Não se ouvia um ministro falar de crenças ou superstições desde que, em novembro de 2015, João Calvão da Silva, então com a pasta da Administração Interna do segundo Governo de Passos Coelho (que durou apenas 11 dias, a que se juntaram 16 dias já demissionário), comentou os estragos que a chuva provocou no Algarve falando de “fúria da Natureza” e de um “Deus [que] nem sempre é amigo”. Esta sexta-feira, foi o ministro da Cultura de António Costa, Luís Filipe Castro Mendes, a proferir convictamente: “Vamos superar a maldição do arquiteto”.
Castro Mendes referia-se, com humor, ao estado inacabado do Palácio Nacional da Ajuda, que deverá ficar concluído no primeiro trimestre de 2020, mais de 200 anos depois da primeira interrupção na sua construção — mas também à suposta maldição que rodeia a obra desde que esta aconteceu, no reinado de D. João VI, em 1807, aquando da fuga da Família Real portuguesa para o Brasil. As obras incluem a construção de uma sala de jóias onde se irá instalar (em exposição) a valiosa colecção do Tesouro Real português.
[Como ficará o Palácio Nacional da Ajuda, depois da conclusão das obras, isto é, “no primeiro trimestre de 2020”:]
Quanto ao orçamento previsto, este aumentou de 15 para 21 milhões de euros e o prazo de conclusão estende-se agora até “ao primeiro trimestre de 2020”, foi anunciado esta manhã, em conferência de imprensa que contou com a presença do ministro da Cultura, do presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, do arquiteto que coordenou o projeto, João Carlos dos Santos, da diretora-geral do Património Cultural, Paula Araújo da Silva e do diretor-geral da Associação de Turismo de Lisboa, Vítor Costa.
As obras, que arrancaram agora, serão custeadas por três entidades: o Ministério da Cultura, que vai pagar quatro milhões de euros (valor que o Estado português recebeu de seguro após o roubo de jóias da coroa portuguesa na Holanda, no início do milénio), a Associação de Turismo de Lisboa, que investirá cinco milhões de euros e a Câmara Municipal lisboeta, que pagará o restante (12 milhões de euros) recorrendo aos fundos de receita da taxa municipal turística da cidade.
Dizia-se que este palácio jamais seria terminado porque havia uma maldição do arquiteto. A construção foi suspensa com a ida da Família Real para o Brasil e nunca foi rematada, nem segundo o plano original nem segundo planos posteriores — e houve várias tentativas de remate. Nós vamos superar a maldição do arquiteto porque temos um bom arquiteto [João Carlos dos Santos] e porque há vontade política do Governo e da Câmara Municipal de Lisboa, que estabelecem aqui uma parceria única”, disse o ministro da Cultura.
Lembrando que o projeto “exige padrões de segurança muito exigentes”, até pelo elevado valor das jóias da Coroa Portuguesa que estarão expostas de forma permanente no Palácio Nacional da Ajuda a partir de 2020, os responsáveis pela projeção da conclusão do antigo Palácio Real lisboeta adiantaram, por exemplo, que “a caixa forte que vai encerrar a exposição [das jóias] terá nove metros de largura por 40 de comprimento e 12 de altura” e que o plano “conservador” de viabilidade económico-financeira da requalificação do palácio prevê “cerca de 250 mil visitantes por ano” após conclusão da estrutura.
Melhorado desde a sua última apresentação pública (incluindo, por exemplo, a construção de uma nova escadaria — pode ver as fotografias virtuais do projeto na fotogaleria em cima), a requalificação do Palácio Nacional da Ajuda “é um projeto único”, disse Fernando Medina, presidente da autarquia lisboeta.
Não haverá muitos responsáveis públicos que tenham a oportunidade de tomar uma decisão com o carácter único que esta tem, de completar o Palácio mais de 200 anos depois da interrupção da sua edificação. Este será o primeiro projeto financiado com fundos de receita turísticos da cidade”, lembrou o presidente da CML.
Também o ministro da Cultura sublinhou esse factor, defendendo que “cada vez mais o turismo e a cultura estão juntos, porque a atratividade turística passa muito pelos nossos monumentos, tradições, arte. Em suma, pela nossa cultura”. Quanto às razões para o aumento do valor orçamentado para a conclusão do Palácio, foram referidas três causas: “não estava incorporada uma intervenção no espaço do público do lado da calçada da Ajuda”, que irá acontecer, “foram acrescentadas algumas intervenções, nomeadamente a construção de um restaurante de grande categoria adjacente ao museu”, que irá somar à cafetaria já existente, e “em termos de segurança houve recomendações entretanto feitas que têm de ser incorporadas”.