Sentado numas escadas nas traseiras do Coliseu dos Recreios, já a noite vai longa, Guilherme Branco mexe no smartphone. Está a enviar à namorada a gravação de uma das músicas ao vivo que os canadianos Destroyer tinham tocado, horas antes, naquela sala, uma das várias que acolheram a edição deste ano do Vodafone Mexefest, esta sexta-feira e sábado na Avenida da Liberdade, em Lisboa. «Eu sei que ela vai gostar. Gostamos muito da banda há algum tempo, mas ela é enfermeira e não conseguiu trocar o turno», conta o jovem de 28 anos. Esta, de resto, é a quarta vez que vem ao festival mais cool do Inverno. «Eu gosto muito de música mais alternativa e tenho um gosto eclético dentro do género, por isso é fácil sair o cartaz do Vodafone Mexefest e eu querer ver pelo menos três ou quatro nomes», revela.

Não muito longe dali, Carla Serrado conversa com alguns amigos depois do concerto de Samuel Úria no Cinema São Jorge, também na primeira noite. «Adorei! Surpreendeu-me pela positiva porque não conhecia muitas coisas dele e gostei que tivesse trazido a Ana Bacalhau e a Gisela João», diz. A jovem de 21 anos, que se estreia no festival para ver «um pouco de tudo, mas principalmente Cigarettes After Sex, Manel Cruz, Childhood e Orelha Negra», acrescenta que um festival como este que agora terminou é da extrema importância. E relevância. «Acho que as pessoas cada vez têm menos tempo para os seus passatempos, no seu dia-a-dia. O Vodafone Mexefest é uma boa forma de ficar a par, num curto espaço de tempo, de muita coisa nova e de qualidade. Descobre-se muita coisa. E gosto desta dinâmica de se andar no centro da cidade de um lado para o outro, um pouco à deriva e sem grande plano de antemão. Encontras sempre alguém», conta a estudante.

Mas se há os que vão ao sabor da maré, há quem consulte religiosamente o programa com os nomes e os horários do cartaz. É o caso de Miguel Frade, de 41, repetente no Vodafone Mexefest. «Vim, essencialmente, para Washed Out, Everything Everything, Destroyer e Moullinex, mas quero espreitar um pouco de tudo», revela. Vinha a conversar com dois amigos sobre os metros que já tinham andado naquela noite, a primeira do festival. «Já nem sabemos, esta semana não precisamos de ir ao ginásio», ri-se. A melhor memória que tem desta iniciativa remonta ao primeiro ano, em 2011. «Foi James Blake ao vivo no Tivoli. Era o nome que mais queria ver nesse ano e lembro-me que existia muito buzz à sua volta na altura. E nunca mais esqueci aquela imagem de olhar à minha volta, quando ele cantava o single The Whilhelm Scream, e ver muitas pessoas com lágrimas no rosto. Isto é especial e fica na memória», frisa Miguel.

Não foi em 2011 mas no ano seguinte que João Grazina, de 34 anos, passou um momento insólito na sua primeira vez no Vodafone Mexefest.«Estava com um grupo de amigos no Tivoli a ouvir Django Django. Estava tudo a dançar, um ambiente espetacular e, do nada, olhei para o chão e vi várias notas de 10€, num total de 40€. Nem sei como vi aquele dinheiro, estava tudo escuro. Mas deu para pagar as bebidas todas do grupo nessa noite», conta, entre risos. O mesmo reforça que o Vodafone Mexefest marca a diferença por ser «importante na divulgação dos artistas e bandas menos comerciais» e pelas salas onde decorrem os espetáculos, «sítios diferentes e alternativos do dito normal para um festival da música. O ambiente é sempre surpreendente», realça.

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E é precisamente no Teatro Tivoli, no sótão [que também é um dos palcos do festival], que um grupo de quatro amigas pede cerveja, enquanto esperam pelo concerto de Julia Holter, na segunda noite do Vodafone Mexefest. Algumas são repetentes mas uma delas, angolana, veio passar férias a Lisboa e aceitou o convite das restantes. «Já aconteceu perdermo-nos umas das outras nas edições do Vodafone Mexefest, por entre as multidões, mas isso é que torna as coisas giras e diferentes. Depois encontramo-nos sempre. Chegamos ao final da noite com os pés cansados, mas felizes», frisa Ana Gonçalo, que também estava ansiosa para ver o concerto de Cigarettes After Sex, Everything Everything e Sevdaliza. Do que já viu nos outros anos, recorda com especial carinho as atuações de James Blake, Benjamin Clementine. «Foram muito emotivos», frisa.

Para André Garrido, fã de Destroyer, este é o segundo Vodafone Mexefest. O primeiro calhou no aniversário de um amigo: «Foi há três anos porque estávamos no primeiro ano da faculdade. Ele queria muito ver Kindness e alguns de nós juntámo-nos. Foi giro, um aniversário diferente. Fica na memória, sem dúvida».

Na memória de Diana Gaspar, por seu lado, vão ficar os concertos que Washed Out e Moullinex protagonizaram. Ainda que seja uma amante de música, esta é a sua primeira vez a participar no festival mais cool desta altura do ano. «Decidi experimentar pela diversidade de bandas que pude conhecer e por ser um conceito diferente do que estamos habituados em outros géneros de festivais». «O conceito de se passar em várias salas emblemáticas e outras fora da caixa é muito interessante, traz dinâmica e é uma oportunidade de conhecermos locais que dificilmente conheceríamos de outra forma», conta,

De volta ao Coliseu, um casal abandona a sala abraçado e vestidos a rigor. Ela com uma T-shirt de Sade, ele com uma de Prince. Amantes de música, já vieram a três edições do festival. «Nós, já por si, somos muito festivaleiros. Vamos a vários e temos um grupo de amigos que vem connosco e que é quase sempre o mesmo, com um ou outro elemento a mais ou a menos, consoante a disponibilidade», conta João Paulo, enquanto olha para a namorada. «Gostamos deste livre arbítrio de andar de um lado para o outro, gostamos de conhecer novos talentos da música ainda pouco conhecidos, de entrarmos numa das salas e sermos surpreendidos pela positiva. E também como muita gente vem ao festival, acabamos por ficar amigos de outras pessoas, amigos de nossos amigos», acrescenta o jovem de 26 anos, com um copo de plástico com café na mão, para repor energias. «Aqui, há quem venha pelo ambiente, ou pela música, mas sempre pelas razões certas. Ninguém anda aqui o dia todo a tirar selfies para publicar nas redes sociais. É isso que eu gosto», remata.

O relógio mostra as duas da manhã quando Moullinex, no último concerto da última noite, se despede de um Coliseu dos Recreios inteiro a dançar e a rebentar pelas costuras. «Epá, foi brutal», ouve-se na plateia. A parte má é que tudo o que é bom acaba. A parte boa é que para o ano há mais.