“The wait is over”. O mote está dado. É o regresso de Conor McGregor ao octógono da MMA (artes marciais mistas), quase dois anos depois da última vez que pisou o ringue para combater no Ultimate Fighting Championship (UFC). O evento que decorre este sábado à noite na Arena T-Mobile, em Las Vegas, é considerado o grande combate dos últimos tempos do UFC e há outra razão, para além do regresso do irlandês, que o torna já um sucesso: o acerto de contas com o invicto Khabib Nurmagomedov, o atual detentor do título de pesos leves e o grande adversário de McGregor.
Para se perceber a importância deste combate, é necessário voltar atrás na história. Mais concretamente a novembro de 2016, o último combate do também conhecido como “Notorious” e, precisamente, o combate que lhe deu o título de campeão de pesos leves do UFC, no Madison Square Garden, contra Eddie Alvarez. McGregor tornava-se, assim, o primeiro lutador do UFC a deter dois títulos diferentes em simultâneo: o de peso pluma e o de peso leve. Mas havia mais surpresas a chegar e em dois anos muita coisa mudou.
Seguiu-se aquele que foi considerado o “combate do século”, em agosto de 2017, contra Floyd Mayweather, no qual o irlandês saiu derrotado a0 10.º assalto, mas ganhou o suficiente para nunca mais precisar de entrar num ringue: cerca de 100 milhões de euros. E esta foi, de facto, a última vez que McGregor entrou num ringue (pelo menos para lutar). Mas, mesmo assim, o lutador mais conhecido da MMA não foi esquecido. Passado pouco mais de um ano desde o “Moneyfight”, por onde andou e o que tem feito McGregor?
Os rumores, a máfia irlandesa e a invasão do ringue
Em outubro de 2017, McGregor faz a sua primeira aparição em público depois da derrota contra Mayweather, numa sessão de perguntas e respostas com os fãs em Glasgow. A especulação sobre uma possível perda do título do UFC já pairava no ar (devido ao elevado tempo sem combater e sem defender o título na categoria de peso leve), mas o irlandês não hesitou em deixar um recado: “A pergunta que recebo sempre é quando vou defender o cinturão e legitimar o desporto e os rankings. Talvez agora seja uma boa hora de fazer isso e calar a boca dessas pessoas”, disse na altura.
Dana White, presidente do UFC, chegou mesmo a pensar que a hipótese de McGregor não voltar a combater poderia ser mais séria do que muita gente pensava, tendo em conta que o dinheiro já não era um problema. “O tipo tem 100 milhões de euros”, disse aos jornalistas. “Tentem acordar e levar socos na cara como ganha-pão quando têm 100 milhões de euros no banco”, explicou Dana White, acrescentando que “no final do dia” vai ser apenas ele quem continua a gerir o negócio do UFC. “Se o Conor quer voltar a lutar, nós claramente que queremos que o Conor volte. Mas se ele quiser ir embora e não lutar mais, faz parte do jogo”, referiu, citado pelo Business Insider.
Até ao final de 2017, a vida do lutador irlandês girou muito em volta deste assunto. Mas — e as palavras que se seguem são quase sinónimo de McGregor — o ano também teve as suas polémicas e conflitos. Em dezembro, protagonizou um episódio que envolveu, primeiro, excesso de velocidade na estrada e depois a…máfia irlandesa. McGregor estava num bar nos subúrbios de Dublin, quando, depois de uma troca de insultos, deu um murro a um homem com cerca de 50 anos. O problema? Esse homem era o pai de Graham, “The Wig” Whelan, uma das principais figuras dos Kinahan, grupo irlandês conotado com o narcotráfico.
McGregor foi a tribunal, deu show mas agora meteu-se com quem não devia: a máfia irlandesa
Entrou numa luta, sem que o procurasse, com um grupo de pessoas muito perigosas que estão ligadas aos Kinahans. Com estas pessoas não interessa se és o Conor McGregor ou se és ou não conhecido ou poderoso. Devemos recordar que estas pessoas não têm limites”, escreveu o jornalista do Irish Independent Paul Williams, citado pelo La Vanguardia.
Um mês antes deste episódio, o lutador foi notícia quando estava na plateia e decidiu invadir um ringue no Bellater em Dublin, empurrando o árbitro Marc Goddard. No final, e depois de ter sido afastado do local, o lutador recorreu às redes sociais para pedir “as mais sinceras desculpas” sobre o sucedido, justificando que se deixou levar pelas emoções quando o árbitro do combate estava “a tomar uma horrível decisão ao tentar levantar do chão um lutador que estava inconsciente, forçando a que o combate continuasse para uma segunda ronda”. Confessou ainda que agiu assim porque a situação o relembrou do português João Carvalho, que morreu no ringue durante um combate.
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A perda do título de pesos leves
À medida que os dias foram passando, McGregor continou sem lutar e, em fevereiro deste ano, Dana White começou a perder a paciência. “O Conor diz que está a pensar em voltar apenas em setembro e isso são quase dois anos sem lutar. Não pode acontecer“, disse o líder do UFC à FOX Sports. “Eu adoro Conor, respeito o Conor e adoro tudo o que ele fez por este negócio, mas o cinturão tem que seguir em frente”, admitiu White.
Das ameaças, passou à ação. Entre fevereiro e abril, McGregor ficou mesmo sem o título de campeão de pesos leves, conquistado em 2016. Em causa esteve o facto de o lutador não combater para defender o título desde novembro desse ano. Nessa altura, Dana White explicou que o novo campeão, que mais tarde seria Khabib Nurmagomedov, não ia ganhar o título interino, mas sim o título absoluto.
O presidente do UFC garantiu também que McGregor não estava chateado com a situação e que “entende que o peso leve precisa de seguir em frente e os negócios também”. Também aí, disse que iria compreender se o irlandês não voltasse a lutar.
Gostava que ele enfrentasse o vencedor do confronto Khabib vs Ferguson, mas ele já ganhou muito dinheiro e quer ficar algum tempo sem lutar, é normal. Acredito que existe ainda a possibilidade de que nunca mais volte a lutar depois do que já ganhou”, acrescentou.
O negro mês de abril
No dia 5 de abril, McGregor viveu aquele que foi o episódio mais violento e talvez a polémica mais conhecida da sua carreira. E mais uma vez envolve Khabib Nurmagomedov. O irlandês apareceu de surpresa no Barclays Center, em Brooklyn, alegadamente à procura do lutador russo para defender o amigo Artem Lobov, por causa de uma suposta discussão entre os dois.
Com ele trouxe mais 10 pessoas que invadiram uma conferência de imprensa de antevisão do evento UFC 223 e, segundo os vídeos divulgados, correram de seguida atrás do autocarro com vários lutadores lá dentro e arremessaram objetos, incluindo um carrinho de transporte de carga, partindo um vidro e provocando ferimentos não em Nurmagomedov, mas em Michael Chiesa e Ray Borg, cujas lutas foram canceladas.
McGregor e o restante grupo terão conseguido ter acesso à zona dos autocarros graças a membros da Mac Life, um site de notícias que pertence ao lutador irlandês e que tinha credenciais para frequentar aquela zona do pavilhão.
yoooooo… first time seeing this one. Conor has legit lost his mind. pic.twitter.com/XcLFd2FIMo
— caposa (@Grabaka_Hitman) April 5, 2018
Depois de o grupo fugir, a polícia emitiu um mandado de detenção de McGregor e das restantes pessoas e o mundo do MMA estava chocado com o que tinha acontecido. Na altura, foi o próprio presidente da competição a classificar o ato como “a coisa mais repugnante na história da UFC”. “É um ato criminoso, nojento, que me provoca vómitos”, acrescentou o norte-americano.
Dos lutadores que foram atacados, Michael Chiesa ficou com cortes na cabeça e no rosto e um funcionário ficou também ferido. McGregor acabou por se entregar às autoridades e foi acusado de três crimes de agressão e vandalismo pelo Departamento da Polícia de Nova Iorque. Um dia depois, foi libertado sob o pagamento de uma fiança de 50 mil euros.
A marca de whisky em homenagem à terra natal
Fora dos ringues, McGreagor também tem criado novos projetos e divulgado a sua marca. No mês passado, através do Instagram, anunciou a sua própria marca de whisky irlandês: o “Proper No.12”. O nome foi escolhido em homenagem ao bairro onde cresceu na Irlanda. “Venho de um subúrbio chamado Crmulin, em Dublin. É um lugar que está no meu coração. Foi onde aprendi a lutar e isso fez-me ser quem sou hoje”, explicou o lutador na publicação.
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Mas, não é só: McGregor anunciou que vai doar uma parte do dinheiro de cada garrafa vendida aos serviços de emergência de cada cidade onde a bebida está à venda. “Os socorristas em todo o mundo são os heróis anónimos que agem com coragem e respondem diariamente às chamadas para ajudar as pessoas necessitadas. Tenho um grande respeito por estes homens e mulheres”, sublinhou.
O grande regresso e um adversário de peso
Seis de outubro de 2018. Foi esta a data anunciada para o regresso de McGregor. E regressa não só para encarar o seu grande rival, mas também para voltar “ao jogo pelo qual se apaixonou”, disse no dia do anúncio. O adversário que tem pela frente é nada mais nada menos que Khabib Nurmagomedov.
Ainda antes do combate, o espetáculo já tinha começado na conferência de imprensa em que foi anunciado. Lado a lado, apenas separados por Dana White, McGregor, acompanhado dos seus dois cinturões, não esqueceu o que fez em abril, confrontou Khabib e afirmou que se o russo tivesse tido coragem de sair do autocarro “estaria morto neste momento”, aproveitando para oferecer o whisky que estava a beber a Nurmagomedov, que é muçulmano e não bebe álcool.
Por sua vez, Khabib Nurmagomedov respondeu com a lembrança da derrota frente a Floyd Mayweather: “Vou destruir-te. Depois deste combate, vais voltar para o boxe. Eu sou o Floyd Mayweather do MMA”, rematou. Os bilhetes para o combate esgotaram poucos minutos depois de serem colocados à venda e foi também batido o recorde de vendas em pay-per-view (PPV), que permite que as pessoas consigam ver a luta pela televisão. Em Portugal, o combate vai ser transmitido pela Sport TV 5.
Se, por um lado, McGregor é a maior figura da modalidade, o único a possuir dois títulos simultâneos em categorias diferentes, e ambiciona ter um regresso em grande, por outro lado os números de Nurmagomedov também são fortes: 26 combates, 26 vitórias. O russo detém o recorde do maior período apenas com vitórias em MMA.
Texto editado por Nuno Vinha