Apresentou-se com os característicos óculos de sol, preparada para contar histórias. Como estava numa universidade, começou por responder a uma pergunta sobre se os artistas de música pimba se sentem menosprezados por não suscitarem interesse académico. “Nada diminuída e não me incomoda o rótulo que atribuem ao género de música que faço”, explicou Rosinha.
“O que me dá prazer é chegar aos espetáculos, ter os recintos cheios e as pessoas saberem as músicas de cor. Faço bastantes festas académicas e uma vez, no Instituto Superior Técnico, um grupo de estudantes de engenharia mecânica tinha um cartaz a dizer: ‘Rosinha, deixa-me mudar-te o óleo’. Nunca mais me esqueci. As pessoas sabem que podem brincar comigo. A vida tem de ser levada assim, a brincar.”
Foi quarta-feira, ao fim da tarde, no terceiro encontro do ciclo de tertúlias “Chá das 5”, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH), da Universidade Nova de Lisboa. A música pimba foi o tema em discussão.
A cantora de “Eu Levo no Pacote” (tema de Páquito Braziel e Nuno Eiró), cuja carreira na música pimba começou há apenas 11 anos, definiu-se como “do povo, com muito orgulho”. “Fui, sou e serei do campo”, sublinhou, perante um auditório com várias dezenas de estudantes.
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Nascida há 47 anos em Pegões, concelho do Montijo, Rosinha começou a tocar acordeão aos 10 e estudou no Instituto Musical Vitorino Matono, em Lisboa. Deu os primeiros concertos aos 17, como acordeonista. “Se me disserem para cantar uma música agora, não sei a letra, tenho que estar com o acordeão. Nunca cantei sem tocar”, disse na tertúlia.
Em 2007, lançou o primeiro disco de originais, Com a Boca no Pipo, pela mão do compositor e produtor Páquito Braziel, antigo colega de escola.
“Fica mal dizer que se gosta de música pimba, mas a pessoa até gosta”, analisou. “Socialmente, é desfavorável, é melhor dizer que se gosta de música de elites. Isto no inverno. Chega o verão, o pessoal despe-se, vai buscar uma ‘jola’, e aí já é na passarinha, é de gatas, é no pacote, tudo. Sempre lhe chamei música popular, porque isto tem uma origem. O pimba tem o ritmo da música popular, das nossas marchas e os nossos malhões.”
Sobre a mistura recente da música pimba com outros géneros, como a kizomba ou o kuduro, Rosinha comentou que “é o mercado a funcionar”. “Além disso, o kuduro, com a minha idade, já não há”, acrescentou.
Disse admirar as vozes de Amália Rodrigues e de Paulo de Carvalho e que costuma ouvir Sara Tavares e D.A.M.A. “Nunca fiz um concerto ao vivo em playback e quando vou à televisão sempre que posso canto ao vivo.”
Explicou que faz mais concertos em Portugal entre junho e setembro, com cerca de 18 canções durante uma hora e meia, e que fora do país é na Suíça e em França onde atua mais vezes.
“Se música é transmitir sentimentos e emoções através do sons, estou a conseguir. Estou muito bem com a vida e tento transmitir isso às pessoas”, disse.
Quanto aos métodos de promoção, explicou que o tradicional envio de discos para ranchos e coletividades ainda funciona, ao lado de uma presença forte nas redes sociais da internet.
“Entre o dia 10 e 16 de maio, todos os anos, sai um disco meu e é enviado a empresários, colectividades, ranchos, associações, câmaras municipais, porque é daí que aparecem os convites para cantar. Os convites acarretam cachet, estadia, alimentação e passagens, tudo pago pela entidade que me contrata.”
A tertúlia foi organizada pelo Núcleo de Estudantes de Ciências Musicais e do Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical (CESEM). A moderação esteve a cargo de duas investigadoras do CESEM: Isabel Pina, doutoranda em Ciências Musicais Históricas, e Mariana Ramos de Lima, aluno de mestrado em Ciências Musicais.
Também na mesa esteve Andrea Musio, investigador do Instituto de Etnomusicologia, da FCSH, que está a preparar uma tese de doutoramento sobre a relação dos emigrantes portugueses com a música pimba.
As organizadoras justificaram o convite a Rosinha com o facto de se tratar de uma mulher “numa indústria dominada por homens” e da artista “mais galardoada” do pimba nacional.
A cantora reconheceu que ser mulher a impede de usar “algumas expressões que se permite a um homem cantar”.
“É cultural”, justificou. “Acabo por dizer a mesma coisa que eles, só que de outra forma. Damos uma voltinha à letra e parece que eu não disse. Mas tem que se ter esse cuidado, sem dúvida alguma. Caso contrário, deixaria de ser conotada com o pimba e passaria a ser considerada pornochachada.”