Henrique Chaves, ex-ministro de Santana Lopes, cuja demissão contribuiu de forma decisiva para a queda do Governo PSD/CDS em 2004, faz parte da comissão de honra de Rui Rio à liderança do partido. “É a melhor candidatura. É a única candidatura credível”, diz o ex-ministro adjunto ao Observador. “Sou militante nº 3 do partido e tenho a obrigação de participar na vida do partido e de me preocupar”. Nesse sentido, não acredita que Pedro Santana Lopes — de quem foi apoiante e amigo próximo ao longo de anos — tenha mudado ao longo destes 12 anos: “Não acredito na regeneração das pessoas”, afirma ao Observador.

Numa tarde de domingo em novembro de 2004, Henrique Chaves, então ministro-adjunto de Santana Lopes, apresentou a demissão do Governo através de um comunicado entregue na Lusa em mão pelo seu próprio filho. Os termos eram inéditos, violentos, insólitos: “Não concebo a vida política e o exercício de cargos públicos sem uma relação de lealdade entre as pessoas”. Entre outras notas, acusava Santana Lopes de “grave inversão dos valores de lealdade e de verdade”. Depois acusava o primeiro-ministro de não permitir que exercesse as funções ministeriais sob a sua alçada: “Convidado para ministro Adjunto, nunca me foi dada oportunidade de exercer qualquer função ao nível da coordenação do Governo, própria das funções inerentes a esta pasta”, escreveu Henrique Chaves no comunicado. Depois disto, este militante do PSD — que em 1974 levava o carro do pai pelo país, com Marcelo Rebelo de Sousa, no verão quente, a comícios arriscados no Alentejo — afastou-se da política. Dedicou-se apenas à advocacia.

No discurso de apresentação de candidatura à liderança do PSD, Santana disse que não voltaria a falar destes factos relativos ao fim do seu Governo: “Quanto a 2004 e 2005, vou propor um pacto: eu não falo no passado, não vou falar, não vou comparar as causas da dissolução do Parlamento nessa altura com os factos e os acontecimentos que se seguiram, uns conhecidos na época outros conhecidos mais tarde, outros admitidos posteriormente e à espera de julgamento”. E acrescentou: “O meu nome é Pedro Santana Lopes, assumo tudo o que fiz até hoje, as horas melhores e as horas menos boas, as vitórias e as não vitorias ou as derrotas”.

A Comissão de Honra de Rui Rio, presidida por Paulo Mota Pinto, reúne uma parte da linha cavaquista, com nomes como Nunes Liberato, que foi chefe da Casa Civil de Cavaco Silva durante dez anos em Belém, David Justino (que também esteve com Cavaco como Presidente) Manuela Ferreira Leite ou Joaquim Ferreira do Amaral; a lista de apoiantes notáveis também integra desiludidos do cavaquismo e outros que nunca o foram, como Miguel Cadilhe e Ângelo Correia; junta militantes históricos como Alberto João Jardim, João Bosco Mota Amaral e Amândio de Azevedo; e tem antigos apoiantes de Passos Coelho, como Feliciano Barreiras Duarte (um dos operacionais da campanha), Couto dos Santos, ou Fernando Alexandre.

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Sampaio vs Santana. Fomos comparar as duas versões

A demissão de Henrique Chaves, em 2004, resultou de uma remodelação ministerial que Santana fez numa fase em que o seu Governo já estava enfraquecido. O primeiro-ministro tinha combinado com o então Presidente Jorge Sampaio alterar a composição do Executivo. Sobretudo para resguardar Rui Gomes da Silva, que tinha desencadeado uma polémica terrível que levou à saída de Marcelo Rebelo de Sousa da TVI. Gomes da Silva passava assim de ministro dos Assuntos Parlamentares para ministro adjunto e Henrique Chaves era desgraduado para ficar apenas com as pastas do Desporto, Juventude e Reabilitação. Nuno Morais Sarmento — outro ex-ministro de Santana que é mandatário nacional de Rui Rio — acumularia a Presidência do Conselho de Ministros com a pasta dos Assuntos Parlamentares.

Num primeiro contacto por parte de Santana, Chaves aceitou a perda das funções como ministro-adjunto, mas depois diria ao primeiro-ministro que não estava para “tanta despromoção”. E recusava tomar posse. Discutiram ao telefone. Quando Santana respondeu que se ele não aceitasse o Governo poderia cair, Chaves responderia: “Quero lá saber que caia o Governo!” A versão é de Santana Lopes no seu livro Perceções e Realidades. Mas o ministro acabaria por aceitar e por tomar posse. Jorge Sampaio não fazia ideia da fragilidade da nova configuração governativa. A remodelação ministerial havia de consumar-se com uma cerimónia no dia 24 de novembro no Palácio de Belém, uma quarta-feira mas a tomada de posse dos secretários de Estado passaria para sábado, por razões de agenda. E por outras razões de agenda — sempre envolvidas em polémica — voltaria a ser adiada para segunda-feira.

Nesse domingo, Jorge Sampaio seria interrompido por um assessor, enquanto via um filme no cinema: Chaves demitira-se. No sábado, Cavaco Silva tinha publicado no Expresso o artigo da “má moeda”. Na segunda-feira, Sampaio dava garantias a Santana de que o Governo não ia cair. Mas na terça anunciou a dissolução da Assembleia da República.