Com menos de um ano de existência, a Nintendo Switch tem sido palco para o relançamento de muitos títulos do passado recente, como é o caso de Bayonetta 1 e 2, dois dos melhores exemplos de jogos de acção de sempre, relançados para a consola híbrida da Nintendo na passada sexta-feira. Em rigor, o que foi comemorado foi o relançamento de Bayonetta 2, trazendo a reboque o primeiro jogo que, na compra dos dois, fica alguns euros mais barato (o conjunto fica por 59,99 euros).

Para percebermos a importância que Bayonetta (originalmente lançado em 2009 como multi-plataforma) e Bayonetta 2 (lançado em exclusivo na Wii U em 2014) têm no mercado dos videojogos, temos antes de conhecer a influência do seu criador e do seu estúdio. Em meados da década passada, e depois de criarem alguns dos maiores sucessos da época, três autores japoneses despediram-se da gigante Capcom, que dissolveu o estúdio ao qual pertenciam. Entre eles estava Shinji Mikami, autor de Resident Evil, Hideki Kamiya, criador de Okami e Devil May Cry, e Atsushi Inaba, que tinha trabalhado com os dois anteriores nos seus projectos. Juntos fundaram a PlatinumGames, que se tem notabilizado na criação de jogos de acção. Bayonetta, de Kamiya, foi um dos seus maiores sucessos.

Bayonetta veio assim cimentar o trabalho que Kamiya tinha começado. O seu estilo e a sua abordagem tornaram-se o padrão dos jogos de ação hack ‘n slash, um género que dá prioridade ao combate, às suas dinâmicas e às espectacularidades, mantendo o jogador imerso num jogo intenso e sempre frenético, com muitos inimigos para combater ao mesmo tempo.

Mas a PlatinumGames e Kamiya quiseram ir mais longe, tomando uma série de decisões criativas e provocatórias que que permitiram que Bayonetta ficasse sob o foco da atenção mediática. A protagonista e titular Bayonetta é uma bruxa com um catsuit magicamente criado, com pistolas nas mãos e nos saltos dos sapatos, que combate as hostes divinas por razões que nem sequer o próprio enredo deixa perceber muito bem. A bem da verdade, não é pela coesão ou qualidade da narrativa que os dois Bayonetta foram um sucesso, mas sim por abraçarem o absurdo, o exagero. A sensualidade da protagonista e de outros membros do elenco, resvala rapidamente para uma sexualidade risível, onde o ridículo anda de mãos dadas com a violência, num festival constante de dinamismo e efeitos. Bayonetta é a apologia to kitsch  e uma série assumidamente barroca na sua abordagem.

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A violência e o tom sexualizado são apenas duas das razões pelas quais o jogo está definido como sendo para adultos. Outra é a acção absurdamente frenética. No combate contra anjos (cuja representação diverge muito da que temos na nossa cabeça) e demónios, utiliza-se um número reduzido de botões para criar combinações de golpes, com a protagonista a percorrer o ecrã destruindo e mutilando todos os inimigos que se atravessam no seu caminho.

Tendo sido Bayonetta 2 um exclusivo da Wii U, o número de jogadores que teve a oportunidade de o jogar foi bastante reduzidos por causa das fracas vendas da plataforma, facto que a chegada à Nintendo Switch vai mudar, especialmente numa altura em que é sabido que o terceiro jogo será um exclusivo desta consola.

O port para a Switch de Bayonetta 2 herdou da versão da Wii U a possibilidade de controlarmos todo o jogo através do ecrã táctil, elemento que foi também adicionado ao primeiro título, que nunca tinha tido este tipo de controlo. Mas a diferença de utilização das duas consolas demonstra o quanto se faca a perder na nova versão, já que a utilização nossos dedos no ecrã da Switch é menos precisa do que a caneta da Wii U. Somando a isto a perda de detalhe no modo portátil, é fácil perceber que a melhor forma de usufruir dos dois Bayonetta em toda a glória é na nossa TV, onde a febre do hiper-detalhe e decoração que os compõem pode ser verdadeiramente admirado.

O lançamento destes dois títulos para a Nintendo Switch é a oportunidade perfeita para quem nunca os jogou de finalmente conhecer dois marcos da história recente dos videojogos de ação. Sem grandes diferenças (nem sequer visuais) entre os lançamentos anteriores e este port, Bayonetta 1 e 2 ficam, na Switch reservados, para fãs ou para estreantes da série. Com tantas tentativas de se fazer de um objecto algo que não é, Bayonetta assume-se verdadeiramente kitsch — e sem qualquer vergonha disso,. Pelas horas de diversão, pela honestidade no absurdo e pela ação frenética de controlar uma personagem com pistolas nos saltos dos sapatos, só lhe temos a agradecer.

Ricardo Correia, Rubber Chicken