O fundo americano Elliott, que tem 2,9% do capital da EDP, escreveu uma carta ao presidente do conselho geral da empresa a alertar para o impasse criado pela oferta pública de aquisição da China Three Gorges. Na carta enviada a Luís Amado, o fundo gerido por Paul Singer defende ainda que é tempo para avançar com uma nova estratégia mais focada na energia renovável e que passa pela venda de ativos core da elétrica como a EDP Brasil, centrais térmicas na Península Ibérica e 49% do negócio da distribuição. O que é posto em cima da mesa representaria uma viragem estratégica da maior empresa nacional resultante da venda de ativos de mais de sete mil milhões de euros.

Em resposta ao desafio, a administração de António Mexia agradece a contribuição da Elliott e promete “analisar cuidadosamente as suas propostas, em linha com a prática seguida com todos os
nossos acionistas.” E lembra que a EDP vai atualizar o seu plano estratégico no dia 12 de março quando anunciar resultados de 2018, reafirmando o foco na criação de valor para acionistas e outras partes interessadas, stakeholders.

Na carta e mensagem ao mercado, que podem ser consultadas num site criado para a sua divulgação — empower-edp.com — o fundo, que alguns descrevem como ativista e outros como abutre, começa por atacar o oferta do maior acionista chinês da EDP.

A OPA lançada em maio do ano passado pouco ou nada avançou em termos de autorizações regulatórias e na obtenção das condições do seu sucesso e já é o processo de aquisição mais longo no setor das utilities Para o Elliott Management, esta OPA “não é no melhor interesse dos acionistas” e deixará a companhia “mais fraca” por causa da venda de ativos que terá de ser feita para viabilizar a proposta.

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Os negócios que podem redesenhar o setor da energia em Portugal em 2019

Para além de ter obtido apenas uma das 17 autorizações necessárias à concretização do negócio, o sucesso da OPA da China Three Gorges obrigará a vender ativos fundamentais da EDP como a operação das renováveis nos Estados Unidos e uma parte substancial dos ativos em Portugal, devido a obstáculos regulatórios, defende.

Em causa estão as regras europeias que não permitem que o mesmo investidor, neste caso o Estado chinês, tenha participações relevantes ou de controlo em produtores de energia, como a EDP, e operadores de rede como a REN (Redes Energéticas Nacionais). Para ultrapassar o impacto negativo desta operação na REN e no maior acionista chinês desta empresa, a EDP controlada pela China Three Gorges teria de vender todos os ativos em Portugal que estão em regime de mercado, o que a prazo abrangeria toda a produção elétrica.

Para além do preço oferecido que é baixo.

“Em resumo, é claro para nós que a oferta da CTG não é no melhor interesse dos acionistas da EDP

O fundo considera que esta oferta “encalhada” tem vindo a travar o progresso da EDP, em cujo potencial de valor acredita, travagem essa que é visível na evolução do preço das ações da empresa portuguesa que está aquém de outros concorrentes no setor. O Elliott considera que o “atual impasse” pode ser ultrapassado — ainda que não detalhe como — e espera que as “sugestões” feitas ao conselho geral da EDP, onde têm assento os acionistas estratégicos da empresa, possam criar o momento para abrir um novo caminho para o futuro.

É nesta parte da carta que o Elliott Management vai mais longe, propondo uma nova estratégia que se for seguida implicaria redesenhar o universo empresarial da maior companhia portuguesa. Para o fundo, a EDP deve focar-se  nos ativos de crescimento sustentável, ou seja, no negócio das renováveis, mas para fazer mais investimentos nesta área precisa de reduzir o nível de endividamento. E isso implica desinvestir e vender operações que são atualmente centrais para a empresa. E numa apresentação de várias páginas propõe alienações totais ou parciais que poderão gerar um encaixe superior a sete mil milhões de euros, ainda que sem calendário definido.

  • A começar pela venda da EDP Brasil, o primeiro grande investimento internacional da elétrica portuguesa realizado nos anos 90 do século passado. Apesar do potencial de crescimento apresentado por este mercado, a Elliott diz que a EDP Brasil está abaixo das concorrentes no investimento que terá de fazer para tirar partido desta operação e aponta para o risco cambial daquele mercado. A venda permitiria captar recursos para outros investimentos, com uma mais valia assinalável. O fundo admite que possa gerar 2,3 mil milhões de euros.
  • A venda de 49% da operação de distribuição na Península Ibérica. Considerando que estes ativos regulados estão a atrair grande interesse de investidores em infraestruturas, a operação seria atrativa para potenciais compradores e permitiria obter um encaixe importante sem perder o controlo, e que seria superior a três mil milhões de euros.
  • A venda de centrais térmicas na Península Ibérica, a carvão e gás natural. Para este investidor, estas alienações estariam em linha com a estratégia da EDP de dar prioridade às renováveis e de ser uma das elétricas “mais verde” na Europa. Só em Portugal, a EDP tem a central de Sines, a carvão, as centrais do Carregado e Lares, a gás natural. As estimativas do Elliott apontam para uma receita de 1,7 mil milhões de euros com estas alienações.

Os recados do Elliott Management são divulgados numa altura em que a OPA da China Three Gorges já tem mais de oito meses, sem que a operação tenha sido formalmente notificadas as autoridades europeias, e pouco antes de a EDP apresentar os resultados anuais ao mercado. Este hedge fund é investidor em várias grandes empresas mundiais é descrito como um fundo ativista porque marca posição divulgando publicamente as propostas para mudanças estratégicas na gestão dessas companhias. Uma das últimas intervenções feita já este ano foi na eBay, o gigante americano de compras online.

O fundo Elliot entrou no capital da EDP este ano depois da saída de um investidor financeiro com o perfil mais conservador, o Capital Group.

Atualizado às 19.30 com reação da EDP.