“Vivo uma situação paradoxal. Apoio esta solução governativa, o PS está no poder e, no entanto, por vezes sinto a minha liberdade pessoal ameaçada”. Quem o diz é Manuel Alegre, militante histórico do PS, numa carta aberta ao primeiro-ministro António Costa, publicada esta quarta-feira no jornal Público.

Não é que Manuel Alegre não seja adepto do governo da “geringonça”, porque é desde o primeiro dia, mas isso não o impede de fazer uma crítica explícita àquilo que descreve como a “tentação [do Governo] de interferir nos gostos e comportamentos das pessoas” — ou a tentação de “protagonismo de alguns deputados e governantes que ninguém mandatou para reordenarem ou desordenarem a nossa civilização”.

Afirmando que não aceita a tentativa do Governo de impor um gosto particular, Alegre diz que tal comportamento “cheira a totalitarismo” e ameaça a liberdade, que é a “essência e a alma do PS”. Em causa está uma das polémicas do momento — a redução do IVA para os espetáculos discriminando a tauromaquia –, assim como a proposta do PAN para alterar o regime jurídico da caça. Para Manuel Alegre, não deve ser o Governo a prejudicar atividades que fazem parte da “tradição cultural e social da nossa civilização”, e que dizem respeito ao “emprego e à vida de milhares de pessoas”.

“É chegada a hora de enfrentar cultural e civicamente o fanatismo do politicamente correto. É uma questão de liberdade. Liberdade para não gostar de touradas. Mas liberdade para gostar. Liberdade para não gostar da caça. Mas liberdade para gostar. Algo que não se pode decidir por decreto nem por decisões impostas por maiorias táticas e conjunturais. Não é democrático. Para mim, que sou um velho resistente, cheira a totalitarismo. E não aceito”, escreve o escritor e poeta no jornal Público.

É por isso que Alegre se dirige diretamente a António Costa. “Por isso, meu caro António Costa, peço-lhe que intervenha a favor de valores essenciais do PS: o pluralismo, a tolerância, o respeito pela opinião do outro”, diz, pedindo que o primeiro-ministro interceda pela descida de 6% do IVA para todos os espetáculos sem discriminar a tauromaquia, “já que os prejudicados serão os mais pobres, os trabalhadores que tornam possível este espetáculo”, e pedindo que se oponha à proposta do PAN para alterar o regime jurídico da caça. Segundo Alegre, “estão em causa centenas de postos de trabalho e elevadas perdas económicas para o país, sobretudo para aquelas regiões onde a empregabilidade e a atividade económica estão quase exclusivamente ligadas à caça”.

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