto, tudo o que desenvolvemos está ligado aos motores e ao seu respetivo desporto. Tentamos que o nosso jogo expresse a beleza das máquinas nele presente, a beleza da condução. E para isso temos de colaborar com a sua indústria e não apenas desenvolver o nosso jogo.

A nossa missão na Polyphony Digital é fazer o melhor jogo de simulação automóvel possível em cada iteração da série Gran Turismo. A nossa ambição futura é fazer um jogo ainda melhor e mais realista, mas também tentar mostrar, através do nosso jogo, a beleza de todo o desporto, tal como a dos carros. Trabalhar no sentido de cada vez mais ouvir pessoas dizerem coisas como “este jogo foi claramente feito pela Polyphony Digital” e “este jogo é claramente produzido por Kazunori Yamauchi”.

Numa época em que os carros elétricos começam a ser uma preocupação quase consensual em termos globais, qual a sua opinião em relação a eles?
No Gran Turismo é possível apreciar ambas as tecnologias. Relembro que a existência de relógios digitais não extinguiu a existência de relógios analógicos, e o mesmo deverá acontecer com a indústria automóvel. Porém, se estivermos a falar de carros de corrida desportiva de alto nível, iremos sempre ver motores de combustível fóssil no futuro.

Bernardo Tavares, Rubber Chicken