“Estou a sair do pior momento da minha vida e a única coisa que quero é abraçar a minha filha”. Foram estas as palavras de Bruno de Carvalho após ter saído de cinco dias de detenção no posto da GNR de Alcochete, por suspeita de envolvimento no ataque à Academia do Sporting em maio. Na chegada à sua residência, e vindo do Tribunal do Barreiro, o antigo presidente do Sporting admitiu que estes cinco dias “foram marcantes” e assume que volta “uma pessoa diferente”. “Só quem passa por esta situação percebe o quão diferente é um ser humano quando é privado de coisas tão simples”, disse Bruno de Carvalho em declarações aos jornalistas, não adiantando mais pormenores sobre a detenção. “É um Bruno diferente que sai daqui, não sei se melhor, se pior, quer a nível pessoal quer a nível profissional”.

O juiz de instrução Carlos Delca não encontrou “indícios fortes” contra Bruno de Carvalho, nos elementos apresentados pelo Ministério Público. É isso que sustenta a decisão de não aplicar as medidas de coação mais graves. No comunicado enviado às redações, o magistrado explica que, quer para o antigo presidente do Sporting, quer para Nuno Mendes, conhecido como Mustafá, foram encontrados indícios, sim, da prática dos crimes de ameaça agravada, ofensa à integridade física qualificada, sequestro, dano com violência, detenção de arma proibida agravada e terrorismo, mas apenas no caso do tráfico de droga, imputado ao líder da Juve Leo, os indícios são “fortes”.

Serem “fortes” é condição essencial para que um juiz de instrução aplique as medidas de coação mais pesadas, como a prisão preventiva ou a prisão domiciliária, por exemplo. E, assim sendo, Carlos Delca entendeu que não o poderia fazer — tendo em conta também que, no caso do tráfico de droga, as buscas permitiram apreender apenas 15 gramas de produto estupefaciente.

Assim sendo, os dois arguidos ficam apenas obrigados a apresentar-se todos os dias numa esquadra da PSP ou posto da GNR das suas áreas de residência. Terão também de pagar 70 mil euros de caução.

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“Não sou traficante, não sou terrorista, sou o líder da Juventude Leonina”

À saída do Tribunal do Barreiro, Nuno Mendes mostrou-se muito indignado pelo facto de ter sido detido. Aos jornalistas, entre os gritos dos apoiantes, negou ter sido o mandante do ataque à Academia de Alchochete, dizendo que “se o tribunal entendesse isso, não estava aqui fora”. “Não sou traficante, não sou terrorista, sou o líder da Juventude Leonina”, insistiu Mustafá, garantindo que não sai satisfeito, apesar de estar em liberdade.

Mustafá à saída do tribunal do Barreiro na noite da passada quarta-feira

Apesar das medidas de coação mais leves do que as aplicadas à esmagadora maioria dos suspeitos detidos desde 15 de maio, o juiz Carlos Delca diz que estão em causa os perigos de fuga e de perturbação do inquérito, tal como o alarme social, tendo em conta “natureza dos ilícitos em causa” e a “visibilidade social que a prática dos mesmos implica”. Além disso, destaca que “a atuação dos arguidos revela um manifesto desprezo pelas consequências gravosas que provocam nas vítimas“.

As medidas de coação foram anunciadas ao final da manhã desta quinta-feira. A greve parcial dos funcionários judiciais acabou por atrasar uma hora esse anúncio, mas o último comunicado desta diligência acabou finalmente por sair: Bruno de Carvalho, antigo presidente do Sporting, e Nuno Mendes (ou Mustafá), líder da Juventude Leonina, vão aguardar julgamento em liberdade, sendo assim recusado o pedido do Ministério Público de prisão preventiva, como foi explicado em comunicado pelo Juízo de Instrução Criminal do Barreiro do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa esta manhã.

“O Juízo de Instrução Criminal do Barreiro do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, informa os senhores jornalistas que, devido à greve parcial dos senhores oficiais de justiça, só agora foi lido o despacho que aplicou as medidas de coacção aos arguidos agora detidos na sequência do processo n.º 257/18.0 GCMTJ instaurado pelos factos ocorridos na Academia do Sporting Clube de Portugal.

Mais informa que a ambos os arguidos, BRUNO MIGUEL AZEVEDO GASPAR DE CARVALHO e NUNO MIGUEL RODRIGUES VIEIRA MENDES tendo em conta que se verificam indícios da verificação dos pressupostos objetivos e subjetivos dos tipos de crimes que lhes são imputados:

– vinte crimes de ameaça agravada, p. e p. pelo artigo 153º, n.º 1 e 155°, nº1, alínea a) do Código Penal;

– doze crimes de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigo 143º, n.º 1 e 145º, n.º1, alínea a), n.º 2 por referência à alínea h) do n.º 2, do artigo 132° do Código Penal de:

– vinte crimes de sequestro, p. e p. pelo artigo 158°, n.º 1 do Código Penal;

– dois crimes de dano com violência, p. e p. pelo artigo 212°, n.º 1, e 214º, n.º1, alínea a), do Código Penal;

– dois crimes de detenção de arma proibida agravado, p. e p. pelo artigo 86°, n.º1, alínea d) e 89°, por referência ao artigo 2°, n.º 5, alínea af) e q) e 91°, n.º1, alínea a) e nº 2 da Lei n.º 5/2006, de 23.02;

– um crime de terrorismo, p. e p. pelo artigo 4º, n.º 1, por referência ao artigo 2º, n.º1, alínea a) da Lei n.º 52/2003, de 22.08, com a redacção dada pela Lei n.º 60/2015, de 24/6.

E que se indicia ainda, fortemente, a prática, pelo arguido NUNO MIGUEL RODRIGUES VIEIRA MENDES, em autoria material de:

– um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo art.º 21 n.º 1 do DL 15/93 de 22.01

e que se verificam, ainda, em concreto, os perigos de fuga, de perturbação do decurso do inquérito, nomeadamente, para a aquisição e conservação e veracidade da prova, de continuação da atividade criminosa, bem como de grave perturbação da ordem e tranquilidade públicas, atendendo à natureza dos ilícitos em causa e à visibilidade social que a prática dos mesmos implica, considerando que a atuação dos arguidos revela um manifesto desprezo pelas consequências gravosas que provocam nas vítimas, foram aplicadas a cada um dos arguidos, uma vez que apenas em relação à prática do crime de tráfico de estupefacientes imputado ao arguido Nuno Mendes se verificam fortes, os indícios resultantes dos elementos de prova constantes dos autos (o que implica que não seja possível a aplicação das medidas de coação previstas nos artigos 200º a 202º do Código de Processo Penal (proibição ou imposição e condutas, obrigação de permanência na habitação e prisão preventiva), para além do Termo de Identidade e Residência, as medidas de coação de apresentações diárias nos Órgãos de Polícia Criminal das respetivas áreas de residência e ainda a prestação de caução, no montante de € 70.000,00″

Os dois detidos foram interrogados durante a tarde de quarta-feira. O antigo presidente do Sporting respondeu às perguntas do juiz durante cerca de duas horas, negando qualquer envolvimento no caso. No final, o Ministério Público propôs as medidas de coação que considerava serem mais adequadas, neste caso a prisão preventiva, tal como fez com a esmagadora maioria dos detidos no processo que investiga as agressões na Academia, em Alcochete. As defesas tiveram ainda tempo para responder a essa proposta, apresentando argumentos para a contestar, e era admitida a possibilidade de o juiz de instrução anunciar ainda durante a noite a sua decisão. O magistrado optou, ainda assim, por não o fazer e adiou esse anúncio para esta quinta-feira.

Bruno de Carvalho suspeito de ter remarcado treino do Sporting para o dia do ataque

Bruno de Carvalho e Nuno Mendes foram detidos no domingo, ao final da tarde. O Ministério Público suspeita que foram os mandantes das agressões à equipa do Sporting, a 15 de maio. Juntaram-se assim aos outros 43 arguidos do processo, 38 em prisão preventiva. Estão em causa dezenas de crimes que incluem terrorismo, ofensa à integridade física qualificada, ameaça, sequestro, incêndio e posse de arma proibida. Esta quarta-feira, nas stories do Instagram, a Juventude Leonina partilhou uma foto do líder com uma única frase: “Musta, tens um exército a teu lado.”

Bruno de Carvalho e Mustafá foram detidos a um domingo por causa das suspeitas de tráfico de droga da Juve Leo

Frederico Varandas foi ouvido esta quinta-feira no DIAP

Frederico Varandas foi ouvido esta quinta-feira no Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa (DIAP), na qualidade de testemunha e no âmbito das agressões a jogadores e staff na Academia a 15 de maio, confirmou o Observador.

O antigo diretor clínico do Sporting, que entretanto concorreu e venceu as eleições do clube a 8 de setembro, estava na Academia durante a invasão e foi agora convocado pelas autoridades para prestar alguns esclarecimentos.