O ano era o de 1976. A cidade: Jacksonville, no Estado da Florida, nos EUA. Ouviram-se tiros num apartamento ao lado do local onde Hubert Nathan Myers, com 18 anos, e o tio, Clifford Williams Jr., com 34, estavam numa festa de anos. Uma mulher morreu, outra sobreviveu e garantiu às autoridades que aqueles dois homens dispararam junto à cama que partilhava com a vítima mortal. Mas não foi bem assim. 42 anos depois, estamos em 2019. Hubert e Clifford foram agora libertados porque a Justiça americana enganou-se.
Estou nervoso porque ainda me sinto preso. Quando estiver com a minha família posso olhar para trás… e quando a realidade me atingir, penso que vai ficar tudo bem”, disse Hubert quando viu declarada a sua inocência. Tinha 18 anos quando foi preso, agora tem 61.
A história é contada pela ABC. Apesar de o relato de Nina Marshall, que escapou ilesa do crime e morreu em 2011, colocar os dois homens no local do crime, várias testemunhas afirmaram que o tio e o sobrinho estavam na festa à hora do homicídio. Nenhuma destas dezenas de pessoas foi sequer ouvida no julgamento que durou apenas dois dias. Só à segunda tentativa o júri conseguiu chegar a um veredicto, por discrepâncias nas provas, decidindo, ainda assim, pela condenação.
[Clifford Williams Jr. beija o chão depois de ter sido libertado]
Kissing the ground. On @ActionNewsJax at 6:00 two men who were wrongfully convicted are free. They spent 42 years in prison for crimes they didn’t commit. pic.twitter.com/Q5WUvBrDAy
— Bridgette Matter (@Bmatternews) March 28, 2019
A análise ao local do crime mostrou, na altura, que todos os tiros foram disparados de fora do apartamento, ao contrário do que dizia a vítima — havia buracos de balas nas janelas e cortinas –, e através da mesma arma. Contudo, não valeu de nada: o tio e o sobrinho foram condenados a pena perpétua por homicídio e tentativa de homicídio.
Durante o julgamento, e ao longo dos 43 anos em que estiveram presos, os dois homens que perderam décadas de vida na cadeia, alegaram sempre a sua inocência. Chegou a haver um homem que, por remorsos, assumiu a responsabilidade do homicídio. Morreu em 1994 e este testemunho nunca chegou ao júri que decidiu o destino de Hubert e Clifford.
Os dois homens tentaram, por várias vezes, pedir recurso da decisão, mas foi-lhes sempre negado. Apenas em 2017 tiveram uma oportunidade de justiça. Nesse ano, o Ministério Público do estado da Florida, através do procurador estadual, criou uma equipa para rever casos julgados.
Perdi quase 43 anos da minha vida que nunca mais vou voltar a ter, mas olho para a frente e vou focar-me em aproveitar a minha liberdade com a minha família”, disse Hubert num comunicado.
O sobrinho e o tio requereram logo a esse novo departamento que revisse o caso que os pôs décadas na prisão. Hubert tinha lido no jornal sobre a criação desta nova equipa e escreveu uma carta a contar a história dos dois. No final, o relatório de 77 páginas mostrou que estavam inocentes e foram julgados injustamente.
We are so thrilled to see justice in action today. This exoneration was initiated by the State Attorney of the Fourth Judicial Circuit, Melissa Nelson and her Conviction Integrity Review Unit.
These men have waited nearly 43 years to see this day. pic.twitter.com/DgmWdtajHy
— Innocence Project of FL (@FLA_Innocence) March 28, 2019
Todas as acusações e penas foram retiradas. “Quando temos uma hipótese de corrigir erros, devemos fazê-lo”, disse a procuradora estadual Melissa Nelson. Agora, podem receber uma compensação até 2 milhões de dólares (cerca de 1,78 milhões de euros). Contudo, apenas Hubert pode ter direito a esta indemnização. As leis do estado da Florida não concedem nenhum montante a quem tenha sido condenado mais do que uma vez por algum delito. Foi o caso de Clifford, que antes de 1976, já tinha registo em dois casos.
Hubert tem agora 61 anos. O tio tem 76.