O Parlamento aprovou esta sexta-feira a nova lei da identidade de género, que permite a mudança de sexo no cartão do cidadão a partir dos 16 anos e que acaba com a obrigatoriedade de ter de se apresentar um relatório para o fazer.

A lei foi aprovada em votação final global pelo PS, BE, PEV e PAN, a que se juntou o voto da deputada social-democrata Teresa Leal Coelho. PSD e CDS votaram contra. A votação acabou por ser contabilizada em função do número total de deputados de cada bancada, não tendo sido uma votação cabeça a cabeça. PSD tinha disciplina de voto contra, e no PS havia liberdade de voto. No final, os números são claros: 109 votos a favor e 106 votos contra.

O texto que foi a votos substitui a proposta de lei do Governo e os projetos de lei do BE e do PAN que entraram no Parlamento há um ano e baixaram à comissão sem votação, desencadeando um longo processo de audições. Os partidos acabaram por retirar os seus diplomas a favor de um texto único.

O PCP absteve-se no pedido de avocação a plenário, feito pelo PS, de dois artigos específicos: o que dizia respeito o requerimento para a mudança da menção do sexo no cartão do cidadão e a consequente alteração do nome próprio, em que bastaria à pessoa indicar o número de identificação civil e o novo nome próprio pelo qual pretende vir a ser identificada; e o que dizia respeito à norma revogatória sobre o diploma atualmente em vigor. Na votação final global do texto final, o PCP também se absteve.

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Esta quinta-feira, na véspera da votação, Bloco de Esquerda, PS, PEV e PAN tinham a expectativa de que o projeto de lei fosse aprovado, mas ninguém arriscava contas. É que, com o PS a dar liberdade de voto e o PCP a abster-se, a ausência de um ou dois deputados podia fazer a diferença — se a votação fosse nominal. Mas a votação acabou por ser por grupo parlamentar, o que resolveu o problema que seria desencadeado por eventuais baixas e ausências inesperadas de deputados. Bastava três deputados que votariam a favor faltarem para o documento já não ser aprovado.

No PSD nem todos tinham o mesmo entendimento, havendo quem achasse que a matéria era de consciência e que, por isso, devia haver liberdade e não disciplina de voto. E quem considerasse que o que estava em causa não era se o legislador era a favor ou contra o direito à autodeterminação de género, mas sim a forma como processo de mudança de sexo se concretizava: a bancada do PSD mostrou-se contra a lei por querer inscrever no texto a obrigatoriedade de apresentação de relatório médico que comprovasse a disforia de género e a ausência de complicações psíquicas.

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O texto final, agora aprovado, vai assim permitir que maiores de 16 anos possam alterar o seu género e nome próprio no registo civil, apenas mediante requerimento e sem necessidade de recorrer a qualquer relatório médico. Entre os 16 e os 18 anos, este procedimento terá de ser autorizado pelos representantes legais. O diploma proíbe ainda, “salvo em situações de comprovado risco para a saúde”, intervenções cirúrgicas ou farmacológicas que impliquem alterações do corpo ou características sexuais dos bebés e crianças intersexo.

Depois da votação, ouviram-se palmas de ativistas de defesa dos direitos LGbTi presentes nas galerias. Os aplaudos foram acompanhados por vários deputados do BE, do PS e do PAN que se voltaram para as galerias, mesmo perante os pedidos de “contenção” de Ferro Rodrigues.